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quarta-feira, 10 de agosto de 2022

Justiça e compaixão – complemento ou confronto?

 


Por ocasião dos problemas de ‘abusos sexuais’ – para já – na Igreja católica temos visto despontar uma linha justicialista, que, pretensamente, defendendo as vítimas, essencialmente, reclama o castigo dos prevaricadores. Estes como que são tornados ‘objeto’ de condenação e quase nunca se tenta olhar para eles como pessoas – doentes, descompensadas emocional ou afetivamente, embora se transgressores devam ser julgados e condenados...no devido tempo e não – como parece – ainda na fase da acusação...quando a há.

 1. Estamos num tempo algo conturbado, onde, com facilidade, emergem fantasmas, surgem mitos e pululam oportunistas. Com efeito, a propósito das prevaricações de alguns padres como que se faz uma generalização e passam a ser todos suspeitos de serem abusadores de crianças ou mesmo cultivadores de uma moral pouco apropriada às regras que propõem. Com que destreza se extrapolam episódios e se fazem conjeturas sobre tudo e para com todos. Com que ligeireza se aceitam denúncias, sem questionar as razões – ou serão ressabiamentos? – dos que tal dizem. Com que leviandade se envolvem na discussão quantos/as, que tentam disfarçar as mazelas que povoam os seus antros de frequência ou mesmo de referância...social, económica ou ideológicamente.

2. Não devemos dar aos outros, por caridade, aquilo que lhes devemos, por justiça. Este aforisma é tanto mais verdade quando pode estar em causa a honorabilidade de alguém ou até a sua vulnerabilidade. A justiça deve ser rápida para que não se torne foco de injustiça, isto é, de acusar sem provar ou de deixar a moer aquilo que pode ser removido, mesmo que dóia.

 3. Pelo que temos conhecimento há pessoas acusadas, em suspeita, há meses, que ainda não foram ouvidas sobre nada daquilo que foi publicitado...como escandalosamente. Costuma dizer-se – e com razão – todos são inocentes até prova em cntrário, isto é, até transitar em julgado. Ora, nestes casos em divulgação publicados como ‘abusos’, seja quem for o acusado, é culpado mesmo que possa nunca ser julgado e, enquanto presumível, terá de o aceitar silenciosamente sejam quais forem as acusações...mesmo que inventadas, tecidas e urdidas por quem lhe (possa) desejar mal...passados anos ou décadas, isto é, tirando do contexto dos acontecimentos factos, situações, pessoas e intenções!

 4. À justiça aquilo que é da justiça. Sempre. Mas será que a justiça – sobretudo esta de caraterísticas populistas e arrastada – tem funcionado como entidade defensora da verdade ou de quem quer fazer dela uma espécie de ariete contra ‘inimigos’ escondidos, presumidos ou indesejados? Não será que uma boa dose de justiça está eivada de peconceitos contra membros do clero e das instituições da Igreja católica? Por que se abespinham tanto certas forças contra sinais religiosos, quase sempre sob suspeita e em menos boa discrição? Não andará por aí, de forma difusa, uma tendência em fazer das coisas espirituais, causas perdidas para os valores do consumismo, do hedonismo e de quanto possa cheirar a Deus?

 5. Fixemos a atenção naqueles que são (ou foram) considerados culpados dos abusos – por vezes apelidados de abusadores e noutras situações apresentados como causadores de malfeitorias para com crianças e não só – e que nos surgem, desde logo, como pessoas de má-índole, senão criminosos pelo menos ‘dignos’ de serem apedrejados sem dó-nem-piedade, já...

Não está em causa defender acriticamente quem que seja, mas antes perceber quem são essas pessoas, em tantos casos, já eles/elas vítimas de atrocidades idênticas ou até de menos boa formação moral, apesar de a terem estudado e de terem sido examinados sobre a matéria. Que querem fazer com essas pessoas – recuperá-las ou trucidá-las social e religiosamente? Saberemos distinguir entre o pecado e o pecador? Quem nos faz combater – o mal feito ou os malfeitores?       

Precisamos de mais compaixão, sabendo distinguir os parâmetros de avaliação. As pessoas, sempre!

 

António Silvio Couto

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