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terça-feira, 20 de abril de 2021

Enriquecimento – como desprovar?

 


É o assunto na ordem do dia: o enriquecimento (substantivo). Depois diverge o adjetivo: ilícito, injustificado… De seguida surgem os complementos adstritos: corrupção, criminalização, ónus da prova… Numa flutuação que se vê, mas que custa aferir, confirmar ou aceitar.

Porque este assunto é transversal à nossa sociedade desde quase tempos imemoriais, tem vindo a ser adiado na confrontação prática…tanto legislativa como sociocultural. Foi porque um certo rastilho – de umas tais prescrições quase abusivas – incendiou as reações que o tema está quente…embora se deva deixar arrefecer para não queimar ninguém e muito menos continuar a ilibar (como sempre) os culpados…

 

1. A escola da sabedoria popular reza: ‘quem cabritos vende e cabras não tem, de algum lado lhe vem’. Isto é, precisamos de saber de onde é procedente a riqueza que alguém ostenda, sabe-se lá por real conquista, por manigância, por fortuna inesperada, por alguma tramoia ainda não detetada… Os sinais exteriores de riqueza assentam que nem uma luva no desejo de vaidade tão português. Somos um tipo de povo que gosta de acirrar a inveja dos outros, mesmo que isso signifique continuar a laborar numa mentira de vida mais ou menos desconhecida…

 

2. Num chavão algo comprometido – onde nitidamente se esconde a assunção das responsabilidades anteriores, atuais e futuras – temos ouvido: à política o que é da política e à justiça o que é da justiça! Mas será bem assim? Vejamos breves questões, de quem vê as coisas do lado de fora:

* Quem faz as leis (justiça) não é a política?

* Quem executa as leis (política) não é a justiça?

* A quem interessa excluir-se de não fazer leis se isso compete à política?

* Não haverá excesso de escusas para camuflar a incompetência do legislador (política)?

* A quem interessa manter uma promiscuidade entre políticos e escritórios de advogados, que, posteriormente, irão interpretar – e serem bem pagos – pelas leis que confecionaram?

 

3. Eis que, de repente, surgem propostas, projetos, iniciativas ou declarações para que o tema do enriquecimento seja tornado assunto nacional. Uns reclamam-se de inovadores, outros de resilientes e outros ainda de combatentes mais ou menos recentes. Emergiu um ‘robin dos bosques’ ou um ‘zé do telhado’ – dependerá na afinidade cultural ou procedência regional – que parece haver em cada um que deseja lutar contra os ricos, sem se desfazer da proximidade a eles, pois, podem pagar as contas mais subtis. 

Alguns que têm as mãos mais voltadas para dentro e exigem o punho cerrado querendo combater a corrupção e apresentando medidas para a criminalidade económico-financeira…mas o que fazem é o contrário quando isso envolve a sua formação partidária…

 

4. Daquilo que se vai percebendo das propostas mais ou menos publicitadas, vão surgindo sinais para que o combate à corrupção possa ter parâmetros de avaliação. Mas será que o critério de quatrocentos salários mínimos (pouco mais de duzentos e cinquenta mil euros) pode ser uma fasquia aceitável? Numa mera transação de droga esse montante não será facilmente ultrapassável? Com uma assinatura bem colocada num documento autárquico não se ficará a ganhar muito mais? O desfile de tantos carrões (e afins) não esconderá algo nem sempre declarado às finanças? Como entender, então, essa bizarria de ónus da prova, se quem fiscaliza tem de encontrar não as causas mas as consequências do enriquecimento? Por que será que muitos dos ‘novos-ricos’ surjam na área de relação entre quem faz a política e quem dela beneficia? Por que temos visto tantos autarcas e construtores civis passarem a exibir tantos sinais de riqueza? 

 

5. Claro que nem todos temos uma mãe com um cofre milionário... Nem todos temos sorte ao jogo... Nem todos teremos padrinhos ricos e bem colocados na sociedade e na política...Nem todos nascemos num berço de ouro... Como se diz com razão: só no dicionário é que sucesso aparece antes de trabalho...    

 

António Sílvio Couto

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