Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



terça-feira, 18 de janeiro de 2022

Alegria de viver

 



Quando vemos as disputas eleitorais em curso não poderemos ter a impressão de que aquelas pessoas não têm alegria de viver? Em certas palavras não parece que estamos mais perante pessoas ressabiadas, mal-resolvidas e até sob uma tristeza quase-mortífera? Não haverá, antes, mais azedume e mal-estar facilmente percetível nas palavras, nos gestos e até nos trejeitos faciais? Quando nos vemos ao espelho não nos aperceberemos que somos, de verdade, pessoas que têm alegria de viver? Pelos confrontos das ideias não será, desde logo, captado que os horizontes das reivindicações (minimalistas ou outras) não serão bastante egoístas e interesseiros?

Estas questões vieram-me à inquietação ao ouvir o cardeal Tagle - eclesiástico filipino e responsável pelas questões da Santa Sé sobre a evangelização - que intervinha, desde as Filipinas, via zoom, nas jornadas de formação das quatro dioceses do sul de Portugal a decorrerem por estes dias.
Por diversas vezes se emocionou o senhor cardeal ao dar-nos exemplos simples da sua vida pastoral e dos seus contactos em várias partes do mundo, deixando transparecer a alegria de viver, fundamentada em Jesus e vivida na Igreja.
Das duas intervenções destaco três aspetos: anúncio do Evangelho, tocar as feridas do mundo e a alegria missionária.
Embora as notas recolhidas nas comunicações do cardeal Tagle me sejam muito úteis, desde a visão deste homem de Igreja e colhendo lições do ministério do Papa Francisco, colhi algumas vertentes de reflexão que aqui coloco: serenidade e convicção; presença e humildade (sem medo de tocar as feridas), peregrinação com os outros, mudança em continuidade.

* Serenidade e convicção - para além do ambiente envinagrado de tantos dos nossos vendedores de questões políticas, poderíamos inserir a proliferação das palavras carregadas de agressividade, que incendeiam as relações entre as pessoas. Quantas vezes vemos pessoas que interveem na vida política e se tornam semeadores de conflitualidades, em vez de serem pontes de boa vontade entre pessoas, grupos e associações. Talvez tenhamos de atender aos incendiários na política e nas suas propostas de solução para o futuro próximo. Diz o povo: ‘quem semeia ventos colhe tempestades’. Esperamos que os extremismos de tantos dos políticos da nossa arena competitiva, recolham a curto prazo os resultados com o sabor a convir...

* Presença e humildade - muito para além da denúncia - nem sempre tão profética como seria desejável - urge estar próximo das dores e de cuidar das feridas dos outros. Quando vemos em continuação reclamar do endeusamento do auto-proclamado ‘serviço nacional de saúde’, dá a impressão que boa parte desses mentores nunca estiveram ao pé de quem sofria, de nunca terem sofrido com quem padecia ou de sentirem compaixão com as pessoas feridas. Parece que estamos perante pessoas onde o teor materialista como pretende subjugar a dimensão espiritual das pessoas. Só quem não passou, minimamente, pela experiência do ‘covid-19’ - de infeção, de confinamento ou do luto - poderá fazer zaping mental, quando se vê confrontado com as feridas dos outros...

* Peregrinação em mudança - aprender a caminhar, ao longo de toda a vida, nas suas várias etapas, faz-nos ser humildes em sinodalidade, onde caminhamos com os outros, aprendendo com eles, sem lhes pretendermos ensinar nada, que não seja esse estar lado-a-lado, coração-a-coração em continuidade. Precisamos de ser cada vez mais simples e de não perdermos todas as possibilidades de anunciar com alegria a presença de Jesus.
Foi isso que vi nas palavras e na presença simples, afetuosa e convicta do cardeal Tagle. Como dizia o senhor cardeal assistente da ‘Caritas’ internacional, a Igreja pede-nos tudo e oferecer-nos tudo, sendo evangelizadores que se abrem sem medo a Deus e aos outros.



António Sílvio Couto

Sem comentários:

Enviar um comentário