Perante a situação
política/parlamentar/governamental/social do nosso país, atualmente, parece ser
oportuno recordar a fábula da rã e do escorpião.
À beira do rio, um
escorpião tentava atravessar para a outra margem, mas não sabia nadar.
Ali perto estava uma rã,
conhecedora do rio e das correntes…porque sabia nadar.
O escorpião pediu, então,
à rã se lhe concedia o favor de o atravessar para a outra margem… Ao que a rã
ripostou: tu tens um veneno fatal e quem me afiança que não usarás desse veneno
e morreremos ambos afogados… O escorpião jurou que não usaria do veneno, pois morreria
afogado, dado que não sabia nadar.
Acordada a viagem, o
escorpião colocou-se no dorso da rã e começou a travessia… Mas, percorrido mais
de metade do trajeto, o escorpião picou como o veneno a rã… Esta retorquiu: não
cumpriste o prometido e agora, vamos morrer os dois… Ao que o escorpião
respondeu: está na minha natureza picar com veneno… não pude resistir!
= Na Assembleia da
República os escorpiões são mais do que muitos…encavalitando-se no novo
governo. Na vida social e sindical há pequenos e mais vistosos escorpiões…escondidos
na folhagem das manifestações. Nos discursos encriptados dos políticos – da
rotulada ‘direita’ ou na pretensa ‘esquerda’ – podemos encontrar mais do que
diversos escorpiões…disfarçados de bem-falantes ao serviço das ideologias mais ou
menos extremistas.
Efetivamente com tantos
interesses em jogo, mais tarde ou mais cedo, surgirão os escorpiões atraiçoando
quem neles acreditou. Com tantas visões sectárias não será difícil emergirem os
escorpiões que atacam quando estiver mais em jogo os seus do que os portugueses
em geral. Com tantas fraturas – desde temas até aos objetivos mais subtis – não
será longo o tempo em que os escorpiões virão cobrar em veneno o que deram em
apoio…
= Quantas vezes na vida
social se é enganado, pois nem sempre as pessoas são sinceras e leais… dissimulando
até atingirem os seus (pretensos) objetivos. Há situações que (só) se descobrem
passados dias ou meses, mas, noutros casos, leva anos a descobrir o engano. Há
casos que acontecem ao nível mais básico do trato humano como noutras esferas e
espaços de intervenção…conspurcando as relações sociais e a confiança entre
todos.
= Na linguagem popular
ouve-se: é preciso ter cuidado para não engordar o lacrau! Ora, lacrau é a
denominação vulgar do escorpião e ‘engordar o lacrau’ é expor-se ao seu veneno,
depois de ter cuidado dele. Com efeito, é muito provável que possamos ‘engordar
o lacrau’ e ele/ela, depois, nos vir a morder ou picar com seu veneno. Isso
pode acontecer, quando confiamos nalguém, dando-lhe importância e visibilidade
e, posteriormente, essoutro/a vir a ser-nos falso senão mesmo a voltar-se
contra nós...
Há, no entanto, um outro
entendimento para o ‘engordar o lacrau’, que pode ser o exagero que conferimos
à nossa autossuficiência e uma certa hipervalorização daquilo que fazemos ou
dizemos…sem termos em conta os outros e aquilo que valem!
= Valerá a pena refletir
sobre tantos lacraus/escorpiões que temos de enfrentar, a começar bem dentro de
nós mesmos. Será quando tivermos vencidos esses que nos azedam e envenenam que
teremos capacidade de ajudar os outros a vencê-los também. O pior dos
lacraus/escorpiões é o nosso egoísmo e autoidolatria… tantas vezes bem mais
fundos do que a nossa consciência… até de pecado!
Não haverá ninguém a quem
possa ter cuidado – poderíamos antes dizer descuidado, desprezado ou ofendido –
com espírito de escorpião/lacrau?
Eles andam por aí.
Cuidemo-nos!
António Sílvio Couto
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