Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

Desejos & concretizações…


Indo às intenções desejadas no final do ano passado para este ano prestes a finar-se, podemos comparar.
A 2 de janeiro deste ano escrevia que ‘para este ano de 2015 gostaria que pudessem acontecer quatro grandes vivências (pessoais e testemunhais): verdade, perdão, lealdade e bênção’.
Agora decorridos todos estes dias, eis como avalio o que até este momento foi registado:
- ‘A verdade serve, não se serve dos outros. Pela verdade podemos andar de cabeça levantada e não tentar disfarçar até que descubram os nossos erros’.
Há circunstâncias em que a Verdade dói, denuncia e provoca. Quantas incidências fazem com que a Verdade seja algo que nos inquieta, pois, se nos deixamos medir pela Verdade de Jesus, estamos sempre em questionamento. Por isso, viver na verdade é exigente e faz mossa na consciência acomodatícia e narcotizada pelas influências mundanas.
Dá a impressão que perdi – se é que alguma vez tive – ‘amigos’ por dizer e falar a verdade…neste ano de 2015! Só na medida em que nos deixamos conduzir pela Verdade é que seremos sinais de verdade.
 - ‘Como seria diferente o nosso mundo se vivêssemos numa atitude de perdão, onde cada um de nós assume os seus erros e deles pede perdão a Deus e aos outros’.
De facto, este ano de 2015, foi ritmado por atitudes de vingança marcantes: houve atentados com dezenas de mortos; houve crimes e ofensas; houve retaliações e pundonores agravados; houve insinuações e provocações; houve vítimas e réus…
Se há caraterística que o ano de 2015 não teve foi a do perdão nem dado e tão pouco recebido. Por isso, é que o próximo ‘ano jubilar da misericórdia’ é tão fundamental nos tempos a viver…
- ‘Quando vemos a denúncia de casos de traição e de pessoas que abusam da confiança, talvez tenhamos de ser mais fomentadores de lealdade, começando pelos que nos são mais próximos’.
Ser leal é coisa que não se inventa nem está em saldo. Com efeito, ser leal é algo que gera confiança e sinceridade. Ora, nas relações pessoais e interpessoais estas qualidades andam um tanto arredias do trato civilizacional. Com que facilidade as pessoas mentem umas às outras e usam os outros em seu proveito e benefício… de forma declarada ou mais subtil.
O cúmulo desta deslealdade foi e é o do atual governo da Nação, pois quem perde apodera-se do poder e faz-se passar por governante, embora incompetente e sem condições para exercer as tarefas… Outrossim se dirá de muitos dos candidatos à Presidência da República: de gralha em grelha…até à entronização final!
- ‘Não podemos continuar a sermos difusores da maledicência, da intriga, do mau-olhado…sendo servos do mal’.
Como seria diferente o nosso tempo e este mundo, se cada cristão fosse portador de bênção ativa e atuante. Desgraçadamente passamos muito do tempo deste ano de 2015 a dizer mal uns dos outros, sem nada acrescentarmos de benfazejo e de útil à nossa volta…
Já basta de termos tantas pessoas – como dizia o Papa Bento XVI, em Fátima, quando aqui esteve pela última vez – importantes e inúteis com mãos vazias de não fazerem nada… nem mal nem bem! Com efeito, daquele podemos arrepender-nos e mudar o modo de estar, deste poderemos crescer em prosseguir a melhorar…  
= Até agora quisemos fazer um balanço e um confronto com o que desejávamos para este ano prestes a terminar. Em breve apresentaremos, se Deus quiser, os nossos votos para o ano de 2016.
António Sílvio Couto
 
 

sábado, 26 de dezembro de 2015

Gestos de partilha…


Surgiu na publicidade desportiva, nesta época de Natal, o spot duma marca de material desportivo, associado a um clube português de grande dimensão, em que, num campo de prática de futebol – onde as crianças jogavam descalças…como tantos de nós na nossa meninice – se passa, como que por magia de estarem descalços para aparecerem calçados com chuteiras dessa marca… Ora, bem depressa, surgiram outos tantos rapazes, que descendo o morro, se querem associar ao jogo… Eis que, de repente, os que receberam as chuteiras novas a estrear, descalçam um dos pés – creio que, na maioria, o pé que chutava – e oferecem aos companheiros a outra chuteira para que todos possam jogar, ao menos, com um pé calçado!
A reação do representante do clube/fundação oferente ficou, como europeu, surpreendido – talvez não seja só ‘teatro’ publicitário – com tal gesto em admiração e confuso!... No spot publicitário, gerou-se, então, um jogo entre crianças com alegria e satisfação.
Não sabemos se outros clubes vão seguir a ideia de irem alegrar crianças em África – ou nalgum bairro periférico em Portugal – dando bolas e chuteiras, patrocinadas ou não por marcas de âmbito internacional. No entanto, cremos e desejamos que, muitos dos europeus tão instalados e, recorrentemente reivindicativos, possam seguir o espírito daquela partilha, saindo da comodidade mais ou menos egoísta…senão mesmo possessiva, triste e insensível aos outros! 

= Dar ou receber?
Nesta época natalícia estas duas palavras – dar e receber – foram, certamente, conjugadas em muitas formas e variados sentidos, senão na passiva ao menos na ativa. Com efeito, o tempo de Natal torna-se propício a dar prendas e/ou a receber presentes ou, talvez ao contrário, a dar presentes e/ou a receber prendas… Explicando, pois nem tudo é igual: o ‘presente’ é ou pode ser uma forma de eu me fazer presente a quem ofereço algo, tendo em conta aquele/a a quem ofereço; enquanto na ‘prenda’ eu posso ir preso, dando a alguém algo em que me deixo ir possessivamente para que, quem recebe, saiba que fui eu que ofereci. Por isso, é que muitas prendas são (ou podem ser) quase inúteis, embora lembrando quem as deu, enquanto uns tantos presentes podem ser úteis porque atenderam a quem foi oferecido.

= Cultivar a partilha
Outra faceta do Natal é a da partilha…nos mais diversos sentidos da sua expressão ou vivência. Quando alguém partilha, seja o que for – desde coisas até às palavras, passando pela presença ou mesmo um pouco de tempo – está a sair de si mesmo, indo ao encontro do outro/a. Na partilha gera-se mais uma cultura da atenção do que uma tomada de intenção. De facto, no mundo de hoje vive-se muito ensimesmado cada um nos seus problemas reais, virtuais ou mesmo fictícios. Quantas vezes encontramos pessoas cujo horizonte da sua preocupação é o seu próprio perímetro ou o mero alcance das suas vistas…curtas e sem alcance de saída.
Deste modo torna-se um pouco a contracorrente que, ao menos, Natal, se possam gerar novas oportunidades de partilha…sem reduzir isso à mera disponibilização de coisas materiais, embora estas – comida, roupa, artigos de higiene, calçado, etc. – possam e devam também estar presentes na partilha. Muito mal estaríamos, se já nem por ocasião do Natal, não nos despertássemos para a partilha fraterna e solidária!  

