O apelido ‘Costa’ recorda-nos tantas e tão
veneráveis figuras que intervieram por – boas, más ou desastrosas – razões na
nossa história coletiva.
Excluímos deste plano de observação tantos ‘costas’
ilustres, em imensos campos de trabalho e de realce, variadíssimos que se
destacaram no desporto ou na vida artística, na dimensão cultural e cultual… e
uma infinidade de anónimos que fizeram da história um lugar de vida, de compromisso
e de feitos em razão dos outros…
O ‘confronto’
entre o Afonso e o António nada tem de rivalidade, antes mais parece que,
decorrido um século e tal, podemos encontrar linhas de afinidade, vendo no do
passado perspetivas para o do presente…sem outro objetivo que não seja o de
construir boas leituras. Se queremos perceber alguns pontos de contato
poderemos ler e aprofundar aspetos menos bem atendidos… tal a velocidade em que
temos andado envolvidos. Pior, um já morreu (1937) e o outro ainda vive e,
possivelmente, por muito tempo ainda.
= Breves pinceladas de afinidade:
* Afonso foi eleito, em fevereiro de 1900, deputado
em razão de uma peste bubónica que atingiu o Porto entre o verão de 1899 e a
primavera de 1900… António tem estado à testa do combate à pandemia do
‘covid-19’ desde o final do inverno do ano de 2019 e talvez até ao verão de
2020;
* Afonso ocupou o ministério da justiça e dos
cultos, tendo-lhe sido dada a alcunha de ‘mata-frades’ pela legislação laicista
que mandou publicar – lei da separação do estado das igrejas (1911) – bem como
outras atitudes antirreligiosas que tomou, tal como os confrontos que provocou
com a hierarquia da Igreja católica do tempo… tendo ‘profetizado’ que acabaria
com a religião, em Portugal, no espaço de duas gerações… António conseguiu,
junto do episcopado português, silêncio, contenção e obediência às regras civis
de saúde, por ocasião da pandemia do ‘covid-19’, reduzindo o culto a atos de
transmissão televisionada e com os templos fechados às assembleias religiosas…Onde
estão os ‘barrosos’, os ‘vieira de matos’ e os ‘mendes belo’ do nosso tempo, nas
cátedras episcopais?
* Afonso conseguiu conter o défice orçamental e equilibrar
as finanças públicas, como ministro acumulado do setor (1913-1914), com um
saldo só atingido, na história do país, com A. O. Salazar (1932)… Foi sob a
governação de António que se deu o maior saldo das finanças públicas, em 2019,
logo, rapidamente, afundado com a crise do ‘covid-19’ e a caminho daquela que muitos
apelidam de maior receção nacional… mas como ainda estamos no olho do furacão
não se vislumbra já o efeito total…
= Será que estes três pontos de convergência factual
fazendo destes dois ‘costas’ alguém muito especial na nossa história? Os
episódios – peste, religião e economia – serão suficientes para os equiparar?
Que marca de diferença deixarão, com tanto tempo de distância e em épocas tão
distintas? Usando armas diversas, atendendo mesmo aos tempos de vivência, os
efeitos poder-se-ão prolongar em consistência, sabedoria e proveito de todos?
= Vejamos, parcelarmente, os campos de afinidade e
tentemos colher do passado (Afonso), perspetivas de futuro (António):
- peste/vírus
– algo funesto fez com que se destacassem, correndo o risco de poder ser visto
como a construção do futuro sobre a podridão, a desgraça alheia ou o tenebroso…
No entanto, temos de compreender que é nas crises onde se destacam os bons ou os
ruins, os honestos ou os oportunistas, os sábios ou os exploradores da
ignorância dos demais. Diz o adágio latino: ‘asinus asinum fricat’ (um burro
coça outro)!
- religião
– essa força que move multidões mais pela fé do que pela crença, quase sempre
foi espaço para que se manifestem as conjeturas ideológicas, nem sempre claras
e às claras. À provocação do Afonso, Deus respondeu, em Fátima, com um novo
élan religioso e vigor de fé. Será que iremos descobrir novos sinais de fé
adulta após esta crise que atingiu parte da quaresma e o tempo pascal deste ano
litúrgico? Corremos o risco de ficarmo-nos na ‘religião de sofá’, acomodados às
pantufas de prática religiosa televisionada… o futuro dirá quais os resultados!
Não andaremos a reduzir-nos ao menos mal sem horizontes nem clareza?
– economia
– isso que faz mover o mundo entrou em colapso, quando se tinha atingido o
sucesso este esfumou-se em menos de um mês e a austeridade virá, mesmo que
clamem contra ela… Despertai!
António Sílvio Couto
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