Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



terça-feira, 30 de janeiro de 2018

Enganei-me e fui enganado…


Na nossa vida há momentos e situações, factos e personagens, vivências e experiências que só mais tarde conseguimos atingir-lhes o alcance, seja pela complexidade dos mesmos, seja porque, estando muito próximos do vivido, faltou algum discernimento e correta a avaliação de tudo e de todos…

Daí o título desta partilha/reflexão. Não vou referir qualquer caso em particular nem sequer alguma pessoa em concreto, mas antes gostaria de deixar pequenos flashs e interrogações… despretensiosos e sem tentativas de dar lições seja a quem for.  

– A vida nos ensina a relativizar tantas das coisas a que podemos dar ou ter dado muita importância em certos momentos, mas que, não sendo essenciais, nos ensinam a crescer pelo desprendimento e a aferição à nossa maturidade humana, psicológica e espiritual… 

– Em quantas situações podemos achar que a razão estava do nosso lado, mas, passado algum tempo, já podemos perceber que nem tudo é tão fundamental como víamos nessa ocasião. Talvez valha a pena colocar-nos de outra perspetiva para mudar a visão que temos disso em que insistíamos de forma tão persistente…  

– Por vezes há factos que só compreendemos o seu alcance passada alguma distância da sua vivência. Episódios nem sempre atendidos nem entendidos ganham outra leitura quando outros afins ou complementares nos fazem captar o verdadeiro alcance das coisas, das pessoas e mesmos das histórias por entre estórias…  

– Mas o mais complexo é aquilo que envolve pessoas com quem nos cruzamos na vida. Se bem que os aspetos anteriores incluam pessoas, será quando nos detemos sobre as personagens da nossa vida que nos damos conta de quão difícil é entender tantas das pessoas que Deus põe no nosso caminho. Sim, que não acredito em acasos nem tão pouco em meras coincidências: as pessoas com quem nos cruzamos e que passam a fazer parte da nossa vida são dádivas de Deus, umas como ajuda, outras como tropeço, muitas como sinais e tantas outras até como provações…senão mesmo como provocações. Ninguém se cruza connosco por mera flutuação de humores ou por outras voláteis razões…

Como poderemos interpretar que haja pessoas que deixam marca na nossa vida e outras simplesmente voaram nas memórias? Como poderemos compreender que se verifique sintonia por mais tempo com algumas pessoas e noutros casos nada ficou de importante? Que fatores contribuem para que umas pessoas compreendam o mistério da amizade – sincera, desinteressada e verdadeira – e que outras quase escapem da nossa vivência mais ou menos de forma fugaz, breve e sem história?

O que mais deixa más recordações são essas personagens que não são capazes de entender a nossa linguagem – seja ela qual for – nem acertam nos critérios que movem a nossa vida. Em quantas circunstâncias se nota que as palavras podem ser as mesmas, mas os conteúdos são muito díspares. Em tantas circunstâncias nos damos conta de que há pessoas que não estão preparadas – sem disso terem culpa alguma – para compartilharem as nossas tarefas, com alguma facilidade podem extrapolar a confiança que nelas depositávamos ou que podem usar-nos sem disso nos darmos conta. Em tantos momentos fica o amargo de parecer ter sido enganado naquilo que nos parecia um pouco mais do que umas tais conversas de circunstância…  

– Quantas vezes me tenho enganado por ignorância. Quantas vezes me posso ter enganado em razão de não ser suficientemente prudente. Quantas vezes terei sido mais simplório do que razoavelmente capaz de acautelar a confiança depositada em tantas pessoas.

Porque acredito que o engano não se combate com táticas de desconfiança. Porque que Deus colocou no meu caminho muitas pessoas dignas de crédito e de credibilidade, quero continuar poder partilhar tantas questões que fazem crescer na amizade, merecendo ‘antes dar do que receber’, como diz a oração de S. Francisco.         

 

António Sílvio Couto  



terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Regras e tarefas…na educação


Um programa televisivo trouxe para a ribalta um tema nem sempre bem tratado e cuidado pelos órgãos de comunicação social e até as (ditas) redes sociais: a educação das crianças…em família.

Vou reportar-me ao programa que vi na emissão em direto: uma psicóloga ‘intromete-se’ numa família para observar mais de perto as anomalias da mesma, sobretudo naquilo que à educação dos filhos diz respeito… Vai anotando e apontando sugestões, onde as regras de pais e filhos, de marido/pai e de esposa/mãe são questionadas e, por vezes, corrigidas, consertando novas regras e propondo-se desenvolver outras tarefas entre todos para que se vá mudando e se crie melhor ambiente familiar do que aquele com que se iniciou o programa…E os resultados – depois certamente de semanas a testar – vão surgindo para contentamento de todos, desde os programadores, os ‘atores’ e a família.

Surgiu, entretanto, uma razoável contestação por parte de certos gurus da pedagogia, dos defensores estatais das criancinhas e de tantos outros que, bem depressa, saíram a dizerem querer resguardar os mais novos. Talvez seja pena que não façam o mesmo para com programas de outros canais – de circuito aberto ou em cabo – quando também expõem crianças a concursos de culinária ou musicais, criando competição, derrota, traumas e sucessos à custa dos mais novos… Há situações em que, à mesma hora, são exibidos programas com crianças…para com uns há exigência e rigor, para com outros fica-se pelo encolher de ombros, só porque deixa no ar a sensação de fama à custa da exploração de crianças e de adolescentes! 

= Num tempo de antena para discutir a questão do programa que pretende educar, estiveram pessoas que já andam nestas questões de infância – talvez se devesse falar de ‘infantis’ – há anos de mais para que os resultados sejam os que se verificam no nosso país. As intervenções dessas figuras não têm trazido nada de bom à educação das crianças, pelo contrário, parece que as têm infantilizado ainda mais, mesmo que pareçam defendê-las… Há argumentos que ouvimos há mais de duas décadas e a pedagogia tem mudado, bem como as crianças estão noutro estádio social, familiar e cultural.

Também a tutelagem estatal deixa muito a desejar, pois, na maior parte dos casos, limita-se a retirar as crianças – ditas em risco – às famílias para as entregar a instituições onde cada criança custa ao estado cerca de mil euros, quando este dá de abono da família – dependendo do escalão – pouco mais de cem euros nos valores mais comparticipados… 

= O dito programa que ajuda as famílias a acertar critérios de educação, de família e de orientação na vida surgiu na cultura anglo-saxónica com expressão na Grã-Bretanha, há década e meia, adaptado e difundido nos EUA e no Brasil. Mas, mais do que olhar para o formato ou até o conteúdo, não podemos deixar de enfrentar o problema essencial: os pais são/serão educadores? Foram preparados para isso ou, pelo contrário, deixam correr as coisas sem terem critérios nem ferramentas para educarem os filhos? Até onde irá a hipocrisia de defender as crianças, mas não lhes darmos instrumentos de futuro, como a educação, as boas maneiras, o civismo, a civilidade, etc.?

A nós, cristãos, deve-nos preocupar se estamos a semear nas crianças os valores do Evangelho. Sobretudo se temos ao nosso cuidado crianças – nos centros paroquiais, nas catequeses, nos agrupamentos de escuteiros ou, simplesmente, nas celebrações da fé – devemos perguntar-nos se essas crianças encontram Jesus em nós e através de nós. Se as palavras que dizemos condizem com os valores que perfilhamos. Se ajudamos a criar nos mais novos uma proposta de civilização onde as questões da vida, da família, da paz, da verdade, da compaixão e do amor são comunicados mais por osmose do que por verbalização.

Há coisas de fé que se bebem com o leite materno e isso nem sempre é percetível nas nossas crianças. Ou, então, o que vemos são gestos e atitudes de rebeldia, palavras e comportamentos de irreverência e, nalguns casos, de malcriadez…

Talvez este programa não faça quase nada neste sentido de educar a vontade nas nossas crianças, mas temos todos a obrigação de complementar o ensino das escolas, que parece quedar-se pela instrução e não veicula valores… A família tem de o fazer com sabedoria, humildade e comunhão entre todos…    

    

António Sílvio Couto




segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Quando a terra treme…


Só neste mês de janeiro já houve três circunstâncias em que a terra tremeu de forma mais percetível: em Aljezur no dia 5, no dia 15 ao largo de Arraiolos e a 20 próximo de Monchique…Com efeito, a rede sísmica nacional tem vindo a registar diferentes ocorrências, tendo como locais registados ou zonas onde mais se sentiram tais abalos em volta de Lisboa e ao sul do Tejo… mais seis em janeiro e três em dezembro.

