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terça-feira, 11 de abril de 2023

Como hão de sair, se nunca entraram?

 

Esta pergunta parece ser atribuída ao Papa Bento XVI, numa leitura do afastamento de muitos cristãos da Igreja. Ele que escreveu a ‘Introdução ao cristianismo’, na já longínqua década de sessenta do século passado (editado em 1968 enquanto Joseph Ratzinger), como que colocava, nesta pergunta, o dedo na ferida de tantos que se desculpavam com a discordância quanto à Igreja para dela se desligarem mais praticamente...

Ora, decorridos estes dias de afazeres pascais, no interior dos templos, fomo-nos apercebendo dos lugares deixados vazios em muitos dos nossos espaços de celebração. Aquilo que em tempos não muitos recuados eram às centenas, agora quedamo-nos por parcas dezenas ou até contando-os pelos dedos. Mais acentuadamente vimos trocarem os dias de descanso pela participação nas celebrações da fé cristã. Os lugares de veraneio encheram-se, enquanto os templos se esvaziaram...

1. O que levou a verificar-se mais acintosamente este processo de afastamento dos praticantes da religião católica? Quais as causas mais profundas? Como serão as consequências no futuro próximo? Qual o papel dos acontecimentos tão difundidos das mazelas dos padres – diga-se ‘abusos sexuais’ – nesta debandada? Como explicar a redução de casas que se abriram para receber a ‘visita pascal’ nalgumas terras tradicionais do norte de Portugal? Haverá alguma proporção entre o processo de mundanização com a insistência da comunicação social nos problemas dos membros da Igreja?

2. É notório que muitos dos nossos fregueses são-no por conveniência nem sempre declarada. Inseridos numa religião tradicional de cariz sociológico vão andando até que encontrem outras motivações de crença. Com que facilidade trocam de igreja, quase mais depresssa do que de lugar de compras. Muitos dizem-se praticantes, mas não explicam do quê. Talvez usufruam das regalias de irem à missa quando e onde lhes convém, mas não se fidelizam a um lugar de compromisso e de caminhada. Poderão ser mais fiéis à marca de sabonete ou champô ou ao restaurante de fim-de-semana do que à paróquia onde residam ou onde se empenhem em se formarem na fé. Em tempos um teólogo italiano chamava a esse tipo de crentes, os ‘cristãos pirilampo’, isto é, que pousam onde lhes interessa, mas sem vínculo a nada nem a ninguém.

3. Numa atitude quase ‘assasina’ continuamos, na Igreja católica da maior parte das dioceses do nosso país, a alimentar fatores que agravam a saída de tantos cristãos a quem aceitamos que se lhes dê o rótulo de ‘não-praticante’, quando querem casar na igreja. Até para que a fuga não seja tão rápida fazemos de conta que os processos podem ser tratados com a dispensa de impedimento de disparidade de culto, quando um deles não é batizado. Em vez de lutarmos para que haja separação dos processos civil e canónico, continuamos a fazer-de-conta que temos pagãos a celebrar sacramentos... Em tudo isto não há nada de sério e muito menos de correto para com as consciências. Nestes casos nem entraram nem sairam, só passaram e de raspão...

4. Com que ligeireza alguns jornaleiros de serviço à confusão reinante foram elencando as ausências dos penitentes nas confissões da quaresma deste ano. Uns tantos apresentaram dados confrangedores, mas que lhe sabiam a vitória mal amanhada, naquilo que parece ser consequência dos casos graves verificados na Igreja em Portugal. Segundo a perspetiva duma parte ideológica da sociedade atual, já só falta trazer à liça a expressão da carbonária da primeira república, quando os padres eram rotulados de ‘corja’, com os demandos de antanho... O plano está traçado e começa a dar frutos. Ainda não o vimos, com verdade?

5. Conta-se que um padre quis, um dia, colocar à prova os fiéis que tinha na igreja. Combinou com um determinado sujeito que entraria no templo e ao som de uma rajada de metralhadora, diria: quem está disponível a morrer por Jesus? Boa parte fugiu rapidamente. Nova investida e saiu outra parte. Por fim, novo repto... e ficou um resto, ao que ele disse: padre, pode continuar, agora sabe com quem conta...



António Sílvio Couto

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