No
programa do XXII governo constitucional faz-se larga referência à questão da
demografia, mais em vista de colheita económica do que com mentalidade pela
vida.
A
partir da página 100 e até à página 103, o dito programa dedica algumas
considerações e propostas.
Respigamos
da abertura dessa secção:
«Sendo a diminuição da natalidade e da fecundidade um traço comum dos países
desenvolvidos, Portugal encontra-se entre os casos em que os níveis de
fecundidade mais desceram ao longo das últimas décadas e onde têm sido, nos
últimos anos, extraordinariamente baixos. Os impactos desta tendência, a longo
prazo, pioram as perspetivas demográficas do país, mas, acima de tudo,
significam que as condições para as pessoas desenvolverem os seus projetos de
vida, designadamente para terem e criarem filhos em Portugal, sofrem bloqueios
significativos.
O objetivo das políticas públicas nesta matéria é, por isso, criar condições para que as famílias possam ter os filhos que desejam ter, permitindo-lhes desenvolver projetos de vida com maior qualidade, segurança e melhor conciliação entre trabalho, vida familiar e pessoal. Trata-se não apenas de uma política de melhoria das perspetivas demográficas do país mas de uma verdadeira política de família, visando a promoção do bem-estar numa sociedade mais consentânea com as aspirações e projetos das pessoas».
O objetivo das políticas públicas nesta matéria é, por isso, criar condições para que as famílias possam ter os filhos que desejam ter, permitindo-lhes desenvolver projetos de vida com maior qualidade, segurança e melhor conciliação entre trabalho, vida familiar e pessoal. Trata-se não apenas de uma política de melhoria das perspetivas demográficas do país mas de uma verdadeira política de família, visando a promoção do bem-estar numa sociedade mais consentânea com as aspirações e projetos das pessoas».
Posteriormente
apresentam-se aos itens: ‘facilitar a opção pelo segundo e terceiro filho’,
‘reforçar o acesso a serviços e equipamentos de apoio à família’, ‘melhorar o
regime de licenças como instrumento de promoção da parentalidade e de
conciliação entre trabalho e vida familiar’, ‘promover um melhor acesso à
procriação medicamente assistida e aos cuidados materno-infantis’.
Será
que a família tem o significado que todos entendem do mesmo modo? Os filhos
serão fruto ou resultado? A defesa da natalidade é objetiva ou sofre de
subjetividade capciosa interesseira? Porque nunca se aflora nada quanto à
participação da iniciativa privada nas questões familiares? Os filhos são
propriedade do Estado ou projeto de vida familiar? Porque há medo de assumir
que ‘as últimas décadas’ de diminuição da natalidade coincidem com a vigência
do aborto despenalizado?
= De
facto, em tudo isto não lemos nada que se refira ao erro histórico de ter feito
do aborto – eufemisticamente dito de ‘interrupção voluntária da gravidez’,
porque nem é voluntária nem interrompe, antes mata – uma das mais recorrentes
facetas de planeamento familiar e como recurso em ter sido usado este método
para dizimar milhões de vida, que, agora, fazem falta para que haja equilíbrio
geracional e até renovação social.
Os
números circulam na comunicação social: desde 2007 – data do segundo referendo
ao aborto em Portugal – e até 2016 houve cerca de cento e sessenta mil abortos
ditos ‘legais’, nalguns casos com repetições…
Quem
tenha já ouvido pessoas, que recorreram ao aborto, continuam com essa ferida
aberta na consciência e não será preciso invocar alguma razão religiosa, bastará
a dimensão humana, que é bem mais forte que toda e qualquer faceta religiosa
por muito ou pouco exigente que possa manifestar-se. Efetivamente é diante de
pessoas mais velhas – e não se pense que são só senhoras – que fico comovido e
estupefato pelas dores que manifestam…passadas décadas sobre os ‘desmanchos’.
= Não
deixa de ser irónico, para não lhe chamar minimamente hipócrita, que se venha
agora clamar por mais condições para a natalidade, quando se optou antes pelo
falhanço cultural de fazer do aborto um nível de reduzir a vida ao meramente material.
Criaram-se condições para que a opção pela vida pareça algo de menos digno do
que luta pela carreira profissional.
Enquanto
as forças que desencadearam o projeto do aborto despenalizado não reconhecerem,
além do erro, a má-fé de todo o processo, considero que iniciativas em favor da
natalidade não passam de patranhas de mau gosto e de duvidosa eficiência, pois
estaremos a laborar numa falsidade de valores e numa mentira ética sem rosto
nem responsáveis. O ‘inverno demográfico’ tornou-se, assim, um inferno
sociológico, onde uma boa parte se desculpa, não assume os seus erros e,
normalmente, foge de forma cobarde.
António Sílvio Couto
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