Estes registos parecem estar em crescendo na medida em que muitas dessas ocorrências se estendem por largas áreas em que são sentidas. Para já não têm passado de susto e os prejuízos materiais têm sido de pequena monta, se é que se verificam, sem ainda termos acidentes pessoais a considerar.

O que são sismos? Como se caraterizam os abalos sísmicos? Quais as razões dos abalos sísmicos? Quais as consequências dos terramotos?

Os sismos são movimentos vibratórios que ocorrem na superfície terrestre originados por uma libertação brusca de energia. Por seu turno, abalos sísmicos entendemos acontecimentos que resultam de uma perceção por parte das populações dos movimentos vibratórios.
Um sismo não é um processo geológico isolado. Normalmente é precedido por uma sucessão de pequenos abalos, designados por abalos premonitórios, que poderão querer anunciar a ocorrência de um sismo violento.
As réplicas, após o abalo principal (considerado o mais forte), ocorrem como sismos de menor magnitude. O seu número atinge muitas centenas, embora a sua ocorrência diminua com o tempo.  

Embora, muitas vezes, só nos lembremos dos riscos quando já não há solução, temos vindo, no entanto, a assistir à prevenção das populações para este fenómeno que em Portugal pode deixar rastos de muito mau trato, se não estivermos preparados com as edificações, com as medidas de autoproteção e mesmo com o modo de ligar com isto, por vezes, imprevisto, mas não impossível de acontecer.

 = Que lições podemos tirar dos tremores-de-terra? Serão só fenómenos da natureza ou envolvem algo mais de lição de vida? Será uma forma de Deus falar, ralhando? Até que ponto podemos meter a divindade ao barulho ou exclui-la de modo simplista? Neste ateísmo prático em vivemos, normalmente, ainda haverá espaço para que Deus nos diga qualquer coisa quando acontecem tais fenómenos? Não será que, por não ocorrerem estragos, ainda julgamos que a coisa está sob controlo?

Talvez possam pensar que estas perguntas são próprias de quem tem medo dos sismos e se atemoriza com os abalos. Talvez eu seja ainda dum tempo onde Deus não podendo explicar muitas coisas, mas ao menos poderá dar-nos uma certa luz para podermos discernir o que Ele nos quer dizer. Talvez os terramotos só aflijam quando acontecem e, no resto do tempo, andaremos como se não tenhamos esse risco não-controlado de fazermos tudo como se tal não possa acontecer… 

= Qualquer coisa se move sob os nossos pés. Não o vemos e, na maior parte das vezes, não o percebemos. Embora se vá fazendo o esforço por adequar as construções aos riscos de abalos sísmicos, a maioria das construções ainda sofrem de muitas mazelas, que, na possibilidade de terramoto, quase entrarão em colapso.

O mais aflitivo neste quadro sociocultural é alguma negligência sobre a matéria com tantos outros fatores de perigo que lhes estão associados. Talvez nos falte uma cultura de cuidado em matérias nem sempre atendidas da forma mais prudente e sensata. Não será, com efeito, uma espécie de cientificismo que nos vai livrar ‘ipso facto’ dos perigos e dos riscos. Há uma razoável humildade, que teremos de cultivar e educar, no trato com as coisas da natureza e, sobretudo, tendo em conta a sua imprevisibilidade.

Quem não fica aterrado ao ver imagens das consequências dum abalo sísmico? Quem não se sente perplexo e confuso com os avisos da ‘mãe’ natureza? Quem não se comoverá com relatos de destruição dos terramotos sem conseguirmos fazer pouco mais do que nada?

Se há fenómenos da natureza que nos encantam e fascinam, os sismos deixam-nos um amargo de incompetência em sabermos resolver algo que nos ultrapassa e quase afunda, em sabermos pouco mais do que remendar – por muito que se faça e saiba – ou remediar, em recolher os estragos do que em ser capaz de interferir para que não aconteça. Dos terramotos e das suas consequências, livrai-nos, Senhor!     

 

António Sílvio Couto  



sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Os padres são como os aviões!


É atribuída ao Papa Francisco a seguinte frase: ‘os padres são como os aviões, só se fala deles quando caem’!

