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sábado, 27 de janeiro de 2024

Quando deixei de ser surdo, caí

 

Estávamos no verão de 2010, tinha chegado há parcos dias à terra onde moro há quase catorze anos e decorria a apresentação das festas locais - dizem que era a primeira vez - e acontecia no reduzido ‘adro’ da igreja, tendo esta por horizonte.

Solicitaram-me que dissesse umas palavras. Não conhecia ninguém, não sabia o terreno que pisava e tão pouco estava preparado para fazer ‘discurso’.
Saiu-me, então, a breve ‘estória’ da corrida de sapos: numa aldeia simples do interior convocaram toda a população para assistir à corrida de sapos, que constava em colocar alguns desses batráquios no sopé da torre da igreja e deixá-los subir até ao topo. Como sempre a assistência começou a opinar e a dizer: não conseguem chegar lá acima, é muito alto, não conseguem... Um a um foram desistindo... por cansaço ou em razão das críticas e observações negativas da assistência. Mas eis que um sapo conseguiu ir trepando, afanosamente, e chegou ao alto da torre, ganhando a corrida... Por que teria ele conseguido tal proeza? Depois de o terem examinado descobriram que era surdo e não ouviu os comentários, seguindo, sempre e só, o seu caminho...

- Desculpando a declaração de interesses, desejo fazer a avaliação destes anos aqui vividos e qual a razão recente de ter mudado de opinião, isto é, de dar por terminado algum tempo - no conjunto mais de duas décadas e meia - de diáspora nas terras setubalenses e longe da família e das origens sociais, religiosas e culturais...

- Talvez tenha deixado de ser tão surdo como houve tempos em que consegui ser e, pelo contrário, ter aceitado certas vozes de desânimo, senão mesmo de desencorajamento. Confesso que, por vezes, se torna um tanto complicado não ver a mínima recetividade às propostas apresentadas. Mesmo por entre dúvidas e contrariedades torna-se algo confrangedor ver a indisponibilidade por parte de pessoas que deveriam corresponder a sugestões simples e insistentes. É impressionante esbarrar com a indiferença de tantas pessoas que bem podiam aproveitar as oportunidades propostas para saírem da sua contumaz ignorância.

- Olhando o futuro, será possível crescer depois de ter caído como tantos outros sapos que se deixam desanimar pelas vozes de derrotistas e derrotadas. Dizem que dos falhados não reza a História, mas esta está cheia de caídos que se levantaram ou se deixaram erguer com ajuda, mesmo que isso signifique mudar de trilho ou, enquanto é possível, mudar de rumo...sempre em vista do Bem maior que é Deus e servindo-O na sua Igreja.

- «Fiz-me tudo para todos (omnibus omnia factus sum), para salvar alguns a todo o custo» (1 Cor 9,22). Este tem sido o meu lema. Nem sempre tem atingido os objetivos desejados…



António Sílvio Couto

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