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sábado, 3 de dezembro de 2022

Da riqueza da fé partilhada…ao desinteresse injustificável


 Por estes dias decorreu na Moita um singelo colóquio sobre a devoção a Nossa Senhora da Boa Viagem em vários pontos do país: Aguçadoura (Póvoa de Varzim), Ílhavo, Constância, Peniche. Sesimbra e Moita. Representantes destas localidades estiveram durante quase três horas coloquiando na biblioteca municipal.

O cartaz anunciado previa a presença ainda de outros intervenientes de Ericeira e de Marinha das Ondas (Figueira da Foz).

Participaram nas comunicações pessoas de diferentes estádios sociais e religiosos: dois padres, um seminarista e três leigos – um médico, uma funcionária escolar e um professor-investigador.

Deste evento – diga-se: merecia mais atenção, presença e cuidado – colhi várias lições:

1. Boa parte dos ‘palestrantes’ não se conhecia: isso aconteceu nesse dia e, sobretudo, naquela tarde ao partilharem coisas – vivências, festas, atitudes, comportamentos ou iniciativas – onde o sujeito da frase era ‘Nossa Senhora da Boa Viagem’. Deste modo se pode perceber que a fé, quando partilhada, se faz comunhão, gera entendimento e promove novas formas de participação. De uma forma simples, sincera e aberta foi possível enquadrar ‘festas’ em honra de Nossa Senhora da Boa Viagem tendo como cenário o mar – Ílhavo, Peniche e Sesimbra; os rios – Constância e Moita; e mesmo em terra – misto na Aguçadoura. Cada figuração de Nossa Senhora fixou dados ancestrais e assumiu aspetos algo comuns, se bem que diferenciados no tempo e no espaço. Esta riqueza ajudou todos a escutarem-se, a sentirem que tinham mais a dar do que a receber…

2. Quando há simplicidade temos mais a aprender do que a ensinar, pois assumimos que não passamos de breves centelhas de uma grande chama que fumega, cresce e se gasta em tantos outros lugares. Mal vamos se não sabemos ouvir, se não temos capacidade de querer conhecer outras realidades, mesmo que possam ser idênticas à nossa – ao menos na designação – ou se ainda achamos que não possa haver algo em que poderemos ajudar-nos a modificar.

3. Dizem, com propriedade, que só faz falta quem está! No entanto, por vezes, há ausências que revelam mais do que aquilo as pessoas pensam, na medida em que o tal desinteresse pode manifestar – mesmo inconscientemente – algo de mistura entre a ignorância e a nesciência, em razão de esta poder revelar que não há desculpa para que se continue a querer fugir da assunção das responsabilidades pessoais, sociais e mesmo de grupo. Quantas pessoas, na linha da fé cristã, continuam a deixar-se levar pela rotina, não se cultivando, ao menos, na linha da instrução humana e talvez científica. Quantas pessoas deambulam pelos espaços da igreja ao ritmo de quem prefere o consolo (quando dele necessitam) ao compromisso. Quantas pessoas querem responder às questões de hoje com o ‘fatinho’ da primeira comunhão… de antanho!

4. Não haverá por aí muitas capas – de procissão e não só – que não passam de encobrimento de ignorância, com receio que se descubram lacunas e defeitos? Não será que, quem está inseguro daquilo que faz, se entrincheira nas suas certezas, temendo o confronto leal com outros? O recurso ao chavão ‘tradição’ não servirá para continuarem uns tantos habilidosos a ludibriar os outros mais crédulos e manipuláveis? Não será que uns tantos fogem de aprender, com outros, na medida em que já parecem incapazes de se aferirem a novas realidades mais simples, e, porventura, mais verdadeiras?

5. Há dois tipos de pessoas que não consigo tragar: os malcriados (isto é, sem o mínimo de educação humana e social) e os autoconvencidos (numa linguagem mais elaborada asininos e afins). O pior é quando estes dois se aglutinam numa mesma pessoa. Infelizmente esta conjugação de adjetivos sincroniza-se em demasia em certas figuras: é bom de ver quem rudemente se comporta com arrogância, própria desses defendidos por estarem em vias de extinção…só no mundo animal!

Este segundo colóquio na Moita trouxe à luz do dia aspetos que precisam de ser cinzelados com arte…



António Sílvio Couto

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