Certamente que o Papa Bergoglio sabe o que diz, tanto pela experiência humana de longos anos de padre e de bispo, mas também agora como romano pontífice…

Se quisermos perceber o que certas pessoas pensam dos padres – no geral e no particular sobre algum em concreto – será preciso que eles caiam, isto é, que destoem da normalidade, seja ela rotineira, seja de indiferença. O mesmo acontece com os aviões: quase nem damos conta deles – e são às centenas os que cruzam o nosso céu cada dia – e só se fala deles quando se dá um acidente. Aí reparamos que os aviões fazem parte da nossa convivência…até que precisemos de usá-los. 

= Neste mundo feito de sensacionalismo e do valor efémero das notícias torna-se uma espécie de ‘momento de glória’ conseguir colocar uma situação dum padre em desfavor. Que os digam certos órgãos de comunicação social para quem notícias (negativas) de padres têm quase precedência sobre outros assuntos mais significativos até da vida social pública. Arranjem um problema, por mais vulgar que seja noutros casos e em setores da vida coletiva, que com um padre logo vemos os abutres que se deliciam com a refeição da suspeita, da maledicência e mesmo da má-criação…

Que se pode, então, fazer com casos que envolvam padres? Ignorá-los e fazer de conta que não existem? Branquear nem que seja o erro só porque foi praticado por um padre? Como tratar com rigor o que disso necessita e secundarizar o que não é essencial? Como deve reagir na comunicação social um padre, quando alvo dalguma notícia: em silêncio (possivelmente cúmplice) ou dando, ao menos, a sua versão dos factos ou boatos? Será que todos sabem atuar, falar ou calar no tempo adequado?  

= Nesta santa Igreja dos pecadores podemos e devemos citar alguma frase que disso nos ajude a assumir o que somos e a corrigir o que é necessário.

«Todos os membros da Igreja, inclusive os seus ministros, devem reconhecer-se pecadores. Em todos eles, o joio do pecado encontra-se ainda misturado com a boa semente do Evangelho até ao fim dos tempos. A Igreja reúne, pois, em si, pecadores abrangidos pela salvação de Cristo, mas ainda a caminho da santificação» (Catecismo da Igreja Católica, 827).

– Podemos inferir deste texto do magistério da Igreja que, antes de tudo, os padres são cristãos pecadores, chamados, por Deus e em Igreja, a exercerem um ministério de presença divina num mundo também ele pecador e necessitado de mudança e de conversão.

– Podemos aclarar que ninguém é santo sem passar pelo crivo do pecado assumido, arrependido e perdoado, onde os padres são, antes de mais, penitentes e só depois ministros.

– Podemos considerar que será pela humildade que todos – incluindo os padres – haveremos de aprender com os nossos erros, sem os negligenciarmos, antes servindo-nos deles como degraus na aprendizagem e amadurecimento na fé, pela esperança e para a caridade. 

= Nesta época de ‘cultura líquida’, onde as ‘certezas’ de antanho quase se tornaram obsoletas e até mesmo os critérios e valores rapidamente mudam em conformidade com os intervenientes e as causas que servem, esta temática do questionamento dos padres ganha outro alcance no derrubar de conceitos e de estereótipos onde, mesmo em forma de classe, era dada alguma segurança e estabilidade. Agora quase tudo se escoa como água por entre os dedos da complexidade do egocentrismo de ideias e de comportamentos. Com facilidade se vai desconstruindo o que antes era – com verdade ou em suposição – fator de estabilidade.

Neste mesmo afã de desmontagem vemos as variadas acusações sobre atos de indignidade de padres para com menores e outros subalternos. Se formos apurar o que um razoável número de órgãos de comunicação social falou da visita do Papa, por estes dias ao Chile, pouco mais ouviremos ou veremos do que as acusações sobre erros de clérigos naquele país…já há anos decorridos. Seria isso o mais importante da ação da Igreja católica naquelas paragens da América Latina? Novamente o avião foi atingido e os resultados emergirão!

    

António Sílvio Couto

segunda-feira, 15 de janeiro de 2018

Semana de oração pela unidade dos cristãos



De 18 a 25 de janeiro decorre, no hemisfério norte, a semana de oração pela unidade dos cristãos. Essas datas foram propostas, em 1908, por Paul Watson porque cobriam os dias entre as festas de São Pedro e São Paulo, tendo portanto um valor simbólico. No hemisfério sul, já que janeiro é tempo de férias, as Igrejas frequentemente escolhem outros dias para celebrar a Semana de Oração, como, por exemplo, à volta de Pentecostes (de acordo com o que foi sugerido pelo movimento Fé e Ordem em 1926), que é também uma data simbólica para a unidade da Igreja.