= Humanizar as relações das pessoas
Precisamos, cada vez com mais urgência, de humanizar as relações entre as pessoas, as famílias, as empresas, as autarquias, as igrejas, as religiões… e em todos os campos onde estejam pessoas. Com efeito, temos vindo a constatar que, pelo seu lado, os animais vão conquistando mais sinais de cidadania do que os humanos. Com facilidade se gera uma onda de solidariedade para com um animal menos bem tratado do que para com uma pessoa/família a passar dificuldades. Parece que algo vai mal no reino da civilização humana. Talvez devamos questionar-nos mesmo sobre o crescimento da oferta nas secções das grandes superfícies de comida para animal em detrimento dos espaços destinados às crianças… O Natal também passa(rá) por aqui?


António Sílvio Couto

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Temos de pagar (sempre) a crise…dos bancos?


Pelos dados mais recentes como que poderemos dizer que cada governo tem o ‘seu banco’ para cuidar, pagando ou fazendo pagar as crises que surgem com as mais diferentes instituições bancárias…BPN, BPP, BES, Banif… e outros, vão emergindo no panorama da nossa sociedade, deixando a fatura – direta ou indiretamente – para os contribuintes/cidadãos/eleitores a pesada herança de suportarem os desmandos e aventuras dos ‘senhores (fictícios) do dinheiro’… e seus sequazes.

- Já não sabemos se é incompetência ou se é negligência aquilo que se passa nos diversos bancos, seja qual a economia que servem e/ou os interesses que gerem ou geram…dentro e fora de portas.

- Já vimos guerrilhas de famílias fazerem soçobrar projetos ‘bem sucedidos’, vindo-se a descobrir que haveria mais aparato do que boa gestão… e sucesso.

- Já ouvimos dizer de um banco que estava bem e se recomendava a aposta nele, mas passados tempos ser dito o seu contrário, com a agravante de que o desdito foi feito pela mesma pessoa, pretensamente bem informada…dado o lugar na estrutura do Estado.

- Já deu para perceber que, conforme a cor partidária, a ideologia ou até o fator clubístico, assim são as posições para com algum dos bancos com problemas…dando quase a entender que os declarantes, antes de tudo, se tem de defender os (seus) depósitos nas instituições em crise…ou como seus patrocinadores.

- Já deu para reparar que a maioria dos bancos – sobretudo dos que têm estado em crise – tem vindo a converter políticos ex-governantes em banqueiros? Isso explicará alguma coisa ou confundirá ainda mais?
 
- Já foi possível, nos tempos mais recentes, começar a compreender que os depositantes – nalguns casos umas centenas ou uns milhares – localizados, reclamantes e desiludidos…valem mais do que os milhões de contribuintes, que têm de suportar os desmandos dalguns (quase) incompetentes na avaliação, na gestão e na decisão contra quem vive com o fruto do seu trabalho. Afinal, quem defende, efetivamente, os mais desfavorecidos? Palavras leva-as o vento!

De facto, a imagem de Centauro – figura mítica grega com cabeça, braços e dorso de humano e com corpo e pernas de cavalo – que aparece estilizada no símbolo do mais recente banco em crise, pode e deve levar-nos a refletir sobre as implicações dos decisores políticos e económicos, a curto e a médio prazos, sem deixar de esquecer a formulação ideológica que tem estado subjacente aos tentáculos de tantos problemas… 

- ‘Qual é a pressa?’ – este refrão de há tempos, proferido por um dirigente demitido à força, como que poderia ser a pergunta sobre a rápida proteção dada pelo atual governo a este banco intervencionado.

Os cerca de trezentos euros por português, que, segundo dizem, teremos de pagar para a solução encontrada, serão cobertos pelos aumentos – de dois euros/mês – nas reformas e nas pensões?

Estamos à mercê de uns tantos que se acham senhores da verdade e que decidem sobre as poupanças e rendimentos dos outros, mesmo que isso lhes custe a sobrevivência num futuro próximo.

Tudo poderia ser aceitável, desde que não parece-se que estamos a ser conduzidos por gente sem escrúpulos e que não olham a meios para atingirem o seu fim: nova intervenção estrangeira de socorro à economia e às finanças. Por muito que nos custe, cada dia se vai cavando mais a sepultura coletiva!

O Centauro governativo vai ganhar…As armas da luta são diferentes e não teremos hipótese de fugir.


António Sílvio Couto
(antonioscoutosilva@gmail.com)



segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Da indiferença à misericórdia



A mensagem do Papa Francisco para o 49.º dia mundial da paz (1 de janeiro) intitula-se: ‘Vence a indiferença e conquista a paz’.
Partindo duma análise a várias formas e situações de indiferença, o Papa denuncia, prioritariamente, «a indiferença para com Deus, da qual deriva também a indiferença para com o próximo e a criação. Trata-se de um dos graves efeitos dum falso humanismo e do materialismo prático, combinados com um pensamento relativista e niilista». Por seu turno, nas palavras do Papa, «a indiferença para com o próximo assume diferentes fisionomias»...mesmo contrastando o aumento da informação com a indiferença aos problemas alheios. Noutros casos, «a indiferença manifesta-se como falta de atenção à realidade circundante, especialmente a mais distante».

* Indiferença globalizada: «a nível individual e comunitário, a indiferença para com o próximo – filha da indiferença para com Deus – assume as feições da inércia e da apatia, que alimentam a persistência de situações de injustiça e grave desequilíbrio social, as quais podem, por sua vez, levar a conflitos ou de qualquer modo gerar um clima de descontentamento que ameaça desembocar, mais cedo ou mais tarde, em violências e insegurança».
O Papa retoma a sua denúncia de tantos interesses instalados e promovidos, onde os mais desfavorecidos continuam a serem vítimas de políticas económicas deploráveis porque não respeitando a dignidade da pessoa...mas sem nunca esquecer as malfeitorias para com o ambiente de vida (poluição e catástrofes naturais), criando insegurança e novas formas de pobreza.

* Conversão do coração: «na realidade, muitas vezes a indiferença procura pretextos: na observância dos preceitos rituais, na quantidade de coisas que é preciso fazer, nos antagonismos que nos mantêm longe uns dos outros, nos preconceitos de todo o género que impedem de nos fazermos próximo. A misericórdia é o coração de Deus. Por isso deve ser também o coração de todos aqueles que se reconhecem membros da única grande família dos seus filhos; um coração que bate forte onde quer que esteja em jogo a dignidade humana, reflexo do rosto de Deus nas suas criaturas».
Daqui decorre, segundo o Papa Francisco que todos - crentes ou não, mas com maior compromisso e exigência para com aqueles - somos chamados a fazer do amor, da compaixão, da misericórdia e da solidariedade um verdadeiro programa de vida, um estilo de comportamento nas relações de uns com os outros.

