Reproduzimos
uma conversa ouvida à mesa de café:
- Dá a impressão que estamos
perante um povo algo melindrado e um tanto melindroso, que precisa que lhe
agradeçam, quando aquilo que se fez não foi mais do que a obrigação ou o cumprimento
do dever!
- Sim, uma obrigação
profissional, moral e cívica…que deveria honrar quem assim procede…e não estar
sempre à espera de reconhecimentos e de palavrinhas de agradecimento!
Este
breve diálogo pode-nos ajudar a refletir sobre vários aspetos duma certa
psicologia que vemos desenvolver mais do que seria desejável e quem não se
comporta segundo aquelas pretensões parece que não saber estar ou é visto como
ingrato ou mesmo sem educação.
* Antes
de mais as duas palavras: ‘melindrado’ e ‘melindroso’.
Sabemos
que os melindres podem revelar algo mais do que boa saúde emocional, pois
revela uma tendência para se ofender ou para se constranger, numa certa
suscetibilidade. Há pessoas que se magoam duma forma tão rápida que amuam e se
fecham na sua concha de ofensa, não permitindo que se possa beliscar a sua
importância e os seus pontos de honra – como diziam alguns santos, os
pundonores – sabe-se lá com que razões e quais os motivos…Quem não terá ouvido
já a referência a tais pessoas como se fossem peças de cristal, muito
suscetíveis em serem quebradas ao menor descuido…
Melindrado
revelaria como que as consequências de um melindroso que se fazer notar,
mostrando como se sente despeitado nas suas referências de autoelogio, por
vezes, exacerbado e até caprichoso por palavras e atos, sobretudo dos outros
para consigo. Por seu turno, no afã de querer mostrar-se para além daquilo que
(pretensamente) vale, vai criando à sua volta uma armadura de defesa e de
ataque…quantas vezes usando truques de vaidade, de mostrar que é imprescindível
e, nalguns casos mais complexos, querendo tornar-se notado pela ausência…como
se, sem ele, nada fosse igual!
*
Necessidade do elogio e do agradecimento.
Esta
outra vertente revela algo que nem sempre se descobre como o verso da medalha
dum melindroso. Só com a aprendizagem dos fatos e o conhecimento das pessoas é
que podemos ir entendendo como é que os agradecimentos e os elogios funcionam
como tábuas de salvação para pessoas complexadas e ávidas de serem notadas e
benquistas…Dir-se-á que uma coisa são os elogios e os agradecimentos sinceros e
corretos e, algo bem diferente, é a bajulice, a pretensão de ficar bem e mesmo dalguma
mentira e dissimulação. Quem não ouviu já agradecimentos que soam a oco e a
falso! Quem não se terá já sentindo incomodado com elogios que mais parecem
adulações do que atos sinceros! Quem não terá já percebido que há pessoas que
não vivem para servir, mas se servem dos lugares para subir na consideração
alheia e social!
*
Cumprir a obrigação e o dever.
De
facto, o melhor que nos podem acontecer é termos a consciência do cumprimento
do dever – vocacional, profissional, moral e cívico – pois isso realiza quem
não busca outra coisa que não seja ser fiel à sua missão neste mundo. Para isso
é preciso saber o que se anda por aqui a fazer, tendo descoberto as suas
qualidades e os dons, os seus defeitos e erros, fazendo a sua autoanálise e
aceitando as observações dos outros. Mais do que fiar-se nas boas impressões
que tentamos deixar aos outros, precisaremos de ser autênticos e sérios na
convivência de uns com os outros…
Quando
tanta gente cuidar mais daquilo que quer que os outros vejam ou apreciem,
torna-se urgente e essencial que as pessoas primem pelo cumprimento do dever,
nessa concordância da consciência entre o que se pode, o que se deve e mesmo
aquilo que se espera de si mesmo e dos outros. De pouco adianta ser exigente
para com os outros e tolerante consigo mesmo, pois isso pode denunciar uma
deformação farisaica não-assumida. Na medida em que sabemos o que nos custa
cumprir o dever, assim seremos mais tolerantes e compreensivos para com os
outros… Coerência a quanto obrigas, no tempo e na forma!
António Sílvio Couto
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