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sábado, 12 de novembro de 2022

Efeitos de ‘guerra’ nas estradas



Segundo um relatório da autoridade nacional para a segurança rodoviária, até final de julho último ocorreram mais de 18 mil acidentes nas estradas portuguesas, deixando 253 mortos, 1398 feridos graves e 22021 feridos ligeiros. Estes dados comportam algo de preocupante para a segurança de quantos – e somos todos – andam nas estradas, com uma crescente circulação rodoviária, apesar das constantes subidas dos preços dos combustíveis...

1. Com melhores vias de comunicação (estradas, vias-rápidas e auto-estradas) e mais evoluídos veículos de locomoção corremos mesmo assim o risco de não ver diminuir estas dados algo aterradores, só comparáveis a resultados de guerras com armas ultra-sofisticadas. Com efeito, a natureza dos acidentes mais habituais são as colisões (53 %) e seguidos dos despistes (34%). Ainda segundo a entidade citada, os atropelamentos subiram (32%) de forma significativa. De referir também que a sinistralidade nas localidades aumentou quase oitenta por cento em relação a igual período do ano de 2021... A maioria das vítimas mortais (66 %) nos acidentes referidos são condutores...

2. Colocados diante deste diagnóstico assaz tenebroso como que temos de questionar a capacidade de evolução de tantos dos intervenientes em todo este processo de mobilidade e até de mobilização, pois há qualquer coisa que falta na cadeia de vivência cultural, social e humana. Não será que se verifica um desfasamento entre quem conduz – com habilitação creditada – e as condições de tempo e de espaço? Muitos dos ‘nossos’ condutores não passam de agentes do volante e não de sujeitos de presença responsável na estrada e não como meros atores de velocidade sem-rosto nem educação? Não poderemos ser surpreendidos – mesmo em caso de acidente – com atitudes, gestos e ações de certos condutores, que reportámos como pessoas com senso e cordiais, mas que se transformam quando estão com as mãos ao volante e os pés no acelerador?

3. Atendendo a estes dados mais oficiais podemos, de alguma forma, olhar as estradas como verdadeiros campos de batalha, onde escapar com vida como que reveste uma de duas consequências: sorte por não ser atingido por causas tão óbvias e empregar todo o esforço por sair ainda ileso de cada combate (viagem) mais longo ou mais breve… Potencialmente todos estamos sob a mira dessa ‘arma’ fatídica que é o carro em que andamos e de que outros se servem para se deslocarem, seja qual for a intenção, a necessidade ou a ocasião.

4. Numa interpretação adequada às coisas de cada tempo, a Conferência Episcopal portuguesa apresentou, em 2003, uma lista de ‘pecados novos’, numa linha de ‘responsabilidade solidária pelo bem comum’, assim intitulou essa nota pastoral. Na lista apresentada de ‘’novos pecados’ surge a seguinte formulação: «a irresponsabilidade na estrada, com as consequências dramáticas de morte e feridos, que são atentado à vida, à integridade física e psicológica, ao bem-estar dos cidadãos e à solidariedade».

Ao tempo essa formulação colheu de surpresa muitos dos cristãos mais ou menos praticantes e conscientes da necessidade de formarem a sua consciência de acordo com as exigências de cada época. Com efeito, temos de enquadrar a nossa vivência com os outros e em relação a Deus, tendo em conta as diversas matizes de vida e nas facetas mais diversas e conflituosas.

5. Excessos de velocidade, desconformidade dos veículos em circulação, desrespeito pelas regras do código da estrada, abusos e não-cumprimento como peões, estacionamento sem cuidado, uso ou abuso de meios eletrónicos na condução, falta de cuidado para com os outros condutores… e tantas outras situações – que cada um conhece e transgride – podem ser pequenos ajustes para fazer, de cada um de nós, um potencial assassino, nas coisas relacionadas com a estrada… e não é preciso que haja policiamento nem multas.

A ‘guerra’ está aí, saber vencê-la é tarefa de cada dia, sem nunca estar vencida, pois, à mínima distração podemos pagar as consequências em nós e para com os outros!



António Sílvio Couto

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