Eis que, de repente, a máscara se tornou um dos
adereços mais importante de todos e para todos. Uma simples tira de pano – com
maior ou menor simplicidade ou com um ou outro toque artístico – é hoje algo
que nos faz estar em comunhão na prevenção para que não haja tanta desgraça ou
nos faça tornar a todos vigilantes da saúde própria e alheia.
Numa visão cultural clássica saber-se-á que a
‘máscara’ era usada no teatro grego e posteriormente no de cultura latina,
funcionando, entre outras coisas, para amplificar a voz e até para criar novas
personagens nas representações. Claro que a função era diferente e a própria
máscara tinha outra configuração, deixando a descoberto os olhos e a boca,
órgãos que agora são resguardados com a utilização da ‘nova’ máscara.
O recurso à máscara como disfarce vemo-lo (ou
melhor, víamo-lo), bastante difundido, na época do carnaval, tanto naquilo que
tem de sério – repare-se no ‘baile de máscaras’ veneziano – como de folclórico
– atente-se aos caretos de certas regiões rurais – ou ainda à tendência bizarra
de comediantes populares… Neste âmbito a máscara como que poderá servir para a
assunção de outros papéis nem sempre aceitáveis por quem a ela quer recorrer
num misto de ser e de parecer…sabe-se lá a que preço e com que intenção.
= Que tem, então, de especial a máscara fomentada,
difundida e usada nesta contenção de pandemia? Será que já nos apercebemos dos
riscos que corremos se não usarmos a máscara – cirúrgica ou social – no
contexto da vida com os outros? Já percebemos que temos de nos defender e de
cuidar da proteção alheia?
= Desde meados de março que temos vivido etapas para
enfrentarmos as causas, debelando as consequências deste coronavírus
‘covid-19’: desde o estado de emergência – duas fases de 19 de março a 2 de
maio – até à situação de calamidade – em vigor desde 4 de maio – passando por
dias de confinamento bastante restritivo – por ocasião da páscoa e no início de
maio – fomos aprendendo a lidar com ‘algo’ que tem tanto de perigoso quanto de
inesperado e sem rosto.
As mais variadas atividades foram reduzidas ao
essencial, senão mesmo algumas suspensas ou até anuladas. Esta pandemia viral
tornou-se quase tanto mais psicológica do que de saúde físico-biológica. Foi
crescendo a desconfiança das pessoas, emergiu o medo mais tétrico e quase
floresceu o que seria impensável de macabro na nossa condição humana.
De algum modo faliram muitas das certezas em que
andávamos entretidos, mesmo as de âmbito mais profundo e considerado
inabalável. Os ritos cultuais entraram em colapso, veja-se o encerramento dos
templos e a suspensão dos atos religiosos… desde 15 de março até 30 de maio –
setenta e sete longos dias – em que ‘o povo de Deus’ esteve, normalmente, em
grande jejum do alimento de Jesus-eucarístico. Foram surgindo múltiplas formas
de fazer chegar a eucaristia – de domingo ou à semana – àqueles que estavam
confinados à sua casa… a capacidade de resposta foi impressionante, mas os
riscos podem continuar se não forem dados passos de resposta a um catolicismo
que seja comunitário e não de mera solução dos ritos e do cumprimento de
preceitos…. Tanto quanto me foi dado perceber e executar consegui celebrar –
com transmissão via Net radio católica – em cerca de cinquenta daqueles dias de
confinamento e afins, com especial incidência aos domingos e, neste espaço que decorreu
na parte final da quaresma e todo o tempo pascal… daí o ressurgimento em
domingo de Pentecostes.
= Eis-nos chegados ao momento em que não podemos
abrandar na vigilância, pois os dados continuam a dizer que o vírus não está
dominado e tão pouco isso acontece por decreto-lei ou por publicação de
qualquer portaria… A pressa em querer pôr a economia a render poderá deixar-nos
à beira do precipício, pois desgraçado será um país que viva mobilizado pelo
consumo e não pela produção, que tente enganar os incautos com dinheiro para
gastar e não ensine a poupar ou ainda que julgue sobreviver com balões de
subsídios na medida em que terá a fatura a pagar mais depressa do que pensa…
Foi, assim, que entramos, por três vezes – sempre com a mesma cor governante – na
bancarrota… Já é tempo de aprendermos com o passado e não nos deixarmos
manipular pelo que parece sucesso (salário), sem trabalho!
António Sílvio
Couto
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