De vez
em quando torna-se útil, necessário e conveniente repararmos em quanto
dependemos uns dos outros…nos atos mais simples do nosso dia-a-dia:
eletricidade, água, gás, comunicações (televisão, internet, telefone) tornam-se
mais precisos quando nos faltam, nem que seja por breves momentos.
Consciencializar
a panóplia de situações em que precisamos uns dos outros poderá fazer-nos mais
humildes e reconhecidos pelo tanto que recebemos e, nem sempre, agradecemos.
1. Claro que aqueles serviços de que
usufruímos, pagamo-los. Mas isso não nos pode deixar indiferentes às
interdependências em que nos encontramos continuamente. Vastíssimas equipas
contribuem com o seu saber, a sua competência e mesmo a sua dedicação para que
possamos ter aqueles serviços – e tantos outros, como a cadeia alimentar ou aspetos
de segurança – da forma mais normal possível. Ser grato é o mínimo que se
exigirá. O pagamento de tais prestações, para além de justo, é essencial para
que continuemos a tê-los com a regularidade necessária e conveniente…
2. Uma das consequências mais
visíveis do tempo da pandemia, que temos estado a viver, foi o fechamento
(isolamento, refúgio ou medo) resultante dos cuidados para que o vírus não nos
atingisse. Depois dos cuidados higiene-sanitários tivemos de lutar contra
‘falsas notícias’ (ou não tanto), servidas com razoável abundância. Com que
funesta vivência farejamos a morte no mês de janeiro passado, onde, entre o
início e o final, duplicou o número de mortos pelo fatídico vírus…Confesso que
nunca vi tão de perto o estertor da morte, passeando por entre as pessoas
aturdidas com o medo, a incerteza e as consequências.
3. A fronteira entre o excesso de
cuidado com a ‘covid19’ e a cobardia foi (é) muito ténue. Passado este tempo
tenho a sensação decque posso ter sido um tanto cobarde, salvaguardando a pele
e não estando mais presente, sobretudo, aos mais velhos no lar do centro
paroquial…Ao reconhecer esta falha tenho presente o imenso número de padres
vítimas do vírus – 269 em Itália, só no ano de 2020; mais de cem em Espanha; 65
no Brasil; em Portugal também houve alguns padres mortos… Em certos países
morreram mais padres vítimas do covid-19 do que médicos, segundo alguns devido
à proximidade e dedicação daqueles…
4. Habilitados pela provação da
pandemia precisamos de perspetivar esta intercomunhão em que nos vivemos,
vivemos e existimos, pois, o sacudir desse egoísmo em que nos refugiamos
durante os vários estados de confinamentos, não poderá quedar-se em ficarmos só
por esse faz-de-conta de que tudo passou. Com efeito, a higienização a que nos
submetemos preventivamente tem de continuar, mais do que na dimensão do corpo
tem de atingir as complexas particularidades mentais: há, de verdade, muitas
teias de preconceito para com os outros, na medida em que os fomos tornando
senão inimigos ao menos adversários. Com
que facilidade se nota agressividade – latente ou explicita – para com os
outros, sejam conhecidos ou nunca vistos. As cenas de conflitualidade
proliferam desde os pequenos gestos até às imagens noticiosas. Parece que foi
desarrolhado algo contido sob pressão…psicológica e/ou espiritual.
5. Neste contexto torna-se de
fundamental acuidade a proposta da Igreja católica do ‘caminhar juntos’ em
sínodo. Vejamos breves excertos da homilia do Papa Francisco na abertura do
sínodo sobre a sinodalidade (10 de outubro).
«Fazer Sínodo significa caminhar pela mesma estrada, caminhar em conjunto.
Fixemos Jesus, que na estrada primeiro encontra o homem rico, depois escuta as
suas perguntas e, por fim, ajuda-o a discernir o que fazer
para ter a vida eterna. Encontrar, escutar, discernir: três
verbos do Sínodo,
* Somos chamados a tornar-nos peritos na arte do encontro; peritos, não na
organização de eventos ou na proposta duma reflexão teórica sobre os problemas,
mas, antes de mais nada, na reserva dum tempo para encontrar o Senhor e
favorecer o encontro entre nós.
* Um verdadeiro encontro só pode nascer da escuta. (...) Como estamos quanto à
escuta? Como está «o ouvido» do nosso coração? Permitimos que as pessoas se
expressem, caminhem na fé mesmo se têm percursos de vida difíceis, contribuam
para a vida da comunidade sem ser estorvadas, rejeitadas ou julgadas?
* O encontro e a escuta recíproca não são um fim em si
mesmos, deixando as coisas como estão. Pelo contrário, quando entramos em
diálogo, pomo-nos em questão, pomo-nos a caminho e, no fim, já não somos os
mesmos de antes, mudamos (...) O Sínodo é um caminho de discernimento
espiritual, de discernimento eclesial, que se faz na adoração, na oração, em
contacto com a Palavra de Deus».
Caminhemos juntos…
António Sílvio Couto
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