Nos tempos que correm
temos de desconfiar cada vez mais e, sobretudo, cada melhor como atitude de
vida – intelectual, reflexiva e mesmo de bom senso – sobre as mais diversas
promessas, seja de quem governa, seja de quem pretende influenciar as decisões
dos outros…cívica e cinicamente.
O pretenso ‘bodo aos
pobres’ que foi publicitado – particularmente por quem sustenta o poder…embora
na retaguarda – já não vai ter tanta expressão como diziam: as contas não
permitem desafetar rigores – a ‘austeridade’ que cunharam para se referir ao
assunto vai sendo substituída por outros termos similares ou dissimulados…embora
com efeitos idênticos – e os favores a pagar/receber por certos apoios –
salário mínimo, redução da taxa de impostos ou devolução da sobretaxa e outros
– começam a tremelicar…embora a contestação possa ser, por agora, mais surda ou
na surdina.
= Do salário mínimo…
Há setores de atividade
para quem o aumento do salário mínimo – embora desejável, necessário e urgente
– se torna uma espécie de garrote para a sustentabilidade das instituições.
Falamos daqueles que têm por atividade a ‘economia social e solidária’, isto é,
aqueles que têm de governar instituições particulares de solidariedade social e
afins, bem como as iniciativas que não envolvem produção de matéria comercial
de venda ao público. Para algumas instituições/associações poderá ser a machada
final no equilíbrio das contas, tanto mais que a torneira do Estado – segurança
social e demais entidades subsidiadoras – dá cada vez menos para que se possa
fazer um serviço ainda digno e com dignidade.
Não se pode pedir às
famílias que comparticipem com algo de acrescento, se mesmo elas vivem em
contenção e presas por fios para equilibrar o que conseguem pagar…
Não se creia que bastará
acrescentar uns tantos euros à conta do ordenado ao final do mês e logo isso
reverterá em benefício de equilíbrio das obrigações das famílias… tanto mais
que algumas já vivem penduradas nas reformas dos mais velhos – nalguns casos
retirando-os das casas onde eram cuidados – para que consigam sobreviver desempregados
e com filhos dependentes.
Aos senhores e senhoras
do parlamento – tão sensíveis às questões sociais ‘de papel’ – desafiamos a que
nos contem casos em que viram as pessoas a pedirem-lhes a possibilidade de
estarem num local onde os filhos possam comer… Um dia, um casal de
desempregados pediu-me que seu filho pudesse estar no jardim-de-infância, pois
iriam fazer todo o esforço por pagar a mensalidade… mesmo que mínima, pois a criança
teria onde comer, ao menos uma vez por dia!
As instituições de
solidariedade social – muitas delas ligadas à Igreja católica – passam por
dificuldades, quase fazem, diariamente, milagres… mesmo que sintam a
concorrência (um tanto) desleal doutras ligadas ao setor público… Não somos –
como ipss’s – e nunca seremos postos de ‘lavagem de dinheiro’, como foi dito –
abusiva e caluniosamente – por certos extremistas no parlamento… Pelo
contrário, a maior parte das ipss’s fazem com pouco dinheiro o que outros
gastam a triplicar e com fracos resultados!
= … Ao controlo do salário máximo
Se há condições de
justiça mínima e aceitável, ousamos replicar aos legisladores que cuidem em não
aumentar os salários máximos, pois os pobres também são gente e não merecem continuar
a ver uns engordar e pavonearem-se em carros e comezainas e outros a contar os
cêntimos…envergonhada e ciclicamente.
É preciso que não se
esqueçam daquilo que disseram e tenham a honestidade mental, sentimental e
moral em serem comedidos nos seus autoaumentos, pois tornar-se-á vergonhoso
que, quem nunca teve de sujar as mãos a trabalhar no duro, venha dar lições a
quem sofre e em que o que tem foi conquistado com sangue, suor e lágrimas…
Se formos todos mais
verdadeiros poderemos perceber que a conquista do poder não justifica tudo e
nem o seu contrário. Ainda não perceberam que já não são levados a sério? O
‘bodo aos pobres’, afinal, faliu ainda antes de ser distribuído…nestes parcos
dias do ano a terminar. E depois, que virá? Haja moralidade!
António Sílvio Couto
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