* Cultura de solidariedade e misericórdia: «a solidariedade como virtude moral e comportamento social, fruto da conversão pessoal, requer empenho por parte duma multiplicidade de sujeitos que detêm responsabilidades de carácter educativo e formativo».
Na perspetiva do Papa - como habitualmente na doutrina católica - a família, as escolas, isto é, os educadores e os formadores, bem como os agentes culturais e dos meios de comunicação social têm responsabilidades no campo da educação e da formação, colocando-se todos ao serviço da verdade e não de interesses particulares.
Atendendo ao espírito de ano jubilar, o Papa aponta-nos o caminho: «no espírito do Jubileu da Misericórdia, cada um é chamado a reconhecer como se manifesta a indiferença na sua vida e a adotar um compromisso concreto que contribua para melhorar a realidade onde vive, a começar pela própria família, a vizinhança ou o ambiente de trabalho».
De facto, o combate à indiferença pela misericórdia...começa em casa, já!


A paz será conquista humana e cultural, quando todos nos tornarmos sensíveis e sensibilizados uns aos outros…sobretudo os mais frágeis.

Conseguiremos construir uma sociedade menos indiferente, quando fizermos do nosso relacionamento um ambiente de harmonia pela paz de direitos e deveres.

António Sílvio Couto


sexta-feira, 18 de dezembro de 2015

A que se devem tantos benefícios, agora?


Na minha ignorância e dúvida, sinto-me chamado a perguntar/questionar: as regalias, os benefícios e até as medidas do atual governo, devem-se a quê? Seremos todos tão inconscientes para não desconfiarmos de tantas promessas? Qual a duração de tais promoções: serão de curto prazo ou trazem algo mais durável? Onde foi encontrado o filão do dinheiro agora disponibilizado?

Há algo que me faz desconfiar: os senhores mandantes de agora sabem o que estão a fazer ou será que viram os cofres tão cheios que os querem esvaziar em confetis e flores de papel...o mais rapidamente possível? Não será que certas medidas de esbanjamento mais parecem a gestão da riqueza dalguma tia-rica que deixou uma fortuna inesperada e, como não custou a ganhar, custa muito menos a gastar...sem nexo nem complexo!

Dá a impresão que os sacrifícios dos últimos anos podem (ainda) suportar foguetórios de quem quer conquistar – como noutros tempos – o povo pelo estômago e não pelo trabalho e a razão!

Então, quem estava antes na governança não podia ter dado tais benesses, agora propagandeadas de forma altissonante... em pouco menos de dois meses? Esses outros eram tão incapazes na sua visão partidária que não perceberam que, só quando apresentassem regalias ao povo, é que poderiam vencer eleições...desafogadamente?

Ou será que os aumentos das reformas, a diminuição dos impostos, o acrescento aos direitos dos ‘mais pobres’, uma certa comiseração para com os mais desfavorecidos é coisa de pouca duração...e será possível só até que os lucros possam aguentar?

Se isto acontece no último mês do ano – acometidos àqueles que são responsáveis pelos outros dez/onze meses anteriores – o que será daqui a breves dias, quando – os atuais governantes – tiverem de gerir e de gerar verbas e divisas para alimentarem essas tão populares medidas reais, lógicas e sérias?

É muito fácil distribuir o que não foi trabalhado, pois o suor que gerou tais proventos não saiu da suficiente capacidade de governação, mas talvez da contestação reivindicativa nas ruas e na laboração dos subsídios... Centenas de greves conseguiram atingir as finalidades que podem ser usadas para ganhar protagonismo até fora dos locais de negociação!

Temos pena de ver certas figuras – dentro e fora do Parlamento – que fizeram carreira na ausência ao trabalho serem agora os gestores do esforço de tantos outros que vão sendo manipulados... como se fossem produtores de riqueza, mas que nada fizeram que tal fosse construído!

Sem qualquer capacidade de advinhação podemos perceber que, em menos de um ano, estaremos a pedir ajuda aos credores do passado recente, pois as economias gerais vão ser consumidas pelos ‘ganhos’ dados em retribuição/propaganda aos (pretensos) setores mais desfavorecidos, que irão continuar a pagar a fatura dos desmandos dos atuais gestores. Com efeito, desgraçadamente, o segundo resgate vai ser um garrote mais feroz do que foi o anterior, mas os fautores da sua vinda sentir-se-ão julgados, quando forem vencidos nas eleições...embora devessem ser criminalizados, no futuro como deveriam ter sido no passado.

Talvez a Europa não nos continue a suportar tais e tão repetidos desmandos por muito mais tempo...

Quem não sabe nem é capaz de gerir a sua casa (de família, se ainda a tem), como poderá gerir a casa-comum do país?

Seria muito útil fazer escurtínio à gestão pessoal/familiar de tais governantes para sabermos se podemos confiar-lhes a gestão pública/coletiva!...

Porque queremos o melhor para o nosso país, acreditamos que não basta vender ilusões com regalias imediatas, se viermos a hipotecar o futuro a curto e médio prazo. Mentira, a quanto obrigas!     

 

António Sílvio Couto

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

4.ª classe: exame ou aferição?


Nos dias bem recentes vimos duas atitudes um tanto esquizofrénicas para com o quarto ano da escolaridade: numa semana suprime-se o exame – com o patrocínio das forças da (autoapelidada) esquerda – e passados dias é reintroduzida – por proposta do governo em funções – a aferição, no final do ano, para o mesmo tempo de instrução…

Se no caso do exame era considerado stressante submeter as crianças ao dito, na aferição dá-se-lhe o conteúdo sem conteúdo, isto é, só serve para avaliar o processo de aprendizagem e não o aluno nos seus conhecimentos…

= Este exemplo de conduta das coisas na área da educação é algo sintomático da confusão em que vamos andando: com avanços e recuos, com medidas de teor populista, com o fazer o mesmo só lhe modificando a embalagem…e a subtil conivência de certa comunicação social, que agora encolheu as garras para com quem manda, pois não parece mais uma fera amestrada em espetáculo de circo – agora que os animais foram retirados das sessões – por algum complexo de tolerância mais ou menos comprada, sabe-se lá com que custo e mesmo com que duração…

= Nas coisas da economia e finanças vive-se idêntica capacidade de benevolência, passando uma certa esponja sobre as incongruências, pois o que antes eram ‘medidas de austeridade’ agora tornam-se em ações acerto de contas. Aquilo que antes era tido como condicionador do crescimento económico, agora pode-se dizer tudo e o seu contrário e nada acontece. Veja-se a questão da inflexão sobre a sobretaxa do irs, repare-se também no acerto do ordenado mínimo: o que antes era insuspeito para a defesa da classe trabalhadora, agora torna-se num processo de negociação, onde muitas empresas e instituições – sobretudo na economia social – entrarão em colapso…a curto prazo… E os deputados e governantes estarão a salvo das suas regalias e benesses atuais e futuras!

= No setor da justiça – seja da praticada, seja na que está em investigação – vive-se tal confusão, que muitos réus surgem como juízes, acusando tudo e todos, pois sentem-se acima da justiça, contando com a farsa de certa comunicação que faz o favor de dar voz a quem tanta perturbação traz…como se fosse um intocável de casta superior por entre o lamaçal mais hediondo…no seu conceito!

= Perguntas de quem se sente envergonhado como português, que fez o exame da 4.ª classe e tantos outros estudos e exames para conseguir sentir-se instruído e tendo como única fortuna de vida os conhecimentos adquiridos com esforço e persistência:

. Até onde irá prosseguir este clima de fim de estação, quando não se atende ao essencial e se anda a cultivar o secundário?