Qual o significado desta iniciativa das igrejas cristãs? Não será necessário explicar melhor a localização, no hemisfério norte, entre essas duas datas: 18 e 25? Quando vemos surgirem notícias de católicos mais tradicionalistas ainda será de manter esta iniciativa? Porque surgem dúvidas e ataques às propostas ecuménicas? Ao darmos menos interesse ao assunto, estaremos a viver ainda no espírito do Concílio Vaticano II? Será esta ‘semana de oração pela unidade dos cristãos’ um sinal de força ou de fraqueza dos católicos?


Vamos tentar responder a estas e outras questões subjacentes ao tema, recorrendo a dados históricos e a gestos proféticos de Papas e de outros responsáveis das igrejas cristãs, sobretudo do âmbito protestante e da igreja católica.



= No calendário tridentino, com a reforma do calendário romano geral de S. Pio V que lhe foi adstrita, no dia 18 de janeiro, celebrava-se a festa da ‘cadeira de São Pedro em Roma’ e, no dia 22 de fevereiro, a mesma festa com a diferença de ser a ‘cadeira de São Pedro em Antioquia’. Ora, na configuração da semana de oração pela unidade dos cristãos quis-se localizar este momento de índole teológico e pastoral entre celebrações que envolviam as duas grandes figuras de Pedro e de Paulo, deste se celebrava e celebra a conversão no dia 25 de janeiro. Assim, a semana de oração pela unidade dos cristãos é enquadra pelas celebrações de dois sinais importantes de cada um destes dois apóstolos: de Pedro a cadeira como símbolo da autoridade e de Paulo a sua conversão como processo fundamental para o cristianismo.



= Depois dalgumas propostas dispersas, desde os séculos XVIII e XIX, sobretudo no campo protestante, foi no início do século XX, em 1908, que se deu a primeira iniciativa, pelo reverendo Paul Wattson, do oitavário da unidade dos cristãos. Posteriormente foram dados passos pelo ‘movimento fé e ordem’ com sugestões para esses dias de oração pela unidade dos cristãos. Em França foram percorridos novos trilhos para cimentar esta iniciativa de fomentar e de viver a unidade entre os cristãos. O Papa Paulo VI e o patriarca Atenágoras rezaram em comum, em Jerusalém (1964), pela unidade entre os cristãos. O Concílio Vaticano II deu uma mais forte orientação sobre o tema com o decreto ‘Unitatis redintegratio’ sobre o ecumenismo e a vivência desta semana de oração. Em 1968 – há cinquenta anos – assinala-se o primeiro uso oficial do material para a semana de oração pela unidade dos cristãos preparado, em conjunto, pelo ‘movimento fé e ordem’ e pelo secretariado para a promoção da unidade dos cristãos, hoje, pontifício conselho para a promoção da unidade dos cristãos. Desde 1975 que o tema e o seu desenvolvimento é preparado por um grupo local – protestante ou católico – e seguido pelas várias igrejas… nessa ocasião foi um grupo australiano. Portugal fez este serviço em 1996 como um texto extraído do livro do Apocalipse. Neste ano de 2018, o material foi preparado por um grupo das Caraíbas, tendo por tema: ‘A tua direita, Senhor, esplendorosa de poder’.



= Mais do que uma leitura de fraqueza ou de força, a semana de oração pela unidade dos cristãos manifesta um desejo imemorial de Jesus expresso na última Ceia: Pai, que todos sejam um, como Eu e Tu somos um. Com efeito, o escândalo da divisão entre os cristãos das várias Igrejas – católicos, ortodoxos e protestante – continua a ser uma chaga aberta e sangrando. Precisamos, efetiva e afetivamente, de nos unirmos todos os que acreditam em Jesus e consertar estratégias para levar o Evangelho a espaços e estruturas aonde ele não entrou. Pouco importa quem o faz, desde que seja em nome de Deus e unidos em Igreja. Por isso, certos indícios de proselitismo só servem a divisão e o mal…
António Sílvio Couto  


quinta-feira, 11 de janeiro de 2018

Números graves da sinistralidade rodoviária


Segundo os dados do último ano, os números da sinistralidade rodoviária, em Portugal, estão ao nível fatídico de há três anos atrás, verificando-se um retrocesso nesta ‘guerra civil’ que temos vindo a travar com maior ou menor sucesso nas nossas estradas e ruas.

