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terça-feira, 20 de dezembro de 2022

O último dos moicanos (*) ... da diocese de Setúbal


    
No segundo dia da ‘novena’ do Natal, bem pela noite, faleceu o senhor padre Francisco de Jesus Graça, com a vetusta idade de noventa e um anos.

Nestes vinte cinco anos, que levo de presença nesta diocese de Setúbal, vi partir (pelo falecimento) e chegar (pela ordenação sacerdotal) alguns dos mais significativos padres na segunda metade para a celebração do cinquentenário da sua ereção canónica.

Atendendo ao significado deste Padre que é como uma espécie de último ‘moicano’ da construção e afirmação da diocese no conspecto nacional da Igreja em Portugal, ouso escrevinhar umas palavras de referência, de admiração e de saudade deste senhor Padre que marcou indelevelmente Setúbal (cidade e diocese) e quanto a ela se possa referir.

1. Recordo, mesmo que forma sucinta, outros padres que faleceram – sem ordem cronológica nem de importância humana, antes só por memória – e que tanto me marcaram: Agostinho Gomes, Júlio Nogueira, Manuel Frango, Ricardo Gameiro, Alfredo Brito, Manuel Marques, António Sobral, David Pinho, Manuel Gonçalves, Jaime da Silva, Adalberto Tacanho, Manuel Vieira, José Esteves, Carlos Alberto, Domingos Morais, Álvaro Teixeira ... todos com razoável idade e, mais na ‘flor da vida’, João Luís Paixão.

2. Que dizer – de forma límpida e em jeito de testemunho – do senhor Padre Francisco de Jesus Graça, que partiu de forma madura e amadurecida? Como o poderemos enquadrar na construção da diocese de Setúbal, nestes quase cinquenta anos? Quais as lições humanas e eclesiais, de vida e de presença no mundo, sacerdotais ou católicas poderemos colher da longa vida de serviço à Igreja do senhor padre Francisco Graça?

Nos tempos mais recentes tornei-me comensal do almoço da quinta-feira santa, na casa episcopal do senhor Padre Francisco Graça. Pelo significado desse dia – instituição do sacerdócio ministerial – tal momento revestia-se grande simbolismo: ano após ano fomos percebendo o tempo a passar por todos e a vermos chegar novos, no ministério e na idade.

Sobretudo depois de retirado das lides paroquiais mais ativas, íamos captando o à-vontade de querer estar em conversa descontraída e atenta aos problemas e vivências dos outros padres mais novos, que éramos.

3. De uma forma quase emblemática do seu coração de padre foi marcante essa época, há cerca de dez anos, em que foi confrontado com a saída intempestiva do ministério sacerdotal de um jovem. Ouvi-lhe num tom dramático: em que é que eu falhei... Por mais que o tentássemos dissuadir de que nada teve a ver com o assunto, o senhor Padre Francisco Graça matutava naquela questão... Por aqui pude aquilatar do seu coração sacerdotal que lancinava de dor e de quase crise de homem de Igreja.

4. Nesta hora da sua partida, certamente, todos têm recordações e memórias agradáveis do senhor Padre Francisco Graça. Ele que, nesta diocese, serviu com três bispos, possa alcançar-nos do Céu o dom de um novo pastor tão zeloso, simples e culto como ele foi. Setúbal precisa e merece!

(*) América colonial, 1757. Franceses e ingleses, aliados a diversas tribos índias, lutam pelo novo continente. O batedor Olho-de-Falcão não pertence a nenhum dos lados. Criado pelos moicanos depois da morte dos pais ingleses, e mais à vontade na floresta do que nos colonatos, viaja com o moicano Chongachook quando salva duas irmãs inglesas, que escoltará até ao forte onde são esperadas pelo pai. No decorrer dessa perigosa jornada, e nas dificuldades que daí em diante se sucedem, vão-se fortalecendo os laços entre os dois homens, o batedor e o índio, cada um com sua filosofia de vida e a sua independência, nutridas e formadas pela silenciosa floresta virgem e confrontadas com o clamor da batalha pela posse do território.



António Silvio Couto


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