. Ainda poderemos acreditar que os cidadãos são todos iguais perante a lei e o cuidado da justiça? Não haverá uns mais diferentes que outros, desde que professem certas ideologias?

. A quem interessa o clima de facilitismo? Como virá ser considerada a geração dos mais escolarizados, mas suficientemente mais ignorantes?

. O que está acontecer será já resultado da ‘geração dos doutores de Bolonha’ ou ainda isto só o princípio do fim?

. Não será que, em breve, teremos de voltar a fazer estudar quem dá frutos de tanta irregularidade na aprendizagem e na educação…humana e cívica?


Estamos no século XXI e parece que a nossa evolução cultural tem andado ao sabor de quem comanda a partir de lojas e afins, criando a sensação que aqueles/as que dão a cara – na governação e no poder exercido – não passam de marionetas de feira mais ou menos popular… até um dia serem dispensados!

 

António Sílvio Couto

segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

A propósito dum postal de Natal


A Paróquia da Moita, como vem sendo habitual nos últimos cinco anos, preparou um postal de Natal para fazer chegar ‘a todos os homens e mulheres de boa vontade’, que não vêm à igreja...
Contendo uma mensagem do pároco a desejar a todos um santo e feliz Natal e um ano de 2016 abençoado na paz, o postal tem no frente a reprodução dum azulejo da igreja paroquial da Moita, representando a ‘fuga de Jesus para o Egito’...sendo dada a explicação: ‘em comunhão com os problemas humanos e sociais dos nossos tempos’!
De facto, as figuras mais simbólicas do quadro do presépio - Jesus, Maria, José a (até) o burro - estão ali representadas... embora noutra vivência e, particularmente, em momentos também complicados para a Sagrada Família de Nazaré: a experiência de refugiados em terra estrangeira, salvaguardando a vida do Menino.

Embora tenha diminuído a referência aos refugiados que ‘invadiram’ a Europa nos últimos tempos, não podemos ficar com a sensação que foram varridos para debaixo do tapete noticioso, como que para escondê-los da vista e assim não afligirem a pacatez dum Natal consumista e egoísta, nostálgico e falso, interesseiro e desconexo da vida...

- Por estes dias foi mais visualizado o espetáculo de certas forças ambientalistas, mas onde o que conta são as suas visões ideológicas e quase panteístas... transfronteiriças.
- Por estes dias tem-se vindo a discutir quem pagará a fatura do desrespeito pela natureza, mas sem a referir a Deus-Criador.
- Por estes dias vive-se a correria para que possa haver conforto, no (pretenso) Natal, mas a família vai-se desfazendo com tantos conluios de faz-de-conta.

Este postal de Natal, pretende ser um sinal para quantos têm ainda humanismo no coração, provocando a reflexão sobre os cuidados que devemos aos outros e como podemos ser mais fraternos e solidários.
Haja Natal de Jesus, pois Ele é o festejado.

António Sílvio Couto

sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

Quando o ‘bodo’ caiu, antes de ser…


Nos tempos que correm temos de desconfiar cada vez mais e, sobretudo, cada melhor como atitude de vida – intelectual, reflexiva e mesmo de bom senso – sobre as mais diversas promessas, seja de quem governa, seja de quem pretende influenciar as decisões dos outros…cívica e cinicamente.

O pretenso ‘bodo aos pobres’ que foi publicitado – particularmente por quem sustenta o poder…embora na retaguarda – já não vai ter tanta expressão como diziam: as contas não permitem desafetar rigores – a ‘austeridade’ que cunharam para se referir ao assunto vai sendo substituída por outros termos similares ou dissimulados…embora com efeitos idênticos – e os favores a pagar/receber por certos apoios – salário mínimo, redução da taxa de impostos ou devolução da sobretaxa e outros – começam a tremelicar…embora a contestação possa ser, por agora, mais surda ou na surdina.

= Do salário mínimo…

Há setores de atividade para quem o aumento do salário mínimo – embora desejável, necessário e urgente – se torna uma espécie de garrote para a sustentabilidade das instituições. Falamos daqueles que têm por atividade a ‘economia social e solidária’, isto é, aqueles que têm de governar instituições particulares de solidariedade social e afins, bem como as iniciativas que não envolvem produção de matéria comercial de venda ao público. Para algumas instituições/associações poderá ser a machada final no equilíbrio das contas, tanto mais que a torneira do Estado – segurança social e demais entidades subsidiadoras – dá cada vez menos para que se possa fazer um serviço ainda digno e com dignidade.

Não se pode pedir às famílias que comparticipem com algo de acrescento, se mesmo elas vivem em contenção e presas por fios para equilibrar o que conseguem pagar…

Não se creia que bastará acrescentar uns tantos euros à conta do ordenado ao final do mês e logo isso reverterá em benefício de equilíbrio das obrigações das famílias… tanto mais que algumas já vivem penduradas nas reformas dos mais velhos – nalguns casos retirando-os das casas onde eram cuidados – para que consigam sobreviver desempregados e com filhos dependentes.

Aos senhores e senhoras do parlamento – tão sensíveis às questões sociais ‘de papel’ – desafiamos a que nos contem casos em que viram as pessoas a pedirem-lhes a possibilidade de estarem num local onde os filhos possam comer… Um dia, um casal de desempregados pediu-me que seu filho pudesse estar no jardim-de-infância, pois iriam fazer todo o esforço por pagar a mensalidade… mesmo que mínima, pois a criança teria onde comer, ao menos uma vez por dia!

As instituições de solidariedade social – muitas delas ligadas à Igreja católica – passam por dificuldades, quase fazem, diariamente, milagres… mesmo que sintam a concorrência (um tanto) desleal doutras ligadas ao setor público… Não somos – como ipss’s – e nunca seremos postos de ‘lavagem de dinheiro’, como foi dito – abusiva e caluniosamente – por certos extremistas no parlamento… Pelo contrário, a maior parte das ipss’s fazem com pouco dinheiro o que outros gastam a triplicar e com fracos resultados!

= … Ao controlo do salário máximo

Se há condições de justiça mínima e aceitável, ousamos replicar aos legisladores que cuidem em não aumentar os salários máximos, pois os pobres também são gente e não merecem continuar a ver uns engordar e pavonearem-se em carros e comezainas e outros a contar os cêntimos…envergonhada e ciclicamente.

É preciso que não se esqueçam daquilo que disseram e tenham a honestidade mental, sentimental e moral em serem comedidos nos seus autoaumentos, pois tornar-se-á vergonhoso que, quem nunca teve de sujar as mãos a trabalhar no duro, venha dar lições a quem sofre e em que o que tem foi conquistado com sangue, suor e lágrimas…

Se formos todos mais verdadeiros poderemos perceber que a conquista do poder não justifica tudo e nem o seu contrário. Ainda não perceberam que já não são levados a sério? O ‘bodo aos pobres’, afinal, faliu ainda antes de ser distribuído…nestes parcos dias do ano a terminar. E depois, que virá? Haja moralidade!

 

António Sílvio Couto

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Como oásis de misericórdia?


«A Igreja tem a missão de anunciar a misericórdia de Deus, coração pulsante do Evangelho, que por meio dela deve chegar ao coração e à mente de cada pessoa. (...) Nas nossas paróquias, nas comunidades, nas associações e nos movimentos - em suma, onde houver cristãos - qualquer pessoa deve poder encontrar um oásis de misericórdia» – Papa Francisco, O rosto da misericórdia, n.º 12.

Ao darmos início ao ‘ano jubilar da misericórdia’ somos, entretanto, confrontados com múltiplos sinais de não-misericórdia no nosso trato coletivo mais ou menos difuso: 

= Contemporaneidade agressiva e agnóstica?

Por entre tantos arremedos de confusão, vivemos numa apreensão contínua sobre o significado das atitudes pessoais e alheias, pois factos e pessoas manifestam que as relações se conduzem mais pela agressividade do que pela compreensão; situações e episódios veiculam mais o conflito do que a tolerância; gestos e acontecimentos estão mais marcados pelo ressentimento do que por algum (ténue) perdão...

Tudo se agrava se nos detivermos a considerar que muita dessa agressividade e conflitualidade emerge do coração azedo e ferido de tantos/as que (até) se dizem cristãos... mais ou menos praticantes. Com que arrepios de escândalo vemos que muitos dos comungantes nas nossas missas misturarem na mesma boca a hóstia consagrada da presença de Jesus na eucaristia com a maledicência contumaz e ressabiada...contra os outros.

= Combater o terrorismo com as mesmas armas...de intolerância?

Depois dos mais recentes e espetaculares atentados, em Paris, a 13 de novembro, vemos que os combatentes daquele terrorismo usam as mesmas armas sem olhar a meios nem a ilegalidades. O que faliu foi (e é) o modelo de sociedade que foi gerando, no seu interior e sem controle, os fazedores de denuncia ao falhanço da sociedade laicista do Ocidente. Os ‘terroristas’ tinha nacionalidade e identificação dos países que agora destroçaram pela morte. São filhos e resultado da vulgarização do não-Deus – a alusão a Deus nos atentados é abusiva, ofensiva e tendenciosa! – no pensar e no agir. Foram-lhes dados todos os alçapões sociais e legais para se evaporarem sem deixarem rasto nem possibilidade de serem encontrados...Por muito que nos custe aceitar, eles atuam de forma impune e tendencialmente vangloriosa...

= Sinais políticos preocupantes...contraditórios

À boa maneira da interpretação das votações noutros momentos e locais, podemos ver que, em França, cresceu a tendência (apelidada) de ‘extrema-direita’, vulgarizando os (ditos) democratas e reduzindo à insignificância quem ocupa o poder. Deu para perceber que as conquistas mais recentes de combate ao terrorismo não fizeram subir quem nada vale – lá como por cá! – e que não podemos continuar a reclamar contra quem discorda, votando e que se exprime de forma diferente da tendência barulhenta de certas esquerdas...contestatárias na rua...mas submissas no poder.

Nota-se que uma certa comunicação social – nacional e no estrangeiro – só se inquieta com as expressões que fogem da onda dos seus mentores. Uns tantos querem fazer crer que o perigo vem (só) da direita, tentando esquecer que também a esquerda deixou milhões de mortos e de gulags, de prisões e de caudilhos na América Latina e na Ásia...alguns há anos!

= Misericórdia como opção política

Acreditamos que o mundo pode ser mais humano e mais fraterno, se as pessoas se conduzirem com relações de misericórdia entre si, nas instituições, nos países, nas religiões, nas culturas e (até) nas ideologias... mesmo que algumas não a compreendam. Temos um longo e árduo caminho a fazer, mas valerá a pena começá-lo, dando pequenos passos com aqueles com que vivemos e partilhamos este momento histórico... Deixemo-nos supreender por Deus!      
 
António Sílvio Couto


sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Novas versões de ‘a rã e o escorpião’

Perante a situação política/parlamentar/governamental/social do nosso país, atualmente, parece ser oportuno recordar a fábula da rã e do escorpião.
À beira do rio, um escorpião tentava atravessar para a outra margem, mas não sabia nadar.
Ali perto estava uma rã, conhecedora do rio e das correntes…porque sabia nadar.
O escorpião pediu, então, à rã se lhe concedia o favor de o atravessar para a outra margem… Ao que a rã ripostou: tu tens um veneno fatal e quem me afiança que não usarás desse veneno e morreremos ambos afogados… O escorpião jurou que não usaria do veneno, pois morreria afogado, dado que não sabia nadar.
Acordada a viagem, o escorpião colocou-se no dorso da rã e começou a travessia… Mas, percorrido mais de metade do trajeto, o escorpião picou como o veneno a rã… Esta retorquiu: não cumpriste o prometido e agora, vamos morrer os dois… Ao que o escorpião respondeu: está na minha natureza picar com veneno… não pude resistir!

= Na Assembleia da República os escorpiões são mais do que muitos…encavalitando-se no novo governo. Na vida social e sindical há pequenos e mais vistosos escorpiões…escondidos na folhagem das manifestações. Nos discursos encriptados dos políticos – da rotulada ‘direita’ ou na pretensa ‘esquerda’ – podemos encontrar mais do que diversos escorpiões…disfarçados de bem-falantes ao serviço das ideologias mais ou menos extremistas.
Efetivamente com tantos interesses em jogo, mais tarde ou mais cedo, surgirão os escorpiões atraiçoando quem neles acreditou. Com tantas visões sectárias não será difícil emergirem os escorpiões que atacam quando estiver mais em jogo os seus do que os portugueses em geral. Com tantas fraturas – desde temas até aos objetivos mais subtis – não será longo o tempo em que os escorpiões virão cobrar em veneno o que deram em apoio…             

= Quantas vezes na vida social se é enganado, pois nem sempre as pessoas são sinceras e leais… dissimulando até atingirem os seus (pretensos) objetivos. Há situações que (só) se descobrem passados dias ou meses, mas, noutros casos, leva anos a descobrir o engano. Há casos que acontecem ao nível mais básico do trato humano como noutras esferas e espaços de intervenção…conspurcando as relações sociais e a confiança entre todos.

= Na linguagem popular ouve-se: é preciso ter cuidado para não engordar o lacrau! Ora, lacrau é a denominação vulgar do escorpião e ‘engordar o lacrau’ é expor-se ao seu veneno, depois de ter cuidado dele. Com efeito, é muito provável que possamos ‘engordar o lacrau’ e ele/ela, depois, nos vir a morder ou picar com seu veneno. Isso pode acontecer, quando confiamos nalguém, dando-lhe importância e visibilidade e, posteriormente, essoutro/a vir a ser-nos falso senão mesmo a voltar-se contra nós...
Há, no entanto, um outro entendimento para o ‘engordar o lacrau’, que pode ser o exagero que conferimos à nossa autossuficiência e uma certa hipervalorização daquilo que fazemos ou dizemos…sem termos em conta os outros e aquilo que valem!

