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quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Futebol: escravatura de luxo…


Como de costume a época de transferência no mundo do futebol – por ocasião do verão e mais tarde no inverno – fervilha. Cada ano as verbas envolvidas crescem em quantidade e em escândalo. Se, no ano passado, pagar cem milhões de euros por um jogador deixou todos admirados, que dizer dos mais de duzentos milhões gastos com um futebolista que sai de Barcelona e vai para Paris?

Diga-se desde já que esta escravatura – compra e venda de pessoas como se fossem coisas e, nalgumas situações, um tanto animais – se torna abjeta, incoerente e vergonhosa. Para quem considerava que os escravos eram mercadoria de quem os donos dispunham a bel-prazer, que dizer de tudo isto que envolve pessoas vendidas/compradas em razão duns certos malabarismos com a bola e na destreza dos pés? Esta mercadoria humana perdeu os direitos a que tem o resto dos que não jogam à bola? Até onde irá subir o descalabro ou cair a soberba?

De facto, a ‘indústria do futebol’ – ou será que se tornou mais comércio? – envolve muito dinheiro, faz carburar muitos interesses e catalisa intuitos de multidões manipuladas e manipuladoras. Quando o dinheiro se torna o motor da vida de tanta gente, quase se percebe que o jogador de futebol se tornou mesmo coisa à qual se presta atenção enquanto rende e que se torna descartável quando as faculdades artísticas enfraquecem… na maioria dos casos. 

= Tentemos ver os números, tendo em conta outros artistas não tão bem pagos, embora muito melhores. Diz-se que Neymar, pela venda anunciada, vale 47 vezes Maradona. Quem não se recorda do ‘espetáculo’ que foi de contestação a Figo, quando ele trocou Barcelona por Madrid e o apelidaram de ‘pesetero’, isto é, cultivador de pesetas, pessoa que deserta para o inimigo. Que dizer de tantos outros vendidos e renegados? O dinheiro e a (dita) profissão falam mais alto e mais fundo! Haverá honra e honestidade em tantos dos casos conhecidos?

Na lista dos jogadores mais caros encontramos: Neymar (222 milhões de euros), Pogba (105 m), Bale (100 m), Ronaldo (94 m) e Higuain (90 m)… e daí para baixo vemos um role de vedetas em continua ebulição, trocando-se, sendo transacionadas como se fossem mercadoria em feira de vaidades e com muita esperteza à mistura… por aqui deambulam empresários, presidentes de clubes, fornecedores de material desportivo, merchandising e claques, estádios e centros de treino, canais televisivos e jornais, sócios e adeptos… e tudo o resto que gravita em volta deste mundo que, por ser tão complexo, pode servir para lavar dinheiro, inventar e vencer eleições… e, sobretudo, entreter, manipular e enganar o povo, que, enquanto vive essas coisas, não vê nem está atento a quem o governa mais ou menos de forma ganhadora… 

= Nos últimos tempos temos vindo a ser confrontados com problemas de cariz tributário por parte dos jogadores e de seus agentes. Uns parece que têm fugido aos impostos, não do seu trabalho direto no campo desportivo, mas tendo em conta outras áreas por onde vão ganhando uns cobres, tanto ou maiores do que os auferidos na disputa da bola com os adversários… tais como: uso de imagem, serviços de publicidade… promoções, campanhas e adereços de comercialização.

Pelos valores envolvidos – dá a impressão que em certos países tentam captar sobretudo os estrangeiros mais famosos e rentáveis – podemos perceber que o pagamento das multas será um das formas de angariar fundos para as finanças e de dar a impressão que poucos escapam ao controlo…Não deixa de ser preocupante o circo montado para dar cobertura aos faltosos, pois uma simples inquirição transforma-se num espetáculo mediático sem pejo nem critério… Por aqui se vê a força do submundo do futebol, distraindo do essencial e concentrando as atenções na espuma doutros factos humanos e sociais. 

= Mesmo de forma despretensiosa questionamos: onde está em tudo isto o desporto? A quem interessa polarizar as atenções no luxo que gera e não no lixo que fomenta? Porque temos de ser intoxicados com este produto informativo, quando há tantas outras questões a necessitarem de reflexão?

Daqui a alguns anos seremos condenados – como fizeram outros para com a escravatura passada – pelo silêncio cúmplice com que temos tratado este assunto… tão rendoso economicamente!  

 

António Sílvio Couto





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