Lamento
que tenham vindo a ganhar algum significado as movimentações em ordem a
solicitar, ao parlamento, um referendo sobre a eutanásia. É preciso que sejamos
ponderados e argutos naquilo em que nos – os que são contra a eutanásia – queremos
meter.
Desde
logo é preciso afirmar sem rodeios nem meias palavras: a vida não se referenda…nunca.
Mesmo
que já tenham sido realizados dois referendos sobre a matéria do aborto…nenhum
deles deu resultados representativos, à luz das regras previamente
estabelecidas, em que só seria vinculativo o resultado se votassem mais de
metade dos eleitores inscritos.
Tenha-se
ainda na devida conta, que, quando se põe em marcha um processo, se devem
ponderar quais serão as consequências daquilo em que nos envolvemos. Ora, os
responsáveis sobre o hipotético referendo a propósito da eutanásia precisam de
saber ler os sinais ‘favoráveis’ – fora e dentro do quadro da fé cristã – para
com uma tal mentalidade pró-eutanásia. Os mentores da iniciativa a partir dos
gabinetes têm de ouvir as ideias da rua. Os proponentes do (pretenso) referendo
necessitam de vir para os espaços de opinião – internet, redes sociais,
conversas e atitudes de vida – e de lerem o que se diz e não o que gostaríamos,
cristãmente, que fosse dito. Não podem ser defraudados os subscritores do
(hipotético) referendo, se a onda pró-morte está a ganhar mais espaço do que a
sensibilidade à vida…na sua totalidade.
Tentemos,
ainda que de forma abstrata, considerar a possibilidade de referendar a vida –
entre a conceção e a morte natural – e de vermos diversos fatores
não-aceitáveis dessa hipótese. Não basta aduzir o ‘endeusado’ tal tema da
qualidade de vida para fazer da opção pela morte assistida uma imprescindível
referência ideológica, pois muitas vezes quem, aparentemente, pode não
manifestar essa tal qualidade de vida, à luz dos conceitos mais utilitários,
talvez não seja compatível com a dedicação de outras pessoas que possam estar a
precisar de mais atenção e de sincero cuidado.
Há, no
entanto, na minha perspetiva, uma solene reserva para com o referendo sobre a
eutanásia: uma grande maioria das pessoas – mesmo dos ditos praticantes mínimos
– não subscreve a inquestionável defesa da vida humana, pois pela linguagem e,
sobretudo, pelo comportamento há um ambiente bastante favorável para com a
tendência eutanásica e uma derrota, em referendo, sobre a matéria tornaria o
assunto enterrado – como aconteceu no aborto – enquanto a maioria
sociológico/política para com a eutanásia, no parlamento, pode modificar-se,
fazendo, assim reverter a matéria, quando as condições forem mais favoráveis…à
vida.
= Uma
questão tenho e que me aflige: como foi possível passar com razoável facilidade
a termos uma sensação de que há, no nosso país, uma maioria sociológica mais
propensa para com a eutanásia? Que falhou por parte de quem tem a missão de
proclamar a vida como valor? Não teremos andado mais a falar de coisas
secundárias, deixando o essencial para espaço e oportunidade laterais? Não
teremos andado mais a atender ao social – preocupados em dar o pão, mas não a
educação – do que ao ético/moral? Dá a impressão que se quis moralizar, mas não
formar as pessoas na sua consciência e na assunção das responsabilidades
inerentes à vida…em todas as suas etapas de vivência.
Como
dizia um prelado: a eutanásia não acaba com o sofrimento, acaba com uma vida! Ora,
uma boa parte dos defensores da eutanásia fazem-no por pseudo-defesa dos
direitos dos doentes, pois querem impor aos outros a sua forma de ver e de
viver, mesmo que se esforcem por não sofrer. Atendendo à evolução dos meios
técnicos e humanos postos ao serviço da saúde, seria aceitável que se quisesse
facultar as melhores condições de médicas e assistenciais, mas não, uns tantos
acham que esses meios devem ser usados para tirar a vida, mesmo que usando
termos e expressões eufemísticas para dizer matar de forma irreversível.
Pior
ainda é a tentativa de considerar o tema da eutanásia como se fosse um assunto
religioso e não antes um assunto cultural e civilizacional. Estão, de facto, em
confronto visões, entendimentos e comportamentos nos quais perpassam questões
de âmbito ideológico, de antropologia e mesmo de postura onde Deus conta ou
não. Será, por isso, essencial cada um de nós questionar-se sobre quem é e
aquilo que anda por cá a fazer, respeitando os outros, sem lhes impor uma
decisão não-desejada nem necessária.
Fique
claro: embora seja contra o referendo, se este acontecer, direi: não à
eutanásia…sempre!
António
Sílvio Couto
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