Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



segunda-feira, 28 de março de 2022

Maiorias: possibilidades e riscos

 

Vai tomar posse, por estes dias, o XXIII governo constitucional. Saído das eleições do final de janeiro passado, está fundado sobre uma maioria eleitoral, vertida em deputados e reduzindo as oposições a algo pouco mais que figurativo no espetro parlamentar, o que não quer dizer social ou reivindicativo.

Atendendo a momentos anteriores de ‘maioria absoluta’ – de um só partido ou de coligação – poderá ser útil reportar-nos a esses momentos, perscrutando o seu significado e como todas caíram apodrecidas, esvaziadas ou como foram vencidas…

 1. Em 45 anos de democracia, em Portugal, houve cinco maiorias absolutas nas eleições legislativas: duas da AD (PSD/CDS/PPM), em 1979 (128 deputados) e 1980 (134 deputados); duas dos sociais-democratas sozinhos, em 1987 (148 deputados)... nesta época o parlamento era composto por 250 deputados; depois passou a ter 230 deputados: PSD, em 1991 (135 deputados); e uma do PS, em 2005 (121 deputados)... A maioria  absoluta do PS, em 2022, tem 120 deputados.

Nas quinze eleições legislativas realizadas desde o 25 de Abril de 1974, contando com as primeiras, de 1975, para a Assembleia Constituinte, o PS foi sete vezes a força mais votada, o PSD cinco vezes e mais três em coligações pré-eleitorais...  

 2. Diante destes dados mais ou menos objetivos como que se deverá questionar: quais as razões de derrota das forças que tiveram essas maiorias? A alternância eleitoral revela que os derrotados – sobretudo depois de serem tão vencedores – foram incapazes de manterem aquilo que os fez ganhar? Haverá alguma linha comum que possa ajudar-nos a perceber as causas e de medir as consequências dos insucessos, após as vitórias (pretensamente) tão alienantes? Souberam aprender com as vitórias e a colherem os frutos das derrotas?

 3. Talvez valha, novamente, recorrer à história destes anos da (dita) democracia. Portugal já foi intervencionado três vezes pelo Fundo Monetário Internacional: em 1977, seguiu-se 1983 e por fim 2011.

A primeira intervenção, em 1977, aconteceu num período em que o país registava uma taxa de desemprego superior a sete por cento, os bens estavam racionados, a inflação era crescente chegando a alcançar os 20 por cento, havia forte conflitualidade política e o escudo estava desvalorizado.
A segunda intervenção, em 1983, dá-se durante o período do chamado bloco central, um Governo de aliança entre PS e PSD, liderado por Mário Soares. Foi quase um Governo de emergência nacional, criado por se considerar que seria a melhor forma de combater a grave situação económica do país…ainda for a da União Europeia.
O pedido de apoio repetiu-se em 2011, após um governo de José Sócrates, numa altura em que as finanças públicas estavam de novo à beira da rutura.

 4. Agora que vivemos novos dados de instabilidade económico-social – pandemia, guerra, conflitos, etc. – não será expectável que vínhamos a ter um novo período de contenção, chame-se-lhe ou não de austeridade, ou possa ser travestido de cativações ou de dissimulações?

Diz o povo e com razão na primeira qualquer um cai, na segunda cai quem quer e na terceira só cai quem não pensa…Pelo tempo de aprendizagem efetuado já deveríamos desconfiar de umas certas medidas, que têm dado, quase sempre, os mesmos resultados. Com efeito, lançar dinheiro sobre os problemas não os resolve, antes os adia, mesmo que possam ser, por algum tempo, camuflados. ‘Proteger’ os pobres com meios de subsidiodependência serve para nunca se enfrentar as verdadeiras questões, essas que são estruturais, congénitas e culturais. Quando sermos capazes de não disfarçar nem de enganar as pessoas?

 5. Agora que temos um governo de ‘queridos inimigos’, que se espera? Quando constatamos a aglutinação no executivo de interesses da capital sobre o resto, que será de auspiciar? Deixem-nos reinar e veremos… aonde irão dar as prosápias de maioria, que sempre redundaram em desgraça e maior penúria.   

 

António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário