Quem
está na vida prática das coisas em Igreja católica, por vezes, tem de se revestir
de uma arte suficiente para conciliar algum do tradicionalismo/ritualismo das
paróquias em contrapoder com alguma outra (pretensa) desinstalação/provocação
da maior parte dos movimentos eclesiais.
Numa
espécie de declaração de ‘interesses’ fique claro que sou favorável e
fomentador da presença dos movimentos – anteriormente ditos apostólicos, mas
que devem ser, isso sim, todos católicos – no tecido das paróquias, respeitando
a autonomia destas e construindo na vida a chama que fez surgir cada movimento.
Desde há mais de quatro décadas que procuro fazer caminhada num determinado
movimento eclesial e, tanto quanto tenho procurado, isso não me tem afunilado
nele, antes tenho procurado ver e ajudar todos os outros a serem o que devem…
= «A paróquia
é uma certa comunidade de fiéis, constituída estavelmente na Igreja particular,
cuja cura pastoral, sob a autoridade do Bispo diocesano, está confiada ao
pároco, como a seu pastor próprio» - Código do Direito Canónico, cânone 515 §
1.º. Atendendo a esta definição-descritiva podemos e devemos considerar que
tudo quanto aconteça no espaço da paróquia deve ser enquadrado na visão mais
ampla de Igreja e no cuidado mais simples daquele que tem a cura pastoral. Por
seu turno, no mesmo Código de Direito Canónico se faz a discrição de ‘associação
de fiéis’: «na Igreja existem associações, distintas dos institutos de vida
consagrada e das sociedades de vida apostólica, nas quais os fiéis quer
clérigos quer leigos, quer em conjunto clérigos e leigos, em comum se esforçam
por fomentar uma vida mais perfeita, por promover o culto público ou a doutrina
cristã, ou outras obras de apostolado, a saber, o trabalho da evangelização, o
exercício de obras de piedade ou de caridade, e por informar a ordem temporal
com o espírito cristão» (cânone 298, § 1.º).
Diante
destas duas citações da lei de referência na Igreja católica podemos e devemos
colocar algumas questões sobre a tal articulação serena, sincera e sensata
entre a territorialidade da paróquia e a (possível) transversalidade da
associação de fiéis, seja ou não movimento. Mesmo que numa imagem tosca não poderemos
resumir uma paróquia numa espécie de mesa com várias gavetas sem ligação entre
si…
Já foi
– felizmente – ultrapassado o tempo em que os leigos tinham de pedir
autorização à hierarquia para se reunirem e/ou associarem. Embora para serem
eretas as associações precisem de ser reconhecidas pela competente autoridade
eclesiástica (CIC cân. 301), aquelas devem respeitar os estatutos devidamente
aprovados para o seu reconhecimento.
A
título informativo valerá a pena citar, que, no Anuário católico em Portugal,
estão registadas oitenta e oito ‘associações, instituições, movimentos e
obras’…com expressão de âmbito nacional e, na sua maioria, com implantação em
todas as dioceses do país…numas mais do que noutras, mas significativamente abrangentes
da realidade social, eclesial… e cultural.
=
Atendendo à dinâmica de cada movimento e/ou associação de fiéis poderá ser
questionável como se relacionam estes com as paróquias, dado que, na maior
parte dos casos, nestas se poderá verificar mais uma espécie de trabalho
pastoral de manutenção e não numa necessária dinamização evangelizadora e/ou
missionária. Em muitos casos – desgraçadamente – aqueles/as que participam nos
movimentos/associações de fiéis não se sentem tão atraídos ou mesmo acolhidos
nas paróquias… como acontece no ‘aconchego’ ou sintonia do seu grupo mais
particular. Não será que, muitas vezes, as pessoas se desconhecem ou mesmo se
ignoram na fé, que dizem professar ou celebrar? Será que os paroquianos, quando
não reagem devidamente às propostas dos responsáveis – tanto do cuidado
pastoral, como dos movimentos/associações de fiéis – com isso podem desmotivar
quem tenta incentivar à participação? Certas acomodações não revelam mais falta
de conversão do que menos boa aceitação?
Numa
palavra: paróquias e movimentos/associações de fiéis são como que as duas mãos
de um grande louvor divino, onde quem teve (ou tem) a graça de se deixar
dinamizar precisa de colocar essa força ao serviço de tanta massa amorfa que
povoa as nossas paróquias. Estas não podem ser o reduto de uns tantos que se
cristalizaram numa fé ritualista ou um tanto tradicionalista. Renovação de
todos, precisa-se, já!
António Sílvio Couto
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