= Valerá a pena refletir sobre tantos lacraus/escorpiões que temos de enfrentar, a começar bem dentro de nós mesmos. Será quando tivermos vencidos esses que nos azedam e envenenam que teremos capacidade de ajudar os outros a vencê-los também. O pior dos lacraus/escorpiões é o nosso egoísmo e autoidolatria… tantas vezes bem mais fundos do que a nossa consciência… até de pecado!
Não haverá ninguém a quem possa ter cuidado – poderíamos antes dizer descuidado, desprezado ou ofendido – com espírito de escorpião/lacrau?
Eles andam por aí. Cuidemo-nos!  


António Sílvio Couto

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

O chocalho


Por decisão da Unesco, no passado dia um, na Namíbia, o chocalho – ou a ‘arte chocalheira’ – português foi declarado património cultural imaterial da humanidade com necessidade de salvaguarda urgente.

Esta arte é, predominantemente, exercida (fabricada e executada) no Alentejo… embora entendendo-se de Trás-os-Montes até aos Açores… Para alguns dos interessados em preservar esta arte, a classificação agora conseguida, pretende denunciar aquilo que não tem sido feito para que um certo mundo da pastorícia não morra!

= O que é um chocalho? Uma espécie idiofone (isto é, instrumento de percussão) em ferro forjado, colocado numa coleira ao pescoço dos animais (ovelhas ou gado bovino) contendo um badalo que emite sons que ajudam a localizar os animais… Embora tenham várias sonoridades, conforme a arte de fabrico, esta peça de artesanato torna-se, assim, em mais um motivo de salvaguarda da tradição e um grito contra o abandono do setor rural…em Portugal.

= Que tem (ou pode ter) este acontecimento a ver com a (nossa) situação política atual? Que coincidências haverá? Este fenómeno cultural que significado poderá ter para o resto da conjugação do país? Certas intervenções no mundo cultural não serão mais um arremedo da arte chocalheira… em risco? Que lições podemos tirar para o futuro próximo da Nação?

= Por que não acreditamos em coincidências, a classificação da Unesco do chocalho aconteceu no ‘dia 1 de dezembro’, dia da evocação da restauração da independência de Portugal do jugo castelhano. Ora, diante desta conjugação de datas, poderemos considerar que há muita gente – em tantos e variados campos – que faz muito barulho e pouco acrescenta à nossa identidade nacional. Pelo contrário, chama a atenção para dar a saber onde está, mas não se compromete na construção da mudança. Muitos lutam até atingirem o poder – usando todos os meios e sortilégios – e depois descansam nos benefícios. Com efeito, o cheiro do poder gera tal aconchego que até as ideologias mais extremistas se submetem à mais básica sedução…  

 

= Dizem que haverá pouco mais de uma dezena de artífices da ‘arte chocalheira’. Portanto, esta tradição está em vias de extinção como modo de vida. Ora, se, em Portugal, ainda houvesse outros tantos que fossem capazes de fabricar homens/mulheres com princípios, talvez ainda nos salvássemos deste lodaçal em que estamos a afundar-nos…a olhos vistos e sem perspetiva de mudança a curto prazo. Quantos ‘miguéis de vasconcelos’ (da restauração) proliferam nos gabinetes de tantas instâncias políticas! Quantos traidores se deixam seduzir por míseros vinténs e fazem calar a voz da consciência! Quantos estão, vistosos e radiantes, na hora da vitória e se vão tentando escapulir pelas portas dos fundos quando lhes cheira a certo de contas!

= De facto, seria muito útil regenerar as oficinas da ‘arte chocalheira’ em ordem a serem produzidos novos e mais sonoros chocalhos para serem colocados ao pescoço de tantos incompetentes e corruptos, de tantos enganadores e oportunistas, de tantos falsários e dissimuladores… A transumância pode começar…pela Assembleia da República… Que orquestra bela irá ser feita, neste imenso Portugal!

= Porque acreditamos que só a verdade vence, deixamos extravasar esta reflexão, pois acreditamos que ainda podemos construir um país mais humano porque mais fraterno e solidário. Agora que o tempo de Natal se aproxima não gostaríamos de ver continuada a sensação de que só nesta época se pensa nos mais desfavorecidos nem de que os governantes irão continuar a usar os seus concidadãos como peças de xadrez nos seus intentos mais subterrâneos…Que o chocalho nos acorde para a realidade nua e crua. Assim sejamos dignos desta arte ancestral e popular…

António Sílvio Couto



segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Advento 2015 - ‘Dá a mão ao teu irmão, dá a mão’


A caminhada de preparação para o Natal, que é o Advento, tem, na Paróquia da Moita, este ano, por tema: a mão, recorrendo à oração dos dedos do Papa Francisco.

Assim em cada semana do Advento teremos um dos dedos para nos ajudar a consciencializar a nossa vivência - pessoal, familiar e comunitária - rumo ao Natal deste ano.

- Na 1.ª semana - de 29 de novembro a 5 de dezembro - vamos ter em conta o dedo polegar e pensar e rezar por quem nos está mais próximo, lembrar e cuidar das pessoas de quem nos recordamos mais facilmente... os nossos entes queridos, por quem temos obrigação de rezar cada dia...

- Na 2.ª semana - de 6 a 12 de dezembro - temos em conta o dedo indicador e vamos rezar por aqueles que ensinam, educam e tratam, inserindo-se nesta lista os mestres, professores, médicos e sacerdotes... e todos quantos têm a função de conduzir e de decidir até sobre os outros...

- Na 3.ª semana - de 13 a 19 de dezembro - temos em conta o dedo médio e rezamos pelos governantes, isto é, os que gerem os destinos da nossa pátria e orientam a opinião pública, pois eles precisam também da orientação de Deus...

- Na 4.ª semana do Advento - de 20 a 24 de dezembro - temos em conta o dedo anelar: é o dedo mais fraco, recorda-nos que devemos rezar pelos mais fracos, por quem tem de enfrentar desafios,

os doentes, os esposos...

- No Natal: dedo mindinho é o dedo mais pequeno, convida-nos a rezar por nós mesmos, procurando cada um compreender as suas fragilidades e necessidades...
 

Diante de tantos sinais de egoísmo e individualismo, parece-nos útil e oportuno que, neste Advento, demos a mão a quem Deus coloca na nossa vida, cada dia ou ocasionalmente... Nada há de excecional, mas podemos fazer de modo novo cada momento do nosso dia a dia!

 
António Sílvio Couto


sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Os 3 ‘tês’


Por estes dias, de visita a vários países de África, o Papa Francisco serviu-se da visão dos três ‘tês’ – terra, teto e trabalho’ – para denunciar, esclarecer e anunciar ao mundo que ainda se sofre, nalgumas partes da Terra, da insuficiência quanto ao acesso ao bens da terra, para conseguir um teto condigno e para usufruir de trabalho.

Enquanto isso cá pelas terras lusas vamos assistindo aos mais díspares extremismos – mesmo que usando a termo ‘radicalismo’ como arma de arremesso contra os adversários/inimigos – das diversas forças partidárias e ideológicas. Estamos a viver um certo neossebastianismo dalguma esquerda, que, tendo chegado ao poder, vai inverter tudo e o seu contrário, pois a fatura de regalias não contém limites nem encolhe nas benesses…pelo menos para já!