Em 2017 houve 130.157 acidentes, com 509 mortos, 2.181 feridos graves e 41.591 feridos ligeiros…num agravamento de 14% (no que se refere às vítimas mortais), em relação ao ano anterior. Por distritos, o de Lisboa foi aquele onde houve mais acidentes (26.698), mas o do Porto foi onde se verificaram mais mortos, 68. Acima de dez mil ocorrências encontramos também os distritos do Porto, Braga, Faro, Aveiro e Setúbal.

Com melhores estradas (autoestradas, vias rápidas e mesmo ruas) quais são, então, as causas que dão tais consequências? Segundo a entidade responsável pela prevenção rodoviária, os motociclos são os culpados duma grande parte do aumento dos números de sinistralidade rodoviária, incluindo ainda nos fatores de pior desempenho o álcool e os atropelamentos…Só, no ano passado, deram-se quatro centenas de atropelamentos, seguidos de fuga, no nosso país. Muitas das ocorrências deram-se nos espaços das localidades.

O setor jovem da população (dos 18 aos 24 anos) também aparece como elemento agravante para a sinistralidade, dada a possível pouca experiência na condução e outros fatores de risco associados à velocidade e uso de elementos exteriores à condução, onde se podem incluir as drogas e o álcool… 

= Quando já se tinha atingido um número de menor dramaticidade, eis que este flagelo dos acidentes rodoviários volta a deixar vítimas, tanto diretas como indiretas. O que é que fez com que este fenómeno se tenha revertido com consequências tão tristes e trágicas? Há quem aponte um certo alívio económico para que os acidentes possam também ter disparado, pois as pessoas passaram a andar mais de carro e talvez a terem menos cuidado na condução. Outros referem que os preços mais baixos dos combustíveis se tornaram também promotores de haver mais carros na estrada e, com mais tráfego, a suscetibilidade de haver mais acidentes acrescentou-se.

Apesar de podermos encontrar estas ‘novas’ causas, há questões antigas que ainda não foram totalmente resolvidas. O excesso de velocidade – nalguns casos também a velocidade muito baixa – é um fator potenciador de acidente, pois a máquina domina o condutor e este não consegue impor-se ao veículo… Outros elementos perturbadores na estrada pode ser a desatenção aos perigos com mecanismos introduzidos no processo de condução, tais como o uso do telemóvel, o hábito de fumar ou até mesmo a distração ao volante…O clássico contributo de elementos perturbadores de quem conduz, como a introdução do álcool ou das drogas… Não podemos deixar de ter em conta – possivelmente bem mais do que aquilo a que se atende – a educação ao volante, pois o veículo não poderá tornar-se uma espécie de meio da afirmação pela negativa com gestos, comportamentos e atitudes menos respeitadoras dos demais…introduzindo a (dita) condução defensiva e irradiando a condução agressiva e/ou ofensiva! 

= Talvez se deva investir – dizemo-lo do contexto de formação moral cristã – mais na educação positiva em ordem a respeitarmos e sermos respeitados nas regras de trânsito, fazendo-nos ainda respeitadores dos valores da vida em contexto rodoviário. Em 2003, numa nota da Conferência episcopal portuguesa foram-nos apresentados os ‘pecados sociais’, entre os quais eram incluída ‘a irresponsabilidade na estrada, com as consequências dramáticas de mortes e de feridos, que são atentados ao direito à vida, à integridade física e psicológica, ao bem-estar dos cidadãos e à solidariedade’. De então para cá, já nos acusamos de não sermos devidamente respeitadores dos outros na estrada, quando fazemos manobras perigosas ou não cumprimos corretamente o código da estrada? Já entrou nos nossos hábitos de condução a capacidade de sermos bons cristãos pela defesa pessoal e dos outros? Já cumprimos as regras, mesmo sem a pressão dos fiscalizadores, tanto pessoais como das máquinas?

Não podemos nunca esquecer que, em cada veículo que circula na estrada, pode estar um potencial infrator ou até praticante duma infração mais ou menos grave ou até mortífera… e não são os outros, é cada um de nós. Temos de mudar de comportamento…enquanto vamos a tempo de salvar vidas!     

