O ainda
presidente da Venezuela, na linha do seu antecessor, apresenta-se normalmente
vestido com roupa de cor vermelha/encarnada, numa simbologia ideológica
marcante…tal como noutras paragens e com intérpretes diferentes.
Nota-se
no estertor dum regime em grave crise, que algo corre mal num país que já foi
rico e que atraiu milhares de portugueses, que, por estes dias, vão fugindo em
regresso à mãe pátria, alguns sem nem falarem a língua de seus antepassados. Os
que conseguem escapar dizem que falta de tudo – desde a alimentação até aos
cuidados de saúde, passando pelo emprego e a paz social – lá onde o petróleo
criou riqueza…até ao tempo em que foi nacionalizado e colocado ao serviço do
poder popular… onde os apaniguados se vestem também com roupas de cor idêntica
à do chefe.
Caído o
sistema marxista nas paragens da Europa, simbolizado com a queda do ‘muro em
Berlim’, em 1989, muito do que se propagandeava foi posto a nu dos critérios
culturais e humanos de tal regime. Como se possa entender que agora ainda haja
quem se sirva de tal ideologia para conduzir povos e nações, sabendo os
resultados verificados? Não se viu, vezes sem conta, que a igualdade pretendida
só serve uns tantos – nalguns casos chamam-lhe de ‘nomenclatura’ ou dão outra
designação mais fascinante – deixando o verdadeiro povo – esse que não pensa
como eles – à míngua do essencial?
Não
deixa de ser sintomático e provocante que ainda haja propostas de querer fazer
nas autarquias e em espaços de maior proximidade aquilo que – ideológica e
politicamente – se viu que faliu pela raiz, deixando traumas em pessoas e em
sociedades… O silêncio cúmplice – e nalguns casos a assunção pública de defesa
– de certos dirigentes é questionante para com a seriedade das suas propostas e
até os meios usados para atingirem seus fins… Como já se viu, quando são
colocadas certas premissas, as conclusões serão idênticas às já tiradas. Por
isso, é muito pouco recomendável à inteligência alheia quem assim trata os seus
apoiantes… tenham a instrução que tiverem.
= De
facto, o que está a acontecer na Venezuela deverá ser para todos os que
acreditam na expressão da vontade popular pelo voto democrático, um sério
momento de reflexão sobre a consonância entre aquilo que se diz e o que se faz,
pois não podemos servir-nos do voto para atingirmos os nossos fins e depois
manipularmos os resultados até que consigamos reduzir os adversários à condição
de amesquinhamento.
Por cá,
nota-se de vez em quando, alguns que têm tiques desta ‘democracia de partido
único’, desde que seja o seu, o vencedor. As tentativas – tácitas, subtis,
claras ou subterrâneas – duns tantos sentem-se à distância, pois nem sempre
aceitam a concorrência nem a diversidade de pensamento. Veja-se a (pretensa)
força do coletivo, que mais não é do que aniquilar os diferentes, seja qual for
o método… Onde estão os que não pensam como a maioria? Onde estão os que
discordam, mesmo de forma livre? Onde está a liberdade para poder exprimir a
discordância? `
À medida
do que é suscetível de perceber há por aí muitas purgas e limpezas, por forma a
que se dê a imagem da tal força do coletivo nem sempre democrático, por
não-respeitador dos que não alinham na mesma corrente…
= Num
tempo tão propagandeante da democracia, vemos imensos sinais de ditadura, desde
os mais capciosos até aos mais rocambolescos. Muitos dos ‘democratas’ são-no
por trituração dos adversários. Muitos dos que falam de liberdade para si nem
sempre a conjugam para com os outros. Muitos dos que defendem o direito de
pensamento livre nem sempre dão tal oportunidade aos que pensam diferentemente.
Fique
claro: não acredito em qualquer regime ou forma de governo que tente coartar a
dimensão espiritual da pessoa nem que faça reduzir a condição humana só ao
bem-estar materialista. Este é uma etapa e nunca pode ser um fim, pois seria
condicionar a pessoa à sua fase meramente animal, mesmo que bem instalada e
regalada sem atender, normalmente, aos outros.
Se
Venezuela está em crise tão profunda não foi por falta de meios económicos,
pois era um dos maiores produtores de petróleo. A crise é, sobretudo, cultural
e humana, de respeito e de sensibilidade aos outros…
António Sílvio Couto
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