Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



sábado, 26 de dezembro de 2015

Gestos de partilha…


Surgiu na publicidade desportiva, nesta época de Natal, o spot duma marca de material desportivo, associado a um clube português de grande dimensão, em que, num campo de prática de futebol – onde as crianças jogavam descalças…como tantos de nós na nossa meninice – se passa, como que por magia de estarem descalços para aparecerem calçados com chuteiras dessa marca… Ora, bem depressa, surgiram outos tantos rapazes, que descendo o morro, se querem associar ao jogo… Eis que, de repente, os que receberam as chuteiras novas a estrear, descalçam um dos pés – creio que, na maioria, o pé que chutava – e oferecem aos companheiros a outra chuteira para que todos possam jogar, ao menos, com um pé calçado!
A reação do representante do clube/fundação oferente ficou, como europeu, surpreendido – talvez não seja só ‘teatro’ publicitário – com tal gesto em admiração e confuso!... No spot publicitário, gerou-se, então, um jogo entre crianças com alegria e satisfação.
Não sabemos se outros clubes vão seguir a ideia de irem alegrar crianças em África – ou nalgum bairro periférico em Portugal – dando bolas e chuteiras, patrocinadas ou não por marcas de âmbito internacional. No entanto, cremos e desejamos que, muitos dos europeus tão instalados e, recorrentemente reivindicativos, possam seguir o espírito daquela partilha, saindo da comodidade mais ou menos egoísta…senão mesmo possessiva, triste e insensível aos outros! 

= Dar ou receber?
Nesta época natalícia estas duas palavras – dar e receber – foram, certamente, conjugadas em muitas formas e variados sentidos, senão na passiva ao menos na ativa. Com efeito, o tempo de Natal torna-se propício a dar prendas e/ou a receber presentes ou, talvez ao contrário, a dar presentes e/ou a receber prendas… Explicando, pois nem tudo é igual: o ‘presente’ é ou pode ser uma forma de eu me fazer presente a quem ofereço algo, tendo em conta aquele/a a quem ofereço; enquanto na ‘prenda’ eu posso ir preso, dando a alguém algo em que me deixo ir possessivamente para que, quem recebe, saiba que fui eu que ofereci. Por isso, é que muitas prendas são (ou podem ser) quase inúteis, embora lembrando quem as deu, enquanto uns tantos presentes podem ser úteis porque atenderam a quem foi oferecido.

= Cultivar a partilha
Outra faceta do Natal é a da partilha…nos mais diversos sentidos da sua expressão ou vivência. Quando alguém partilha, seja o que for – desde coisas até às palavras, passando pela presença ou mesmo um pouco de tempo – está a sair de si mesmo, indo ao encontro do outro/a. Na partilha gera-se mais uma cultura da atenção do que uma tomada de intenção. De facto, no mundo de hoje vive-se muito ensimesmado cada um nos seus problemas reais, virtuais ou mesmo fictícios. Quantas vezes encontramos pessoas cujo horizonte da sua preocupação é o seu próprio perímetro ou o mero alcance das suas vistas…curtas e sem alcance de saída.
Deste modo torna-se um pouco a contracorrente que, ao menos, Natal, se possam gerar novas oportunidades de partilha…sem reduzir isso à mera disponibilização de coisas materiais, embora estas – comida, roupa, artigos de higiene, calçado, etc. – possam e devam também estar presentes na partilha. Muito mal estaríamos, se já nem por ocasião do Natal, não nos despertássemos para a partilha fraterna e solidária!  

= Humanizar as relações das pessoas
Precisamos, cada vez com mais urgência, de humanizar as relações entre as pessoas, as famílias, as empresas, as autarquias, as igrejas, as religiões… e em todos os campos onde estejam pessoas. Com efeito, temos vindo a constatar que, pelo seu lado, os animais vão conquistando mais sinais de cidadania do que os humanos. Com facilidade se gera uma onda de solidariedade para com um animal menos bem tratado do que para com uma pessoa/família a passar dificuldades. Parece que algo vai mal no reino da civilização humana. Talvez devamos questionar-nos mesmo sobre o crescimento da oferta nas secções das grandes superfícies de comida para animal em detrimento dos espaços destinados às crianças… O Natal também passa(rá) por aqui?


António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário