Dá a
impressão que estes fatores se tornaram arbitrários e vieram confundir-se
mutuamente. Assim a longevidade atirou a causa da natalidade para um campo de
‘inverno demográfico’, pois viver mais tempo não tem vindo a significar maior
opção pela vida, antes pelo contrário, parece que o prolongamento dos anos de
vida tornaram as pessoas mais egoístas e centradas em si mesmas…
Diante
desta espécie de paradoxo dos nossos dias será preciso cuidar dum discernimento
onde sejamos capazes de saber entender as causas desta quase-conflitualidade de
interesses e, por conseguinte, andando em busca das consequências agora e no
futuro próximo.
= O que é o discernimento?
Diz o
Papa Francisco na sua mais recente exortação apostólica – ‘Alegria e exultai’ –
(n.º 166): «Como é possível saber se algo vem do Espírito Santo ou se deriva do
espírito do mundo e do espírito maligno? A única forma é o discernimento. Este não requer apenas uma boa
capacidade de raciocinar e sentido comum, é também um dom que é preciso pedir.
Se o pedirmos com confiança ao Espírito Santo e, ao mesmo tempo, nos
esforçarmos por cultivá-lo com a oração, a reflexão, a leitura e o bom
conselho, poderemos certamente crescer nesta capacidade espiritual».
- Que lições
podemos e devemos colher desta quase-definição de discernimento?
- Como
seremos capazes de inserir, na nossa vida cristã (teórica ou na práxis), eixos
de reflexão sobre longevidade e natalidade?
- Será
que os cristãos/católicos destoam, positivamente, da normalidade da população
pelo entendimento e vivência que têm da longevidade e da natalidade?
- Não
andaremos a fazer zapping sobre vários assuntos, sem nos determos na solução
dos problemas de forma mais correta e adequada?
- À boa
maneira da mentalidade do nosso tempo não nos moveremos mais em campos virtuais
do que em terrenos de compromisso e de solução das questões essenciais da vida?
- Não
faremos do secundário (urgente) o essencial e deste o menos interessante?
As
pessoas passaram – quase sem nos darmos conta, cada um que o diga de si mesmo!
– a viver mais tempo (anos, com relativa saúde, com condições de qualidade) e
isso criou novas expetativas. À boa maneira duma frase dos salmos da Bíblia não
morrer centenário tem vindo a ser normal. No mínimo não chegar à barreira dos
oitenta anos parece uma exceção, coisa que há cinquenta anos era considerado o
contrário. Fruto de muitas condicionantes, esta longevidade veio trazer outros
problemas, desde o âmbito familiar até a dimensão do estado, sem esquecermos as
implicações sociais, como as reformas, a assistência na saúde e tantas outras
questões que ainda estão a ser enquadradas no comportamento geral.
Poder-se-á
considerar que esta seleção dos mais capazes foi alicerçada numa longa e árdua
colheita semeada no tempo da segunda guerra mundial e que talvez isso não
signifique que os que daí nasceram possam dar os mesmos frutos. Gente provada
na dificuldade sobreviveu à custa de muitos sacrifícios e provações. Ora, os
nascidos da paz nestes setenta anos sem guerras na Europa poderão não ser da
mesma jaez nem com resultados tão benéficos. Isso mesmo se pode, desde já
detetar, nos filhos e netos desses ‘filhos da guerra’: a opção pela natalidade
caiu abruptamente, logo a seleção não é feita pela qualidade de resistência,
mas por acomodação à não-existência. Por seu turno, a difusão das vacinas, que
fizeram com que muitos fossem furtados à morte precoce, agora fazem viver
muitos dos contemporâneos numa quase-dependência da medicação, gerando assim
frutos de laboratório e não pessoas crivadas – passadas pelo crivo – pelas
dificuldades da vida, vencendo-as.
De algum
modo longevidade e natalidade podiam e deviam ser dois polos do desenvolvimento
do nosso tempo, no entanto, se não forem bem equilibrados poderão ser duas
vertentes sociais, culturais e éticas que se podem anular, se não houver quem
ajude a fazer a correta conjugação: não haverá longevidade se não acontecer
natalidade. Esta será sempre o ponto de partida para aquela, tendo em conta os
cuidados, as prevenções e mesmo as opções pela vida saudável, equilibrada e
harmoniosa… seja qual for a etapa!
António Sílvio Couto
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