Segundo
dados publicitados recentemente há 901 crianças que foram, até ao final do
terceiro trimestre deste ano, registadas sem lhes ter sido dado o nome do pai…
Só há cerca de vinte anos (1998) é que se tinha registado um número semelhante,
atendendo à situação de não ser dado à criança o nome do progenitor masculino.
Qual a
razão deste fenómeno? Num tempo dito de abertura e de maior liberdade, que há
de mais significativo para que seja escondido o nome do ‘pai da criança’? Isto
será um avanço ou um recuo na forma de entender os filhos e de quem os
‘produz’? Será por falta de informação ou por excesso da mesma que tal se
verifica nos nossos dias? Numa época eivada de sinais de maior e progressiva
emancipação da mulher este fenómeno será algo mais do que mera coincidência?
Tem
cerca de trinta anos uma reivindicação que ouvi a certas jovens que diziam:
filhos sim, marido não! Nesse tempo tais ousadias redundavam em situações de
grave abandono das mulheres (muito jovens na sua maioria) por parte dos ditos
pais das crianças, tornando-se mães solteiras com todos os riscos inerentes à
condição e aos condicionalismos sociais e familiares. Em muitos desses casos
notava-se alguma falta de maturidade e/ou de necessidade de chamar a atenção
para as suas lacunas afetivas e emocionais. Será que hoje as razões serão muito
diferentes? Não será que muitos dos casos continuam a ser uma reprodução de
novos casos de filhas sem carinho dos pais e das mães? Poder-se-á dizer que as
coisas mudaram um pouco, mas as pessoas e os seus problemas não tanto assim…
Confesso
que vem desse tempo a sensibilidade para o desafio da ‘bênção das grávidas’,
pois se, ao nível humano, muito havia (e há) a fazer pela consciencialização do
dom da maternidade, muito mais é preciso realizar na dimensão da confiança em
Deus e nas suas formas de se tornar presente na vida das pessoas, tenham elas
ou não ambiente familiar enquadrado, equilibrado e normal…
Quantas
situações de aborto poderiam (ou poderão) ser evitadas se houver quem escute,
mais do que conteste ou reclame da vida. Quantas vivências de coragem vi – e
acontecem ainda hoje – se dermos condições de afirmação da vida sobre a morte.
Quantas palavras de moralismo poderiam ser evitadas se, no devido tempo, fossem
dados os ensinamentos quanto à vida e à responsabilidade em fazê-la
manifestar-se com dever consciente, ontem como hoje.
=
Nota-se, na sociedade do nosso tempo, uma desregulamentação acelerada do
erotismo e da não-assunção de responsabilidades de quem se pretende livre, mas
o que vive é em libertinagem. A forma despudorada como se tratam certas
questões de âmbito sexual revelam a nítida falta de respeito da pessoa por si
mesma. Dá a impressão que, podendo falar de tudo, se deixou escapar ao filtro
da consciência aquilo que é de índole mais pessoal e íntima à mistura com a
vulgarização dos seus erros e a fanfarronice dos seus vícios. E – pior do que
tudo – a confusão está, sobretudo, no comportamento dos mais velhos, pois
parece que vivem numa espécie de nova adolescência das emoções ao sabor do
destampar dos seus mais profundos erros e recalcamentos… Aquilo que se pensava
ter sido ultrapassado pela maior informação e conhecimentos das coias, tem
vindo a verificar-se que nem sempre há conexão entre o saber e o viver,
fazendo, antes, com que este pareça mais um arremedo de ignorância àquilo que
se pensava ser conquista de humanização…
Quem
consultar registos de meados do século vinte – décadas de 40 e 50 – poderá ser
confrontado com muitas crianças batizadas sem nome da mãe, isto é, filhos de
mãe incógnita. Ora isso revela – pois o conferi em duas povoações mais antigas
entre o Tejo e o Sado – que algo havia no tecido social da época que levava as
mães a não darem o nome aos filhos, pois isso poderia trazer riscos para a sua
reputação social, familiar e religiosa. Anos mais tarde tornou-se mais vulgar
acontecer isso com o lado masculino, aparecendo mais os pais incógnitos, mas,
como se dizia em certas terras, bem conhecidos…
Chegados
ao final do primeiro quinto do século vinte e um vemos que não evoluímos tanto
quanto julgávamos, antes pelo contrário: estamos na estaca quase zero, ao sabor
duma amoralidade, que é muito mais grave e preocupante do que a imoralidade,
pois naquela parece que tudo vale e quase não há diferenciação entre o correto
e o incorreto… É tempo de refletir sobre o assunto, urgentemente!
António Sílvio Couto
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