Por
decisão do atual governo, foi revertida a suspensão do feriado do 1 de novembro
– à semelhança de outros três (1) – criando
novamente a regalia de, por ocasião de uma vivência católica, todos usufruem de
um dia sem trabalho, mesmo que não o usem para a finalidade com que foi criado…
Embora
não seja diretamente voltado para a veneração dos mortos – isso acontece na
liturgia católica no dia seguinte (dia 2) em que se recordam os fiéis defuntos
– o feriado do primeiro dia de novembro é usado em muitas circunstâncias –
sociais e religiosas, mas também afetivas e económicas – para cuidar dos
espaços de relação com os mortos/defuntos.
Embora
tenha sido reposto o feriado, este pode continuar a ser mais um dia de
não-trabalho do que um dia feriado para ser santificado com a veneração de
Todos os Santos. Atendendo às circunstâncias humanas e históricas, este feriado
é vivido nalgumas localidades à borda do rio Tejo e não só como momento
celebrativo comunitário para agradecer a Deus, a Nossa Senhora e aos Santos a
proteção recebida por ocasião do terramoto de 1755…
= Se
atendermos a esta data poderemos interrogar-nos sobre a razão para que tenhamos
vindo a assistir à conexão entre este feriado e a promoção do Halloween. Também
aqui teremos de recorrer à história dos povos e do cristianismo em particular
para encontramos razões e enquadramento desta ligação.
Há, no
entanto, questões que se podem colocar: estaremos a viver um processo de
neopaganismo, relegando para plano secundário o que antes era motivo de fé cristã
mais ou menos sociológica? Ao entrarmos na promoção e na vivência – como
acontece em tantas jardins-de-infância e escolas, coletividades, etc. – do
Halloween não estaremos a entrar numa lógica do mal, prestando-lhe culto e
fazendo-o presente na sociedade? Não estaremos a viver mais uma paganização em
contraste com a desacreditação do cristianismo e do catolicismo em particular?
Como se pode conciliar o ‘pão por Deus’ com as travessuras do Halloween? Não
será que estas coisas do Halloween são menos infantis do que nos querem fazer
entender?
=
Surgida no contexto da religião celta, a vivência – para alguns já quase se
torna uma celebração – do Halloween pretendia prestar culto ao deus dos mortos,
fazendo rituais de fogo e de memória para com os que já morreram, invocando-os
e até deixando-se guiar por eles.
Nesta
como noutras festas de índole religiosa não-cristã, a Igreja católica tentou,
já nos séculos VII e VIII, ‘batizar’ primeiro o panteão romano, tornando-o um
templo cristão e depois dedicando a capela de Todos os santos, na Basílica de
São Pedro, em Roma, no dia 1 de novembro… Mais tarde, século IX, esta festa de
Todos os Santos foi estendida a toda a Igreja.
=
Atendendo à conexão entre a veneração de Todos os Santos, com os resquícios do
culto dos mortos na cultura celta, entretanto cristianizada, vemos que a
comemoração dos Fiéis Defuntos se tornou fácil de conjugar: num dia celebrámos
os Santos e no outro os que já morreram ‘marcados com o sinal da fé e dormem
agora o sono da paz’, como se reza no cânone romano da missa.
Se
tivermos em conta a evolução da privatização da morte e de quanto a ela está
ligado, tornou-se um tanto razoável ver que, em muitos lugares e contextos
sociais do nosso país, vamos assistindo a um certo desprezo pelos que morreram…
mesmo quando os falecidos eram ainda praticantes da fé cristã. Por contraste
com certos meios onde a civilização do cemitério ganha foro de afirmação social
– veja-se a cultura das sepulturas bem arranjadas e cuidadas… com mausoléus e
jazigos – vemos crescer algum afastamento da atenção aos defuntos/mortos… nem
sendo lembrados nas datas de falecimento ou com o recurso ao sufrágio
religioso/católico.
Talvez
precisemos de refletir cobre o sentido da nossa vida e o feriado (dia santo) de
1 de novembro pode e deve ser aproveitado para sermos gratos para com quem
partiu e de termos um tempo de reflexão sobre nós mesmos e quanto ao sentido da
nossa vida… tão rápida, apressada e talvez um tanto fútil!
(1). Se
repararmos no que se refere ao dito feriado de 1 de novembro – Todos os santos
– só incluiu, desde 2013, um dia em tempo de trabalho efetivo…
António
Sílvio Couto
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