O tema
da ‘violência doméstica’ – escrevemos entre aspas porque o assunto nem sempre é
linear, objetivo ou claro – volta a estar na ordem do dia. As razões podem ser
muitas. As causas as mais diversas. As consequências bastante nefastas. O tema
é complexo e suficientemente mobilizador da sociedade.
Deve-se
tornar, desde logo, claro que a ‘violência doméstica’ atinge os diferentes
quadros de sexualidade: de homens sobre mulheres, destas quanto àqueles, de
homens contra homens e de mulheres para com mulheres… se tivermos em conta a
apelidada condição de género e as possíveis conjugações de possibilidades.
Também é
digno de registo que uma parte significativa dos casos noticiados de ‘violência
doméstica’ fazem-na incidir dos homens sobre as mulheres e raramente se faz
notícia sobre casos da tal ‘violência doméstica’ nas aceções de
homossexualidades, mesmo que tais casos possam ser registados, mas que não são tão
expostos por uns tantos lóbis de comunicação… Neste campo específico, dizem os
entendidos, que a violência é suficientemente agressiva, podendo, numa razoável
maioria das situações, serem reportados de fatais e com manifestações
preocupantes de virulência atroz.
* Violência doméstica – quantos
são?
Os casos
tornados (mais ou menos) públicos são duma dramaticidade quase de pandemia
social. Os números não enganam. A média de vítimas, em 2016, foi de cerca de
mil casos com pessoas com mais de 65 anos; mais de 800 situações com crianças e
jovens (até aos 17 anos); cerca de 5300 de mulheres com mais de dezoito anos e
cerca de oitocentos casos com homens maiores de 18 anos. Na tipificação dos crimes:
93% foram contra pessoas, num total de quase 20 mil situações, onde se incluem,
sobretudo, maus tratos físicos e psicológicos com 16.461 ocorrências.
O perfil
da vítima é, na sua maioria, do sexo feminino (82 %), com cerca de cinquenta
anos de idade, casada, com filhos, estando empregada, com algum nível de
escolarização e tendo relação habitual com o cônjuge…
* Violência doméstica – como
interpretar?
Talvez
venha evoluindo a consciencialização sobre a violência doméstica, a sua
expressão na vida familiar e mesmo como devem ser cuidados vítima e autor. A
passagem duma certa tolerância sobre o assunto para a denúncia tem vindo a
fazer o seu caminho na nossa sociedade. Muitas vezes os autores da violência
não aceitam que são pessoas doentes, que precisam, antes de tudo, de serem
tratadas, por forma a saberem conviver – de forma regular e regulada ou no
quadro familiar – com os outros sem lhe infligirem maus-tratos, coações,
agressividade (física, psicológica ou outra), antes devendo cultivar a
convivência com os demais num espaço de relação saudável e libertadora.
Muitas
vezes, os agressores não passam de já agredidos, seja no contexto familiar,
seja no âmbito social, profissional ou relacional. Em certas situações há
feridas não-resolvidas nem curadas pela maturidade humana, cultural ou
psicológica. Isso como que explica que, em certas classes sociais, se
verifiquem casos de violência doméstica, que alimentam algumas das revistas
cor-de-rosa!
Encontrar
o porquê da violência doméstica é tanto ou mais importante do que criminalizar
a sua prática, pois, da descoberta das razões para tais comportamentos poderá vir
a luz para saber como tratar com pessoas que praticam a violência ou como devem
ser encaminhadas para resolverem as suas causas, que se exprimem muito para
além das consequências nos outros…
Seja
qual for a parte agredida ou agressora – homem ou mulher, uma das partes do par
homossexual, criança ou velho – temos de atender às pessoas envolvidas, tendo
em conta o seu historial de vida, as condições atuais e as perspetivas futuras.
Para já temos andado à caça dos transgressores, castigando-os. Mas o trabalho
completo será melhor sucedido se procurarmos a recuperação de todos: as
vítimas, ajudando-as a libertarem-se das agressões e dos seus causadores; os
réus, dando-lhes condições para não se tornarem mais agressivos depois de
castigados pelos seus atos, criando-lhes oportunidades de serem inseridos na
sociedade em condições de inclusão, lançando sementes de recuperação e sem
rótulos de irrecuperabilidade…
António Sílvio Couto
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