Uma
associação internacional – de seu nome, em sigla, peta – ‘povo pelo tratamento
ético dos animais’ – veio a terreiro reclamar de expressões ofensivas para com
os seus protegidos (animais) exigindo que seja corrigida a linguagem de muitos
dos ditados populares, pois estariam a constranger os ditos…
Cá pela
nossa área de influência logo surgiu uma agremiação partidária a reclamar
idêntica projeção nas suas intenções e reclamações de tantos dos cantos
infantis, das músicas quasi-ancestrais e mesmo do comportamento ofensivo e
ofensor para com os animais, seus e nossos amigos, ou não tanto.
* Se
levássemos a sério as sugestões da ‘peta’ ou do partido nacional à sua
expressão, teríamos de reescrever uma boa parte da nossa literatura, ter-se-ia
de andar com um espírito inquisitorial para muito do nosso anedótico ou ainda
teríamos de conviver com uma censura nunca antes vista, pois alguém poderia
entender como ofensivo aquilo que não passou duma figura de estilo, literária
ou não. Se tal correção fosse possível, qual seria a data de começo da sua
vigência?
*
Deve-se reconhecer que está a emergir – sabe-se lá comandada por quem ou de
onde – uma nova cultura, onde os humanos têm de se submeter à sensibilidade dos
animais, fazendo aqueles servidores destes e não mais o seu contrário. Esta
onda roça o fundamentalismo e insere-se numa espécie de aculturação urbana que
não conhece nem nunca contactou com o mundo rural, mas para o qual dita leis e
sentenças de laboratório… As crianças já não se sabem sujar e tão pouco
defender de vírus, bactérias e fungos!
* Este
fenómeno tem vindo a difundir-se com grande rapidez, podendo ser uma das formas
de populismo mais imediato a arregimentar simpatizantes, militantes e votantes.
Há, no entanto, indícios de que algo vai mal no reino animal, pois se tem vindo
a fazer dos animais entidades com direitos inatacáveis, mas se vai tolerando
alguns mecanismos de subjugação aos humanos. Exemplo disso é a trela dos
cãezinhos, passeados pelas ruas e nem sempre recolhidos os dejetos respetivos.
Se é para que os animais sejam titulares de direitos inalienáveis, então
deixem-nos andar livres na rua, não os prendam – seria ofensa dizer acorrentem?
– mas também não os obriguem a estar em espaços nem sem adequados à sua
condição e natureza. De facto, vemos certos ‘animais de companhia’ serem mais
criaturas de estimação do que seres sensíveis num aprisionamento forçado.
* Que
sociedade é esta que tem mais espaços de venda, em supermercados e outras
superfícies comerciais, dedicados a alimentação para os animais do que
colocados nos escaparates artigos direcionados às crianças? Sim, algo vai mal e
pela disposição na carruagem o futuro não se avizinha senão sombrio. Parece
muito preocupante a dedicação substitutiva das crianças pelos animais.
Repare-se mesmo nos nomes dados aos ditos ‘animais de companhia’, muitos deles
têm mais marca humana do que os nomes dos humanos com nome. Não andará algo
invertido nestes tempos mais recentes? Não andaremos a ser manipulados nas
discussões sobre estas matérias, enquanto sociedades e culturas são aniquiladas
pela insensibilidade de uns para com os outros?
* «É
contrário à dignidade humana fazer sofrer inutilmente os animais e desprezar as
suas vidas. É igualmente indigno gastar com eles somas que deveriam,
prioritariamente, aliviar a miséria dos homens. Pode-se amar os animais, mas
não seria razoável desviar para eles o afeto só devido às pessoas» – Catecismo
da Igreja Católica, n.º 2418.
Talvez
nos falte equilíbrio e das inconstâncias dos humanos vemos que os animais
também sofrem, se bem que estes tenham, nalguns casos, sensibilidade mais refinada
do que muitos dos humanos, que se vão tornando mais materialistas à medida em
que se consideram sabedores de algo que lhes escapa: a comunhão entre toda a
natureza como rosto da beleza de Deus.
Não será
o cãozinho pela trela um dos símbolos do consumismo desumanizado…mais
recorrente?
António Sílvio Couto
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