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quarta-feira, 17 de maio de 2023

Não seremos já ex-terra de Santa Maria?

 

Embora a expressão ‘terra de Santa Maria’ seja, no sentido estrito dada à região medieval da Santa Maria da Feira, ela pode e tem sido aplicada ao todo do território português e com especial incidência à devoção que temos para com Nossa Senhora. Com efeito, desde os alvores da nacionalidade podemos ver alguma relação com Santa Maria na nossa história coletiva, tenha a evocação que se Lhe possa dar, desde Santa Maria do Castelo (Guimarães) até à Senhora da Conceição (Vila Viçosa), passando por Santa Maria de Braga ou Senhora da Batalha ou a mais emblemática, desde há mais de um século, Nossa Senhora de Fátima... Daqui o epíteto que diversos papas nos deram de sermos ‘terra de Santa Maria’, pois a Ela entregues e dedicados...ao menos em teoria.

1. Quem estiver mais ou menos atento poderá encontrar, em cada concelho e por vezes multiplicado, algum lugar de maior devoção a Nossa Senhora. Por ocasião do mês de maio ali acorrem peregrinações e fazem-se notar diversas devoções, em conformidade com as necessidades mais ingentes daquela região. Por vezes essas manifestações da piedade popular – muito para além da religiosidade subjacente – configuram aspetos de vida pessoais, familiares e comunitários. Ignorar esses sinais seria como que incorrer na negação da identidade de cada povo...

2. Em contraste com este magma espiiritual vemos emergirem tufos de materialismo, por vezes vertidos em posições políticas e em decisões ideológicas. Vejamos um sinal disto nos tempos mais recentes, no que toca às datas de aprovação da eutanásia e a sua relação com momentos evocativos com a devoação a Nossa Senhora e a Fátima em particular. As quatro últimas datas de aprovação da eutanásia – eufemisticamente dita de ‘despenalização da morte medicamente assistida’ – têm alguma proximidade a Fátima e aos acontecimentos ali verificados. Referimo-nos apenas aos momentos mais recentes e têm por pano de fundo – com a lei votada pelos deputados em maioria – de permeio com as idas-e-regressos (em três anos e três meses) entre o Parlamento, a Presidência da República, o Tribunal Constitucional e seus adjacentes: 20 de fevereiro de 2020 (em plena pandemia) – festa litúrgica dos pastorinhos Francisco e Jacinta Marto; 7 de dezembro de 2022 – véspera da Imaculada Conceição; 13 de fevereiro de 2023 – memória do falecimento da Irmã Lúcia, vidente de Fátima; 12 maio de 2023 – véspera da primeira peregrinação aniversária das aparições na Cova de Iria.

Até que ponto quiseram fazer encaixar os factos com as datas? Haverá mera coincidência? Não deveremos questionar a subtileza? Não durmamos... Foi audível a denúncia do Papa Francisco sobre este assunto no dia seguinte à mais recente aprovação da eutanásia: somos um país que aprova leis para matar!

3. Nota-se que boa parte da população portuguesa está num processo acelerado de descristianização, senão na teoria ao menos na prática. Esse designado ‘ateísmo prático’ vai conquistando adeptos e muitos deles ainda se envernizam de religião, embora dentro de uma lógica mais individualista do que comunitária. Factores diversos têm contribuído para este viver como ‘se Deus não existisse’. Múltiplas desculpas têm sido aventadas, algumas com espaço para crescerem, mas tantas outras não passam de subtil acomodação ao consumismo galopante e com cada vez maior número de fiéis.

4. Que fazer, então perante este cenário? Não terá chegado a hora de nos questionarmos todos, colocando em causa os métodos, as estratégias e assumindo as consequências mais do que atirando as culpas para os outros? Tantos anos de ‘catequese’ – termo indevidamente dado ao processo de ensino/passatempo das crianças nas paróquias – que resultados conferem? Tantos escuteiros nos agrupamentos – agora que se comemora o centenário do CNE em Portugal – e os efeitos esfumam-se em quase-nada?

A ‘terra de Santa Maria’ está neo-pagã. Os sinais estão à vista. É tempo de acordar...



António Sílvio Couto

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