= Não está em causa a aritmética dos eleitos, mas antes a possibilidade de, num futuro num próximo (mais rápido do que muitos pensam), termos de começar nova etapa de rigor. Com efeito, o termo ‘austeridade’ soa a sacrifícios – esses que muitos abjuram para si para, mas que, em breve, serão impostos novamente a todos – e tais comportamentos vão sendo conotados com ‘direita, capitalismo, neoliberalismo económico, despedimentos, salários em atraso’, etc.

= Ora o que precisamos é mesmo de mais rigor nas contas públicas e privadas, contrastando com um certo despesismo só possível porque alguém soube fazer as contas e amealhou para o tempo das ‘vacas magras’… Como seria útil a tantos mentores da nossa política ir ao texto bíblico para entender a expressão para não falarem de cor e sem conceitos esclarecidos!

= De facto, vivemos num país onde as posições políticas enfermam duma razoável ignorância e onde certos clichés vão proliferando ao sabor das modas – de certa comunicação social…pública ou privada – e dos interesses de grupos mais ou menos subterrâneos. Com muita facilidade se faz reverter uma derrota em vitória de secretária e onde quem ganha tem de submeter-se à provação de ser governado por velhos fantasmas e ou por ‘intelectuais’ sem provas dadas no ofício para que são investidos.

= Pelo que temos visto e observado tememos que as feridas vão continuar a sangrar e que os extremismos se vão radicalizar…e até quem não tinha posição tão exacerbada para com os adversários poderá assumir algum papel de menos boa insensatez. 

= Vemos, assim, crescer uma maioria (ainda) silenciosa que observa estas jogadas e provocações. Vemos que anda um certo descontentamento no ar e nem as notícias de atentados noutras paragens fazem suprir alguma angústia para com o nosso futuro coletivo próximo…e a curto prazo.

= Vejamos, então, como os três ‘tês’ estão a ser vividos entre nós:

. Terra – esta foi abandonada e já não produzimos o que comemos…Deu-se uma fuga da terra e, quando certas alianças (EU ou outras) falharem, entraremos em colapso, pois não sabemos, minimamente, amanhar a terra;

. Teto – a habitação vai sendo assegurada, mas as famílias endividadas não conseguem aguentar as prestações… Conhecemos casos de vida bem duros e dramáticos!

. Trabalho – este bem escasso para realização pessoal e o sustento familiar tem de ser mais cuidado e favorecido…sem a corja de promotores (políticos sem qualificação) da subsidiodependência…Os que precisam nem sempre são bem tratados e ajudados.


Algo tem de mudar pela justiça social e humana!         
 

António Sílvio Couto


 

quarta-feira, 25 de novembro de 2015

Do singular à comunidade


Os mais recentes acontecimentos na Europa e no mundo – atentados e terrorismo, medos e cataclismos – trouxeram à luz do dia uma espécie de pantanal em que temos vivido e em que estamos a afundar-nos: o acentuar da visão singular (individualista) de cada pessoa perante os constantes desafios à força comunitária de todos.

Vivemos, com efeito, num ambiente onde cada um quer ver valorizada cada vez mais a sua pessoa nem que para isso tenha de molestar/ofender os outros…da forma que lhe for mais ou menos conveniente. Vivemos numa (quase) irremediável tentação de nos apegarmos a nós mesmos, impondo aos outros os nossos gostos, feitios e modos de ser…egoístas, egocêntricos e melindrosos!

Nos mais variados campos de presença da pessoa humana, vemos serem impostos a todo o custo os direitos individuais, criando uma atmosfera de imensos egos em conflito e com ânsias de protagonismo… desmedido e intolerante à oposição. As mais recentes leis de teor fraturante, aprovadas no Parlamento, não passam, nesta perspetiva, de tentáculos duma certa ‘ditadura do eu’, onde os interesses minoritários mais agressivos e contestatários se sobrepõem ao todo mais sensato, de bom-senso e culturalmente humanista.

= Misericórdia: da assunção das falhas à vitória…com Jesus

Estando a preparar, no Advento, a celebração do Natal, sentimos que temos de descobrir nos outros aqueles/as a quem estendemos a mão e que nos acolhem e suportam em suas mãos. Daí surgirá uma abertura à cadeia de simplicidade, que nos faz sentir os outros em fraternidade e a vivenciar o que há de mais genuíno: apesar de limitados temos uma história comum, iniciada, mais radicalmente, em Jesus Cristo e continuada em Igreja pela comunhão na fé, pela esperança e na caridade.

A vivência do ‘ano jubilar da misericórdia’ – que tem início no próximo dia 8 de dezembro – será, então, uma oportunidade para descobrirmos nas nossas falhas, erros e até pecados, a imensa possibilidade de construirmos, onde quer que nos possamos encontrar, uma vitória das marcas divinas mais profundas: no rosto de cada homem/mulher havemos de descortinar a beleza da compaixão, do perdão e da paz. Com efeito, há sinais que temos de fazer brilhar, valorizando mais aquilo que nos une do que aquilo que nos possa separar. Somos mendigos da misericórdia, mas somos enviados a testemunhá-la, se a tivermos experimentando em nós mesmos.

Será quando nos sentirmos amados que poderemos difundir, ao longe e ao largo ou ao perto e muito próximo, a misericórdia divina nas relações humanas…mais básicas e essenciais.

= Compaixão: abertura à diferença…

A ‘invasão’ de refugiados com que a Europa tem estado lidar, deveria levar-nos a refletir sobre múltiplas dimensões de abertura à diferença. Com efeito, muitos daqueles que conseguiram chegar ao espaço europeu não passam de uns tantos beneficiados com as possibilidades em porem-se a caminho, fugindo às agruras – que vamos conhecendo, noticiosamente, muito mal! – económicas e sociais, às perseguições políticas e religiosas…à confusão que certos interesses europeus criaram ao depor ‘ditadores’ e opositores ao expansionismo ocidental, abandonando, posteriormente, as populações aos destinos mais incertos e inseguros.

Sobretudo, nós portugueses, com mais de cinco milhões de emigrantes, temos de saber acolher quem nos possa procurar. Há razões de teor humanista que nos devem fazer estar nesta abertura. Há razões até de âmbito demográfico, pois o envelhecimento ultrapassa os nascimentos. Há razões de natureza económica, pois o futuro da segurança social corre risco de colapso à falta de novos descontantes. Há situações de justiça, pois, se antes fomos recebidos, agora temos de retribuir a outros o que nos fizeram…

Só quando formos capazes de sair do nosso casulo egocêntrico é que perceberemos as necessidades dos outros. Só quando passarmos do singular – individualista, materialista e hedonista – para a dimensão do outro/a em convivência comunitária é que seremos pessoas livres e responsáveis, atentas e solidárias…capazes de dar e de receber. Estendamos a mão aos outros! 

António Sílvio Couto


sexta-feira, 20 de novembro de 2015

Quem tem medo do ’25 de novembro’?


