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domingo, 27 de outubro de 2019

Entre a vida e a governança





No mesmo dia e em horas desencontradas, decorreram na cidade de Lisboa, a 26 de outubro, dois acontecimentos paradigmáticos: a tomada de posse do XXII governo constitucional, no palácio da Ajuda, e a ‘marcha pela vida’ (na sua 9.ª edição), entre o largo Camões e o Parlamento, em Lisboa… e em mais cinco cidades: Porto, Braga, Aveiro e Viseu. 
= O acontecimento do governo ocupou todas as luzes e o resto sobre si, enquanto a ‘marcha pela vida’ teve umas fugazes imagens de um quase desdém e ao arrepio da mentalidade reinante.
Depois do limbo noticioso a propósito do governo…desde as eleições de 6 de outubro, vamos estar em grande frenesi nos próximos dias, vendo e mostrando as novas/velhas figuras, justificando os gastos acrescidos e as causas de diversão para que se não olhem os problemas de frente nem se tenha de tomar medidas contra a violência nas escolas, as inconcebíveis condições de viagem nos transportes públicos ou mesmo as incontornáveis mazelas da justiça… Tudo está bem, quando o governo diz que nada acontece ou não quer aceitar ver! 
= À semelhança de outros anos a ‘marcha pela vida’, mesmo de modo transversal, trouxe à colação problemas na área da saúde, onde dizem os responsáveis estatais, parece estar quase tudo sob controlo, não fossem a falta de pediatras para manter urgências abertas, as longas listas de espera para consultas e cirurgias, as convulsões dos serviços, tanto com os enfermeiros como com os médicos…
Tudo isto é tanto mais simbólico, quando no primeiro dia da nova AR, um partido trotskista – que julga ganhar, mas que afinal perdeu mais de cinquenta mil votos só nas últimas eleições – colocou uma iniciativa para legalizar a eutanásia. Esta gente é daquele tipo de carraça que só larga quando mata o animal de aluguer… Foi assim no aborto, insistiram no tema até terem um vislumbre de vitória sem glória – o resultado do referendo não atingiu os votos previamente programados para ser válido – e, agora, voltarão à carga até vencerem pela exaustão quem os pretenda enfrentar…
É público e notório que a campanha do aborto como meio de controlo da natalidade está a dar frutos: querem ter filhos nas escolas, mas mataram-nos legalmente pelo aborto…desde 2007 e estamos a colher os frutos; querem ter a sobrevivência da segurança social, mas enjaularam os critérios nas consultas de planeamento gizado nos critérios abortistas mais baratos e simplistas; reclamam de que o país está velho, mas mataram as fontes de vida pelo aborto e por outros interesses hedonistas à la carte…
 = Não deixa de ser patético que o governo queira rejuvenescer a população com artifícios de má conduta, isto é, lança as premissas para estar a favor da vida, mas continua a servir-se de dislates anti-vida, desde os mais primários até aos mais complexos. Quem seja a favor do cuidado dos mais desfavorecidos – como dependentes, sem mobilidade ou incapacitados de autonomia – não consegue vislumbrar algo que, na lei e nos impostos, os proteja e/ou os ajude. Há momentos em que o estado/governo se comporta como ditatorial, pois só os ‘seus’ modelos (materialistas, sincopados pela aparência ou aureolados de boa imagem) valem e quem não for da cor do partido (ou afins) está, à partida, relegado para fora das ajudas, comparticipações ou benesses.
Por analogia com a trama no ‘Triunfo dos porcos’ de George Orwell, na quinta todos os animais são iguais, mas há uns que são mais iguais do que outros! Apesar da distância no tempo (1945) e da filosofia subjacente (comunismo soviético), vemos como pululam tantos tiques dessa época naqueles que assumem, agora, o mando por cá. Creio que ser-lhes-ia muito útil ler e meditar sobre aquele tempo para que não se cometam neste tempo erros que deviam estar há muito ultrapassados…
Ao vermos a tomada de posse do XXII governo constitucional, o ‘triunfo dos porcos’ deixou um certo amargo de confusão entre o ‘napoleão’ da estória e os intervenientes desta memória…mesmo que negociando novos moinhos de vento em vez das centrais a carvão…dentro de quatro anos! A vida tem mais encanto quando se gasta tempo na reflexão daquilo que somos e não naquilo que queremos impingir…

António Sílvio Couto

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