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segunda-feira, 21 de agosto de 2017

Aprender a benzer-se!


Dizia-me um padre já bastante idoso – morreu nonagenário e foi pároco até depois dos oitenta anos numa das paróquias mais extensas da diocese de Setúbal – que se queria saber diante de quem estava, numa assembleia reunida em razão dalgum sacramento ou sacramental, bastava-lhe estar atento à forma como as pessoas se benziam, logo no início… aquilo era o termómetro.

Recorro com alguma subtileza a este critério ‘pastoral’, sobretudo quando estou na presença de pessoas que vem celebrar o batismo e isso me leva a perceber, desde logo, que o melhor a fazer é explicar – com gestos e observações simples – o significado do benzer-se e qual a relação com o batismo.

Disso passarei a deixar por escrito esta breve condução de algo tão básico quanto essencial… Dar-me-ei por satisfeito se mais aqueles aprenderem correta e significativamente a correlação do benzer-se assumido com o batismo comprometido, num verdadeiro ato de fé pessoal e comunitário. 

= Desde logo reparemos no gesto que faz uso do sinal em forma de cruz, enquanto traçado desde a cabeça até aos ombros, passando por sobre o tronco: a cruz – o cruzamento entre o que vem do alto e a condição horizontal, isto é, o mistério da encarnação, Jesus o Verbo encarnado e redentor, e a nossa condição fraterna e em caridade, que nos leva uns aos outros a estarmos em sintonia de vivências. Quantas vezes vemos serem feitas tais garatujas que ficamos sem saber em que é que cada um acredita ou qual o objetivo de tais (quase) simulações! Ao vermos certos jogadores de futebol a fazerem tais gestos fico com a sensação de que algo lhes vai na alma, mas que não se exprime lá muito bem na representação! Por vezes a assunção duma certa fé cristã pode tornar-se boa oportunidade de evangelização, mas devia ser bem feita e com sentido apropriado! 

= Usamos, ao benzer-nos, as mesmas palavras que são proferidas no ato de batizar. Por isso, sempre que dizemos, rezando: ‘em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo’, estamos a ir à fonte batismal, naquilo que isto tem de essencial e refontalizador, tanto da nossa fé quanto da nossa condição de vida cristã. Algumas vezes, quando as crianças já são um tanto capazes de entender, perguntamos-lhes se já sabem comer com os utensílios adequados (faca, garfo, colher, etc.) e quem foi que lhes ensinou a manusear tais instrumentos… ao que respondem, normalmente, que foram os pais… assim, lhes dizemos que estes devem ensiná-los a benzer-se, ao menos, de manhã e à noite… 

Devemos atender que na invocação das Pessoas da Santíssima Trindade não as estamos a enumerar, colocando a vírgula entre a primeira e a segunda, mas a coordenar, isto é, dizemos entre as três pessoas divinas ‘e’, numa conjugação de singularidade entre ‘o Pai e o Filho e o Espírito Santo’, fazendo-o numa atitude de invocação e de evocação, isto é, de invocação sobre nós mesmos das Pessoas trinitárias e de evocação desse momento do batismo em que tais palavras foram proferidas especificamente pela primeira vez sobre cada um de nós. 

= Vejamos os gestos e a sua coordenação com as Pessoas divinas, envolvendo três das grandes componentes (faculdades) da pessoa humana – pensar, querer e amar:

* ‘em nome do Pai’ e tocamos com a mão direita sobre a cabeça – com isso estamos a entregar e a submeter a nossa inteligência a Deus que é Pai: n’Ele, por Ele e com Ele queremos que tudo quanto pensamos – agora, no passado ou no futuro – possa ser de Deus e para Deus. Quantos pensamentos, memórias e desejos podem e devem ser entregues a Deus de cuja paternidade somos e vivemos como filhos…

* ‘e do Filho’ e fazemos descer a mão por sobre o tronco até à altura do umbigo, envolvendo exteriormente todo o aparelho digestivo, com os órgãos que lhe estão adstritos, numa ligação ao sistema volitivo mais alargado e com incidência nalguns dos reguladores do nosso corpo, como fígado, rins… Tal como Jesus, o Filho, fez sempre a vontade do Pai, assim cada um de nós quer fazer a vontade de Deus, hoje.

* ‘e do Espírito Santo’, traçando dum para outro dos ombros o sinal horizontal da cruz, passando por sobre o coração, colocamo-nos na entrega ao Deus de amor, manifestado no e pelo Espírito Santo, para vivermos o amor de Deus… de forma simples e comprometida.  

 

António Sílvio Couto



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