Pasme-se:
quem mais defende a despenalização da eutanásia são os que perfilam,
preferencialmente, ideias de teor coletivista, isto é, os promotores da
eutanásia consideram que a escolha individual se sobrepõe à dimensão
comunitária da pessoa.
Efetivamente
o que está a ser proclamado pela despenalização da ‘morte medicamente
assistida’ é um direito de âmbito individual usando os meios técnicos, humanos e
recursos daqueles que clamam a absorção (impostos, taxas e cobranças) pelo Estado
das economias das pessoas.
Aos que
contestam a iniciativa privada e tudo quanto ela significa, reclamam agora que
os meios estatais (e não só) possam servir o individualismo elevado à sua maior
potência.
Situações
há em que aos valores estatais para prosseguir os intentos da eutanásia são
associados os de caráter particular, fazendo com que os ‘perigosos’ privados
tenham de participar na feitura dos atos médicos em favor da eutanásia. Isto é,
para cuidar da saúde são considerados abjetos, mas para concretizar a matança
já podem constar da solução…
= Com a
evolução tremenda da medicina não seria expetável que houvesse melhores
condições para cuidar da vida, sobretudo em situação de sofrimento e de dor?
Não faltará, em muitas das discussões (vistas e ouvidas) sobre a eutanásia, uma
noção mais apropriada da dor e do sofrimento nos nossos dias? Não andaremos
ainda a discutir estes assuntos enfermando de preconceitos, de estereótipos e
de razões pensadas, ditas e decididas em circuito fechado…de alguma bolha
pseudocientífica? Por que haverá tanta arrogância por parte de alguns setores
mais exaltados – tanto pró como contra a eutanásia – em vez de vermos humildade
na escuta das razões alheias? A experiência pessoal da fragilidade, na doença,
não nos fará (faria) mais humanos e sinceros, sem peias de pedantismo e/ou de
falsa intelectualidade? Não será que querem esconder, sob a capa de
‘medicamente assistida’, a intenção de liquidar quem possa ocupar espaços
considerados necessários no (dito) serviço nacional de saúde?
= Com
toda a frontalidade é preciso proclamar: a vida não se referenda nem pode andar
ao sabor dos humores – muitas vezes mais negros (no sentido de fúnebres) do que
coloridos – da maioria dos políticos ou dos devotos. A dignidade da pessoa
humana não pode estar sujeita às conjunturas circunstanciais de certas forças,
que não a cuidam devidamente durante a vida e querem reclamar essa dignificação
na hora de matar. Com que facilidade vemos surgirem do esgoto – noticioso,
social, político e mesmo cultural – certas figuras secundárias, que, como no caso
do aborto, vieram trazer à liça os argumentos materialistas mais primários e
onde a dimensão psicológico-espiritual não tem grande conceito de reflexão nem
de aceitação vivencial.
Não
deixa de ser sintomático que a maioria dos órgãos de comunicação social –
televisiva, radiofónica, impressa e até no âmbito da internet – ouça com mais
regularidade – e talvez com maior apreço – quem defende a eutanásia como
recurso de serviço de saúde e, de forma muito menos clara e habitual, quem
apresente argumentos contra a onda da eutanásia...
Os
dados apresentados em favor da ‘morte medicamente assistida’ surgem como uma
tendência mais ou menos aceitável, embora não sejam ditos os números nem as
categorias em que se enquadram. Os promotores da facilitação da eutanásia vão
conquistando um certo ascendente não confirmado, mas aduzido pelos dados
induzidos. Como tantas outras iniciativas não-claras, também esta sofre do
perigo da manipulação duns entendidos sem rosto nem credibilidade.
= É
notório que hoje se discute tudo e o resto mais na base dos direitos
individuais do que das relações e dos deveres interpessoais, onde cada um se
considera (quase) o centro do mundo ou do ‘seu’ mundinho egoísta, egolátrico e
fechado. Com que facilidade vemos tanta gente a reclamar para si aquilo para o
qual não contribuiu minimamente. Nesta temática da eutanásia precisamos de não
nos deixarmos resvalar para alguma emotividade, mas o assunto deve continuar na
área da racionalidade, procurando cada um refletir sobre o sentido da sua vida,
ontem, hoje e no futuro. Assim sejamos dignos daquilo que o porvir nos reserva!
António Sílvio Couto
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