O
imponentemente despudorado desfile militar feito para assinalar o armistício da
primeira guerra mundial não deixa de ser um espetáculo digno do terceiro-mundo:
Portugal sofre entre 1914 e 1918 a mais ignóbil humilhação das suas forças
militares e, passados cem anos, fazem disso um desfile/manifestação com mais de
quatro milhares de elementos das forças vestidas com farda e veículos alindados
em maré de fim de validade… A ver pelo aspeto poucos estariam capazes de
disparar a mais inútil munição, se fosse necessário!
Eis o
que somos na Europa e no mundo: algo de risível com cara séria – pudera a
derrota ainda não foi digerida – e com um tal ar circunspeto de figurantes na
encenação…Mas não é isso que somos na pretensa Europa comunitária, em união ou
em reunião!
Nem
mesmo o recurso ao ‘herói milhões’ consegue atenuar a vergonha que devia
percorrer o todo nacional, sendo, claramente, escusados alguns dos
internacionalistas que se perfilavam na tribuna.
Mais de
cem mil portugueses foram literalmente ‘carne para canhão’ nas trincheiras
francesas nesse longínquo século decorrido. Por isso, recorrer a esses tempos
de antanho para fundamentar uma certa luta contra fantasmas que povoam as
mentes dalguns políticos é, acima de tudo, erro histórico à mistura com clichés
dialético/marxistas a gosto e com subtil à vontade de quem deseja ser popular e
se está a tornar mais um dos veículos de populismo barato e sem necessidade de
fazer grande coisa para ser reeleito quando for a votos…
= Não
deixa de ser sintomático, para a aferição dos critérios europeístas, que muitos
dos usufruidores das benesses da UE sejam antigos recauchutados das trincheiras
da ‘guerra fria’, saídos das lides de contestação aos ditos valores
capitalistas e que agora, envernizados na maquilhagem de Bruxelas ou de
Estrasburgo querem vender-nos uma tal propaganda de cordel que nem os bufos do
‘estado novo’ tentavam impingir sob a batuta da censura ou essoutra moralidade
bafienta que faziam crer no melhor dos mundos. De facto, há forças que ainda
não fizeram o reset dos seus erros nem reconheceram que foram causadores de
milhões de mortos por vingança ou por delito de opinião. Alguns deles –
sobretudo no nosso contexto de brandos costumes – ainda se passeiam nos
corredores do parlamento e até influenciam as decisões governamentais da
geringonça… Querem que os fascistas se retratem – e muito bem – mas eles nunca assumiram
nem reconheceram que foram causadores de malefícios a uma boa porção da Europa,
que diziam dominar pelo medo, a coação e a repressão: milhões foram deportados
para a Sibéria, exilados e retirados dos seus países, sem nunca fazerem a mais
pequena amostra de que têm culpas provadas e as mãos sujas com sangue inocente
ou ao menos sem culpa formada…
= Haja
moralidade para que queiram associar-se à vitória nalguma das duas guerras
‘mundiais’ do século XX. Não tentem limpar com o esquecimento as manchas dos
crimes dos seus antepassados. Não venham com subtilezas quase infantis para
surgirem como defensores da liberdade, quando foram os seus maiores detratores
e usurpadores. De que adianta andarem de crachás de mérito ostensivos se não passam
de ditadores encobertos ou mesmo enraivecidos.
Valerá a
pena não esquecer a conexão entre a mensagem de Fátima e o regresso dos
soldados da guerra, tal como prometeu a Senhora aos pastorinhos. Ela prometeu e
cumpriu, mas os jacobinos, que atiraram os ‘nossos soldados’ sem preparação
para a atoleiro das batalhas em França, nunca se assumiram na real consequência
daquilo que os fez serem lacaios das forças que serviam e os condecoravam sem
nada terem feito para isso. Urge, por isso, que seja feita justiça histórica a
quem foi usado para dar cumprimento a tarefas de interesses transnacionais sem
rosto nem identidade…
Numa
palavra: o desfile militar comemorativo do armistício dá a impressão que tenta esconder
mais do que mostra. Aquelas panóplia de forças mais parecia uma manifestação da
praça vermelha, de Pequim ou de Pyongyang do que um espetáculo da era da
internet. Merecemos melhores atores e material mais atualizado! Até na derrota
tem de haver dignidade, ontem como hoje!
António Sílvio Couto
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