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sexta-feira, 10 de março de 2023

Anulação do batismo

 

Os tempos que correm parecem ser propícios para as maiores barbaridades e tomadas de posição a roçar o esquisito. Perante o ambiente que atinge a Igreja católica – com os casos de alegados abusos sexuais – têm sido muitas as vozes e os ditos, uns mais sensatos e outros mais exuberantes. Começam a surgir casos de pessoas – por sinal da região norte do país – que pediram para anular o seu batismo. A este procedimento chama-se apostatar da fé, isto é, o repúdio total da fé cristã.

Mutatis mutandis: a alguém passará pela cabeça, em perfeito juízo, dizer que quer ver anulado o seu registo de nascimento, até porque – no nosso caso – nasceu português e desejava ter outra nacionalidade...mais sonante ou com tiques de maior importância social? Por certo que há coisas do nosso passado pessoal, familiar ou social que não podem ser desmarcadas, como por exemplo os pais que tivemos, o lugar do nascimento ou até a condição económico-social. Está nos nossos genes... Será um tanto difícil de ultrapassá-los.

1. Deixemos por momentos a presunção de não quer ser mais cristão. Será que isso obriga a desfazer algo para o qual não fizemos nada, se éramos crianças, mas que podemos consciencializar mais tarde ou mais cedo. Esta atitude apostasia – sobretudo quando divulgada – pode encobrir algo mais do que uma posição ou modo de ser e de querer estar. Com efeito, não é por não participar nos atos cívicos adstritos à minha condição de cidadão, que irei desarriscar-me do cartão de cidadão, como contribuinte, enquanto beneficiário do serviço de saúde ou de poder usufruir da prestação da segurança social. A anulação do registo do batismo – pois o ato ninguém mo poderá tirar nem à força – pode querer dizer mais do que uma posição contra a Igreja ou mesmo contra Deus. A admiração está em que tais notícias surjam – outros se poderão seguir – num ambiente algo tenso e de manifesta controvérsia quanto a temas de teor ético-morais...no contexto da Igreja católica.

2. Estes episódios poderão ajudar-nos a refletir sobre o significado do batismo nas suas diversas vertentes. Será que a maioria das pessoas entende o batismo como um sacramento – sinal da graça de Deus – ou como oportunidade de festa? Estamos já fora da avalanche de batizados das décadas de cinquenta a noventa do século passado: eram às centenas, agora poderão chegar às dezenas. A mentalidade para a receção do batismo mudou radicalmente: antes eram celebrados nos primeiros meses, agora estão colocados nos primeiros anos. Tem vindo a desenvolver-se a prática de fazer mais do que batizado, mesmo da mesma família, quanto de familiares afins. Com a volatilidade das relações das pessoas e das famílias, muitos dos batizados solicitados como que funcionam para fazer festa – incluindo dezenas de convidados – já que o casameno de índole católica está condicionado ou mesmo sem possibilidades de acontecer. Mesmo na condição de serem crianças (até à idade dos seis anos) estas, por vezes, correm o risco de serem ‘exploradas’ naquela celebração mais ou menos social...

3. Reporto-me à situação na diocese de Setúbal e na fórmula mais simples de encarar o ‘como e a quem batizar’, neste contexto. Acima de tudo devemos ter em conta quem pretende ser batizado e, em particular, na área das crianças. Quem peça o batismo, nas devidas condições humanas e cristãs, será sempre atendido. Não se pode recusar a graça e o dom de Deus. Sobretudo no caso das crianças, estas não tem culpa dos pais que lhes tocaram em sorte. E nem a exigência para com os padrinhos poderá ser obstáculo. Alguns deixariam bastante a desejar, se fossem incluídos como figurantes da celebração. O Código de Direito Canónico diz que ‘tenha ao menos um padrinho ou uma madrinha’ (cânone 872)... Poderei ter dúvidas da real efetivação de outros sacramentos, como o matrimónio, mas, no caso do batismo, ao invocar da Santíssima Trindade sobre o batizando, isso acontece verdadeiramente. Aquele batizado torna-se morada de Deus e isso deverá ser cuidado pelos pais e padrinhos, assim eles entendam a missão que lhes é confiada.

Se o batismo fosse levado a sério por todos, seríamos mais conscientes daquilo que nos faz Igreja...



António Sílvio Couto

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