Alguns
canais televisivos introduziram na sua programação subtemas de pretensa
averiguação da autenticidade de certas notícias. Este processo envolve a
participação de outros intervenientes, numa espécie de análise do que há de
sério, mesmo que possa ser visto a brincar.
O
esquema parece assaz simplório: escolhe-se um assunto (facto, pessoa ou
situação), tenta-se ver os diversos ângulos (numa espécie de contraditório),
introduz-se uma razoável dose de bom senso (despe-se a roupagem do sensacional)
e aparecem os resultados…desejados, corretos ou normais.
Mais do
que de má-informação, por parte destes programas, é a capciosa intenção de
recorrerem a isso que apelidam de ‘redes sociais’, servindo-se delas como meio
de informação, tanto mais que a maior parte das pistas não parecem passar de
pundonores agravados ou ainda de ressabiamentos mais digeridos. Por aqui se
pode ajuizar da qualidade populista – tentativa de usar o ‘povo’ para de
seguida se voltar contra ele – de tais programas suspeitos…
1. Num dos canais aparece a
designação de ‘poligrafo’, lembrando esse artefacto almejado para a descoberta
da verdade, ao lhe ser submetido algum réu. Embora não apareça o dito
instrumento de aferição à possível verdade, pelo ‘programa’ – mais parece de
entretenimento do que de informação – passa o julgamento de culpado ou de
inocente, mesmo que não haja acusador nem vítima…
2. O título do outro programa
acha-se mais audacioso ao proclamar-se: ‘hora da verdade’. A parceria com uma
publicação ‘on-line’ como que lhe poderia conferir outro estatuto, mas também
aqui as escolhas para análise estão algo enviesadas, surgindo mais como
ideológicas do que como oportunidades de esclarecimento dos conteúdos, por
vezes, manipulados. Mais uma vez organiza-se o ‘jogo’ para que dê o resultado
que se pretende…
3. A par destes intentos de
‘descoberta’ da verdade vemos que se está a recrudescer uma tentativa de
colocar – sob a alçada do governo – a classificação da autenticidade das
notícias. Os tiques de ‘lápis-azul’ da censura de antanho voltam a atacar. Quem
foi que investiu democraticamente o governo para ele ser o aferidor das ‘falas
noticias’, se ele mesmo é o criador, o difusor e quem mais recolhe o resultado
dessas mesmas notícias falsas’? Não andará o caçador a fazer-se fiscal das suas
malfeitorias, arvorando-se em juiz em causa própria?
4. Atendamos por instantes sobre
esse fenómeno atroz de colocar como ‘fonte de informação’ a bisbilhotice mais
ou menos difundida através do facebook ou de outros artefactos tolerados como
meio de fazer correr quem tem a tarefa de informar. Aquilo que, noutras épocas,
não passaria de um boato ou de uma suposição a confirmar como que assume o
estatuto de notícia ou vai obrigar a desmentir sem nada ter acontecido, somente
uma visão faciosa e talvez mal-intencionada. As fontes não estarão inquinadas,
mas assumem a condição de ‘verdadeiras’? Não se estará a favorecer mais o
escândalo do que a notícia? Não andaremos a reboque do que se quer ver e/ou
ouvir e menos do que acontece, de verdade?
5. O pior dos cenários em curso é a
falcatrua bem orquestrada com que se tenta impingir alguma ideia ou combater
algum projeto, se estiverem, à partida, fora do quadro ideológico de quem faz a
comunicação social. Lóbis subtis ou mais ostensivos emergem para que possam
reinar durante uns tempos e com facilidade serem promovidos para que não se
repare nos problemas reais das pessoas, dos grupos e mesmo do país. A tendência
de espremer o limão de um facto – mais do âmbito de um certo particular –
condiciona que se veja outros problemas mais graves. Ora o atual governo é
disso um dos habilidosos dos tempos mais recentes da nossa história coletiva.
Com que intencionalidade e destreza se fornecem elementos sobre ‘casinhos’
pequenos para distrair do que realmente está a acontecer. O lançar para a ribalta
de ‘questões fraturantes’ faz com que se não veja o que estão a cozinhar nas
costas do povo… hoje como ontem!
Será que
a maioria da comunicação social em curso fosse ao polígrafo sairia sem ser
chamuscada na mentira?
António Sílvio Couto
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