    

António Sílvio Couto



terça-feira, 9 de janeiro de 2018

Indícios de guerra…em termos de ‘desporto’



Quem tiver um pouco de tempo e/ou de paciência poderá ainda aguentar alguns dos programas de jogo-falado com que a maioria dos canais televisivos/noticiosos – gerais ou de clube – martirizam quem lhes der espaço. As posições clubísticas são do pior que se possa imaginar, tentando cada um ser ainda mais maldizente – talvez o termo devesse ser malcriado – do que o outro, inserindo argumentos e diatribes do mais baixo nível que se possa suspeitar. Alguns nem imaginam que só a sua presença afasta quem quer que esteja sintonizado no mínimo.

Mas será este assunto assim tão importante para fazer perder tempo quem possa estar a ler-nos? Os programas não são sobre futebol – outros desportos quase são esquecidos – e tendo em conta a táticas, as habilidades ou os resultados? Não se deveria dar algum desconto à coloração de cada interveniente e não tentar generalizar, de algum modo, as questões?

A cada uma destas perguntas dizemos: sim e não – ‘sim’ porque muito tem subjacente o dito futebol e ‘não’ porque este ambiente é já do foro político, pois se está a germinar um estilo de fazer, de discutir e de tomar posição como o daqueles ralhadores de serviço e, nalgumas situações, as discussões ali geradas servem de cortina de fumo para problemas sociais, económicos e até laborais mais fundos e não abordados corretamente. 

 

= A partidarite dos clubes – agremiações muitas delas centenárias e de ascendências sociais distintas – funciona como uma espécie de divisão entre os adeptos, os sócios e os simpatizantes, tentando cada qual tirar proveito para se dizer com mais expressão social, com melhor relação económica ou até para fomentar uma espécie de sublimação de inconscientes coletivos mais ou menos racionais. Com efeito, o teor de adesão a um determinado clube é mais do foro emocional do que da área da razão, por isso, é que com muita dificuldade se muda de clube nem que ele ande pelas ruas da amargura. Há na afinidade clubística uma espécie de mística que talvez nem certos aspetos de religião consigam explicar, quanto mais fazer perceber a quem não for dessa cor…

A cativação dos mais novos para a simpatia por um clube e a antipatia para com outro tem muito a ver com as épocas de vitória e de identificação com os sucessos, nessa vivência coletiva das falhas pessoais. Até mesmo a valorização dum determinado jogador e a sua posição no campo leva a que possa haver preferência por um e não por outro dos (pretensos) grandes clubes…nacionais ou estrangeiros.

Casos há, na atual circunstância, em que as lutas partidárias são colocadas em plano secundário e as convulsões clubísticas se sobrepõem a tudo o resto. Nalguns programas chegam a ser todos do mesmo partido (de fações diferentes ou não), mas bem distintos nas leituras dos futebóis em radical distinção…

 

= Ao contrário do que seria desejável os jogos fazem-se fora do campo e onde os que fabricam a ‘festa’, isto é, os jogadores são o elo mais fraco. Pelo contrário, os dirigentes, os árbitros, os treinadores – estes merecem mais respeito, se se derem a tal – e mesmo os responsáveis de comunicação fazem agora parte do descontentamento, atiçando guerras e conflitos, incendiando as massas, gerando e gerindo o mal-estar crescente e belicoso… antes, durante e, sobretudo, depois de cada jogo ou jogada…Este mundo aparte que é o futebol mobiliza paixão e milhões, podendo fomentar a concórdia, mas que também pode ser gerador de intrigas, de falcatruas, de corrupção e mesmo de sinais de guerra. Se nada se ganha num jogo, pelo contrário, tudo poder-se-á questionar se as pessoas perderem o respeito dumas pelas outras e, particularmente, quando, por entre pão-e-jogos, se vai alienando o povo…manipulado, ignorante e néscio!

 

= Está na hora de denunciar quem tenta fazer do desporto – e do futebol em especial – uma distração para que não se diga a verdade. Está na hora de haver quem assuma as suas responsabilidades nas tensões que vai introduzindo entre pessoas e regiões, entre autarquias e bairros, entre os mais fracos e os mais poderosos… Acabou, é certo, o amor à camisola, mas não se faça da luta pelo poder um subterfúgio para atingirem os seus intentos e sucessos económicos… Antes que seja tarde, acordemos, já!

 

António Sílvio Couto