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quarta-feira, 15 de novembro de 2023

Identidade e questionamento

 

“Je suis ce que je suis

et si je suis ce que je suis
qu’est-ce que je suis?»
(Sou o que sou e se sou o que sou, o que é que eu sou?)
Esta frase - no original em francês e traduzida - pode conter algo suscetível de fazer-nos refletir sobre diversos aspetos da nossa vida pessoal, familiar e coletiva/social/eclesial. Efetivamente urge conhecer-se na verdadeira identidade, sem subterfúgios ou compensações, sem duplicidades ou mecanismos de substituição, antes enfretando-se a si mesmo e aceitando os outros como eles são, verdadeiramente.

1. É bem mais habitual do que se julga encontrarmos pessoas que se guiam pela aparência do social, desde os critérios de conduta, passando pela indumentária (carros, roupagens, festas e amigos) que usam ou até mesmo que pertença a algum grupo das redes (ditas) sociais... valem pelo que mostram e não pelo que são. Em certas ocasiões ostentam os títulos académicos (se os têm) mais como forma de impressionar os outros do que pela valorização que eles significam. Recordo o episódio de um senhor que ostentava um anel de formatura de um curso considerado de relevo social, mas cuja forma de falar, deturpando as palavras e a conjugação das frases, não condizia com tal graduação académica. Depois de alguns dias de convivência abordei-o, questionando qual era o curso simbolozado por aquele anel, ao que ele respondeu, comprei-o numa ourivesaria... e assim tentava impressionar os frequentadores do café famoso que geria...numa cidade de renome.

2. Com relativa facilidade podemos ainda encontrar pessoas que, de alguma forma, renegam as suas origens e as da sua família, tentando com isso dar a impressão de que se colocam numa fasquia social acima – na maior parte das vezes é fora – ofendendo os antecessores e podendo deseducar os sucessores. Infelizmente os exemplos são muitos e em quase todos como que nos percorre a sensação de que sob a máscara de certas figuras se encobre um quê de complexidade no equilíbrio emocional e psicológico de tantos em excesso.

3. A avaliar por alguns comportamentos de pessoas com quem convivemos habitualmente – de forma direta ou indireta – precisamos de ter uma chave de leitura bem mais apertada do que seria desejável, se tudo decorre-se em conformidade com critérios ‘normais’ entre todos. Vivemos num contexto social onde as pessoas se relacionam e criam redes de proximidade: umas vezes dão-se a conhecer, noutras tentam impressionar e, na maior parte das situações, procuram tirar proveito daqueles que consideram ‘amigos’ – no conceito mais vasto ou restrito – seja via redes sociais ou no contacto direto. É calamitoso que haja pessoas com milhares de ‘amigos’ no faceboock, mas solitários (sós, tristes e abandonados) na hora da verdade.

4. Cada vez mais e melhor precisamos de aprender a conjugar a multiplicidade de ‘imagens’ que temos de nós mesmos, que damos aos outros, que os outros têm de nós e que eles possivelmente nos querem apresentar.

Qual é a imagem que eu tenho de mim mesmo? Está alicerçada na verdade ou vivo na aparência do que quero que os outros vejam ou pensem de mim? Aceito-me como sou ou tento encobrir, pelo disfarce, aquilo que não gosto ou não aceito em mim mesmo? Qual o grau de autoestima que cultivo? Não será exagerado e pouco verdadeiro?
No trato com os outros aceito-os como eles são? Distorço as suas qualidades e/ou defeitos? Vejo neles o que não são? Critico-os ou adulo-os? As suas qualidades fazem-me sombra? Sou moderado nas apreciações que faço dos outros, sobretudo daqueles que penso conhecer melhor? Tento aproveitar-me dos ‘amigos’ que digo ter?

Numa palavra: amo e estimo os outros porque me amo – com qualidades e defeitos, virtudes e falhas/pecados – a mim mesmo?



António Sílvio Couto

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