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segunda-feira, 31 de janeiro de 2022

Acabou a paz social?

 


Numa análise simples, correta e contundente um jornalista – desses que ainda sabe o que é o lead da notícia, que diz aquilo que pensa e avalia as análises, sem querer agradar ao patrão ou ao canal onde intervém – referia, ainda antes das eleições, que, depois destas, poderemos perceber: que acabou a ‘paz social’ em que vivemos nos últimos seis anos…talvez à força e sem grande suporte verossímil.

Quais eram (são) os indícios de que a ‘paz social’ – com a ausência de protestos, uma forte diminuição de greves, um aligeirar de conflitualidade nas ruas e nos trabalhos, um certa ‘harmonia’ entre os vários quadros intervenientes sociais, sindicais ou económicos – estaria ameaçada e que os itens apontados poderão emergir contra essa paz? Será que a ausência de conflitos abertos significava que havia paz? Não teremos vivido antes numa paz podre, com focos latentes de irascibilidade, de azedume ou de sobreposição entre ‘classes’, setores e animosidades?

Fazendo a leitura dos números da votação – maioria – poderemos encontrar algumas das respostas para o fim da tal ‘paz social’, feita de equilíbrio de tendências, de conquista de direitos ou mesmo à luz do pagamento de favores aos beligerantes, nas diversas instâncias de poder, de participação ou de manipulação.

 1. Muitos se arrepiam com os votos conquistados pelo ‘Chega’…Uns tais democratas da verborreia quase contestam quem nele votou, como se houvesse votos bons e votos indecorosos…aqueles são dos meus apaniguados, estes são dos que não pensam como eu; aqueles são de uma certa esquerda – trauliteira, aguerrida e ilustrada – numa certa visão, estes são dos ignorantes que se exprimem de forma diferente e com as mesmas obrigações e regalias…Deste modo a ‘paz social’ que vai acabar será salutar que deixe de estar encoberta e submissa aos interesses de um ‘tal povo’, com reduzida expressão… e com uns tais ‘trabalhadores’ que não passam de mitos ao serviço da dialética marxista ainda em vigor!

Nada me simpatizo com o ‘Chega’, dizendo, desde já, que votei sempre da mesma forma em quarenta anos!

 2. Como se pode dar tudo a todos, se o bolo minguou e são mais os pretendentes do que o que há para distribuir? De facto, só quando se produz, se poderá manifestar alguma abundância. Com efeito as empresas poderão pagar ordenados, se não têm meios nem condições? O fim da ‘paz social’ conquistará as ruas, se quiserem esticar os vencimentos sem meios que sustentem a sua exequibilidade. Numa mínima compreensão dos factos, teremos de considerar que só podemos distribuir riqueza se ela for produzida, amealhada e conquistada. Tudo o resto soará a demagogia, a propaganda – esta não acontece só por ocasião das eleições, é muito mais tentacular – e, sobretudo, a manipulação de quem dirige ou governa. Por isso, a ‘paz social’ é algo mais profundo do que ter dinheiro na mão para consumo: é preciso saber de onde este veio e se continuará a ser servido com verdade e justiça.

 3. Eis os resultados: PS – 41,6 % (117 deputados); PSD – 27,8 % (71 deputados); Chega – 7,1 % (12 deputados); IL – 4,9 % (8 deputados); BE – 4,4 % (5 deputados); CDU – 4,3 % (6 deputados); Livre – 1,5 % (1 deputado); PAN – 1,2 % (1 deputado)… Abstenção: 42,04 %. Que governo com esta maioria? Que estabilidade? Andamos a perder tempo e feitio! Brincar, não compensa!

 4. Houve assuntos esquecidos e/ou evitados, antes das eleições, que terão de ser tomados a sério. Em tempo já de seca, não se falou de água e esta – como sempre – é tema que envolve consciencialização tanto no uso como na racionalidade pessoal e coletiva. Não basta considerar que isso é questão rural, pois os (ditos) citadinos precisarão dela diariamente. Se não chover em breve, algo poderá caminhar para o dramático…

Quem falou da eutanásia? Mais uma vez os partidos se acobardaram sobre a temática e quererão fazer aprovar aquilo que nem sabemos o que pensam ou como resolverão o assunto de forma séria e civilizada. Matar não resolve nada, nunca!

A regionalização foi abordada? Só se foi em questiúnculas baratas. Mais cedo do que tarde pretenderão impô-la, mas como recurso de emprego a ‘políticos’ de categoria secundária. Haja seriedade e bom senso!

    

António Sílvio Couto

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