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segunda-feira, 10 de outubro de 2022

Chuçaram o vespeiro (versão atualizada da ‘caixa de pandora’)

 


Desde logo será útil explicar os termos usados, na medida em que cada uma das palavras contém significado conotativo. Assim: ‘chuçar’ significa o uso do chuço, isto é, um pau de ponta aguda em ferro; ‘vespeiro’ é um ninho de vespas, que são uns insetos idênticos às abelhas, mas que não produzem (quanto é percetível) nada de benéfico, antes prejudicam várias vertentes ligadas à apicultura.

A articulação entre ‘chuçar o vespeiro’ quer envolver a ação (consciente ou não) de mexer em algo – social, política ou religiosamente – que vai infetar e/ou afetar as relações que antes eram (ou pareciam) serenas, hamoniosas e concordes para se tornarem agressivas, multi-perigosas e potencialmente destabilizadoras...

Numa palavra: ‘chuçar no vespeiro’ é algo de que não sabemos as consequências, mesmo que pensássemos que conhecíamos as causas.

 1. Nos tempos mais recentes temos assistidos a múltiplos momentos em que mexeram com o vespeiro e as vespas sairam desalvoradas, atacando tudo e todos, pois foram atingidas na sua rotina e, sobretudo, incomodadas no seu casulo de refúgio. Aquilo que parecia contido num veneno de arrolhamento, agora foi solto e fará estragos imprevisíveis. Com efeito, certas questões ocultadas ou esquecidas nos idos da memória sairam da sombra e os estragos – sociais, pessoais ou institucionais – serão de longa duração. Se bem que haja confusão de protagonismos, as vespas sairam para aferrolhar os incautos ou mesmo castigar os prevaricadores. Por enquanto as vespas ainda não assentaram, mas quando o fizerem torturarão quem as incomodou, de forma propositada ou por mera inépcia em conter os estragos mais imediatos.

 2. Noutras culturas e com diferentes mentalidades dir-se-á que foi aberta a ‘caixa de pandora’. Explicando o mito. Pandora foi a primeira mulher criada por Hefesto e Atena com o auxílio de todos os outros deuses, por ordem de Zeus. Cada um deles atribuiu-lhe um dom, recebendo a beleza, a graça, a destreza manual, a capacidade de persuadir e outras qualidades. Mas Hermes colocou no seu coração a mentira e a astúcia. Hefesto fê-la à imagem das deusas imortais, e Zeus destinou-a à punição da raça humana, à qual Prometeu tinha acabado de dar o fogo divino. Enviada à terra para se casar com Epimeteu, irmão de Prometeu, levava consigo uma caixa com a recomendação de que jamais fosse aberta.Ora ela, sem conter a curiosidade, abre-a e com isso libertou de seu interior todos os males até então desconhecidos pelos homens (doenças, guerra, mentira, ódio, etc.). Pandora tenta fechar a caixa, mantendo no seu interior apenas a esperança...mas não conseguiu mais!

3. Perante estes dois quadros de leitura da nossa realidade social, humana e cultural estamos colocados entre o vespeiro e a caixa de Pandora. Qual dos dois tipifica melhor o nosso enquadramento? Se a caixa dos males os fez espalhar pela face da Terra, as dispersadas do vespeiro atacam de forma incisiva e acutilante, sobretudo os que lhes estão mais próximos. Sobre os males desencadeados da ‘caixa de pandora’ fomos aprendendo a domesticá-los de uma forma mais ou menos civilizada, mas quanto aos efeitos de terem chuçado no vespeiro ainda não aprendemos corretamente a lidar com os casos – e são tantos – mais ou menos populares e veiculados pela comunicação social... ao serviço de intentos nem sempre claros nem explicitados.

 4. Costuma-se diz: a curiosidade matou o gato. Dá a impressão que o deslumbramento de certas figuras perante determinados casos de maior envolvência mediática – diga-se pelas piores razões – não fez bem a algumas pessoas, pois, em vez de serem recatadas no tratamento dos assuntos fazem deles tempos de antena que seriam bem escusados, se houvessse tento e discernimento. Já basta o mal feito, quanto mais termos de aturar a toda a hora e momento sempre as mesmas coisas, com os mesmos protagonistas e pelas mais nefastas razões. É tempo de deixar curar as feridas e não de estarmos sempre a escarafunchar nas mazelas.... 

 

António Silvio Couto

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