Dentro de dias completam-se quarenta anos sobre os acontecimentos do ’25 de novembro de 1975’, essa data que trouxe alguma serenidade ao nosso país… pelo menos a uma porção de portugueses que não se revia nos exageros duma outra fação mais revolucionária… Nessa data foi posto termo, como que duma forma mais organizada, ao processo-revolucionário-em-curso, que, sobretudo, nos arredores da capital – com a (dita) margem sul associada – foi criando condições de instabilidade… internas e exteriores.

= Atendendo ao momento político, que estamos a viver com incidências de alguma crispação à mistura com uma certa jactância de forças àquela data (mais ou menos) reinantes, houve uma proposta, no Parlamento, para que fosse comemorada, de forma evocativa, a data do ’25 de novembro’ mais explicitamente.

Uns consideraram que isso permitiria trazer à liça os perigos do tempo presente ou no próximo futuro, lembrando façanhas daquele passado. Outros, temendo a repercussão na (pretensa) opinião pública, vão-se refugiando na ausência e escusa às reuniões para que o assunto seja tratado. Houve até – pasme-se a linguagem e o conteúdo – quem considera-se que tal evocação poderia ser uma espécie de jogatana política…

= Quarenta anos depois ainda há muitas feridas por sarar. Tantos anos e acontecimentos passados ainda se nota um certo ressabiamento de certas ideologias…no espectro partidário atual. Decorrido tanto tempo fervilha ainda um tal espírito de revanchismo para com os adversários, seja qual for a trincheira em que se coloque cada qual. Percebe-se que certos fantasmas ressuscitam com muita facilidade e fazem com que os ataques e diatribes se convertam em atoardas de mau gosto, senão mesmo de má educação.

= Será que estas pessoas, que ainda andam nesta política, não perceberam que o povo português tem memória e não vai mais continuar a ser guiado por mentores e fautores cujo principal interesse parece ser a sua autopromoção. As lições desse passado podem e devem servir-nos para compreendermos que as vitórias – mesmo que pírricas – depressa se convertem em derrotas e que os vencedores de ontem serão os vencidos e enxovalhados de amanhã. Já era tempo de aprendermos todos a sermos pessoas que respeitam os outros e que não é preciso ofender para ter razão, pois esta bem depressa se converterá em desilusão e conflito.

= Possivelmente o ’25 de novembro’ até conseguiu recompor alguns (ou muitos) exageros dos espertos do ’25 de abril’. Hoje como ontem não podemos continuar a fazer da capital (e arredores) o monopólio da politização. Ontem como hoje os valores mais simples vencem as arrogâncias e os intentos dalguns ‘democratas’. Hoje como ontem não podemos pactuar com subterfúgios de interesses de grupo ou de ideologia…

Porque acreditamos que não há – nem pode haver – donos da democracia, perguntamos: quem tem medo de comemorar o ’25 de novembro’? Também o ’25 de abril’ não é posse de ninguém. Quem se quiser apossar dele vai perceber que se comporta como uma espécie de ditador encapotado…mesmo que não o queira assumir.

Portugal merece melhor. Portugal precisa de muito melhor!
 

António Sílvio Couto


segunda-feira, 16 de novembro de 2015

Oh, mon Dieu, porquoi?


Ó meu Deus, porquê? – é a pergunta que surge diante dos atentados de 6.ª feira, 13 de novembro, em Paris e arredores. Tal como noutros momentos trágicos da história da Humanidade, poderemos sentir que algo de grave temos contra Deus para que Ele assim nos queira, desta forma, corrigir, avisar e fazer refletir.

Se nos atentados ao ‘Charlie Hbdo’ considerei que, apesar da condenação dos atos praticados não me sentia na obrigação ‘de ser Charlie’ – pois muito do que aconteceu, embora abjeto e condenável, era como que o colher dos frutos dalguma irreverência acintosa – agora sinto repugnância pela forma cobarde e indiscriminada com que se tentou atingir muitos inocentes…fazendo o maior número de estragos, sem olhar a meios nem à destruição.

Se usarmos o tríptico da revolução francesa – liberdade, igualdade e fraternidade – poderemos encontrar matéria para questionarmos a nossa cultura ocidental, tanto em aspetos benéficos como em dimensões mais subtis… que nos exigem uma profunda reflexão pessoal e coletiva.

= Liberdade

Há quem cultive a liberdade e a viva com responsabilidade, mas muitos outros fazem dela um pretexto para cada um fazer o que lhe apetece, tornando-a, nalguns casos, mais uma matéria de libertinagem do que de valor de autonomia e de ética. Ora, quando a liberdade ‘só’ permite fazer o que eu quero, sem me fazer respeitar a liberdade dos outros, já não estaremos a viver em liberdade, mas antes numa espécie de ditadura do egoísmo de uns sobre os outros, usando-os e criando para com eles comportamentos de duvidosa liberdade filosófica ou social.

Não terá sido isto que temos andado a semear na nossa sociedade ocidental: sou livre se faço o que me apetece ou de resto entro em conflito com quem me obstaculiza tais razões e vivências? Não se tem dado excesso de informação – noticiosa, intelectual, cívica ou moral – para que os mais fanáticos nas suas ideias possam conquistar as nossas sem custo ou usando a violência com as armas que lhes fornecemos? Será que a liberdade tem cor e distingue antes de unir?

No atribulado caminho da democracia, a liberdade é essencial, mas a segurança não pode ser questionada, quando está em causa o bem comum…

= Igualdade

Também este valor intrínseco da nossa convivência coletiva tem andado a ser um tanto maltratado, pois, se quisermos usar a analogia dos ‘porcos’ dum autor do século passado, temos de concordar que há uns que são mais iguais do que outros. Sabemos como todos – teoricamente – somos iguais perante a lei, mas nem sempre a lei trata de forma igual todos os cidadãos. Mesmo na França republicana – quanto mais em Portugal! – não é difícil de encontrar discrepâncias, atendendo às ideologias de cada interveniente… e as ideologias já não são só políticas e filosóficas, mas também ‘de género’ ou até de delito de opinião. Com efeito, bastará atender à divulgação de iniciativas de certas forças para percebermos que nem tudo é tão igual como se pretende insinuar…

= Fraternidade

Neste item da fraternidade temos uma longa e sinuosa história de atropelos aos sinais da conquista e da vivência da fraternidade, seja ao nível das culturas, seja dos povos e mesmo das línguas. Veja-se o alinhamento de fações e de grupos na cena internacional. Reparemos na promoção de umas certas modas de pensamento e de critérios de moralidade. Observemos quem manda no mundo e quais os valores que promove, difunde e vive. Hoje, temos uma espécie de propensão para a rejeição da dimensão espiritual – sobretudo se for de índole cristã – enquanto se vai tentando criar a consciência do ´sem-Deus’… numa espécie de diatribe ao serviço do consumo, do prazer e do hedonismo.

Os atentados de 13 de novembro devem-nos fazer pensar e exigem seriedade de questionamento à nossa liberdade, igualdade e fraternidade como temos estado a viver…até gora!      


António Sílvio Couto