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terça-feira, 15 de março de 2022

Sinais de fé por entre escombros

 


Circulou, por estes dias, nas redes sociais, um pequeno vídeo de minuto e meio, sobre o momento em que, segundo as fontes, era trasladado o Santíssimo Sacramento (Jesus nas hóstias consagradas) da catedral para um bunker em Kiev, Ucrânia. À passagem dos carros assinalados com a presença de Jesus-eucaristia as pessoas ajoelhavam, mesmo na neve, e benziam-se em sinal de respeito e de adoração.

Ao ver aquelas cenas ficou-me, desde logo, a comparação com o que aconteceria, se talvez se verificasse no nosso país: os habitantes (cidadãos, possivelmente cristãos/católicos) continuariam as suas lides…comendo ou bebendo, conversando ou voltando as costas…como se nada estivesse a passar-se.

Talvez esteja, neste como noutros pontos, a diferença e a superficialidade entre uns e outros.

 1. É dramático o panorama de insensibilidade às questões religiosas e de índole espiritual numa boa parte dos nossos concidadãos. Uma larga faixa de pessoas – alguns dizem que até aos quarenta anos – vive à margem das temáticas que envolvem assuntos de fé e muito menos de natureza cristã. Podem usar ainda os serviços da Igreja, mas dela mais não querem do que aquilo que lhes possa facultar a concretização das suas pretensões sociais ou mais ou menos culturais. Ainda um dia destes tive umas promessas de escuteiros – onde estavam presentes os pais e familiares dos que tinham a sua ‘festa’ – a participação na celebração era a de estar calado (coisa bem boa, se não for entretida com o dedilhar do telemóvel) e de um assustador silêncio por ocasião das respostas nos diálogos da missa…

 2. Sem pretender reduzir o plano de observação desta reflexão a este setor juvenil na Igreja, ficaram-me várias interrogações: que se aproveita, afinal, dos anos da (dita) catequese – dez anos é tempo em excesso ou temos andado a entreter-nos com minudências sem nexo? A aposta num certo vetor da catequese não estará anquilosado e sem resposta aos problemas de hoje, mas com soluções do passado? Andarmos a substituir a família à aquisição de conceitos não terá servido este panorama de deserto espiritual nas nossas assembleias rituais? Não teremos, de forma clara, audaz e sincera, de optar por outros métodos do que estes em uso? Em vez das crianças não deveriamos preferir as famílias para um tal novo sistema catequético? Não será preciso desfazer um certo espírito de rebanho nessas ‘festas’ de catequese, onde tantos chegam de repente que a assembleia habitual não consegue enquadrar os ‘invasores’?  Numa palavra: para problemas novos, urge encontram soluções diferentes…

 3. O desporto, as artes e outras atividades sociais concorrem – às vezes excluem – com aquilo que os proponentes religiosos ainda vão apresentando. Com formas muito subtis fomos perdendo a capacidade de cativar pais e filhos e estes – quais marionetas nas intenções dos mais velhos – foram sendo arrastados para fora dos espaços de propostas espirituais. Quem não se apercebeu que a marcação dos momentos desportivos – futebol, hóquei, atletismo, sessões de artes marciais, ginástica ou outras – para as manhãs de domingo eram uma forma de concorrência, nalguns casos desleal, mais fascinante e apelativa? As igrejas foram-se esvaziando e os pavilhões enchendo de praticantes e assistentes. A atração ao divino foi esmorecendo na proporção das vitórias e conquistas. Quais gurus de novas ‘religiões’ os diretores e responsáveis de secções tomaram o espaço dos catequistas e afins. Façamos o diagnóstico simples e desapaixonado, tentando encontrar soluções com respostas atualizadas…

4. Agora podemos analisar algo que aprendemos com o tempo da pandemia. Talvez seja útil vermos como podemos usar as ferramentas e meios da internet para darmos mais e melhor conteúdo às propostas de evangelização daí decorrentes. Na pandemia foi recurso, agora poderá servir de veículo mais alargado, amadurecido e comprometido, sabendo conciliar o anónimo com a vertente pessoal das questões e dos problemas. Fomos aprendendo a comunicar, mas precisamos de investir na arte de tal fazer. Uma missa em meio de internet não é igual à que acontece de modo presencial. Não basta mostrar o que se faz, é preciso fazê-lo segundo as regras dessa comunicação. Caminhando juntos – em Sínodo – havemos de conseguir!

 

António Sílvio Couto

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