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quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Generosidade no mundo


Segundo uma lista elaborada por um organismo americano e publicada por uma revista de grande tiragem também naquela origem, Portugal ocupa o lugar 90.º dos países mais generosos do mundo. O primeiro lugar é ocupado pela Birmânia… e dos cento quarenta países analisados a China está em último lugar.

Que significa ser considerado ‘generoso’? Os critérios para este conceito de generoso tem a ver com a prática de doações para obras de caridade, o participar em voluntariado e em ajudar pessoas estranhas…

Como explicação de a Birmânia estar à testa desta lista tem a ver com uma espécie de cultura e de práticas religiosas onde uma larga percentagem de pessoas (quase cem por cento) doa algo em favor dos outros… sobretudo dos monges budistas.

A lista dos dez países do mundo mais generosos é a seguinte: Birmânia, EUA, Austrália, Nova Zelândia, Sri Lanka, Canadá, Indonésia, Reino Unido, Irlanda e Emirados Árabes Unidos… Moçambique (67.º), Brasil (68.º)… 

= Num tempo em que, nitidamente, as pessoas pensam mais em si mesmas e na ‘sua’ felicidade do que naquilo que podem realizar em favor dos outros, torna-se útil e essencial fazermos uma espécie de exame de consciência sobre o nosso trato com os outros e sobre a forma como vivemos a doação em favor deles.

Não é novidade para ninguém o modo que, de tantas e tão variadas formas, podemos fazer dos outros algo (muito menos do que alguém) que nos serve e enquanto nos serve. A isto vem chamando o Papa Francisco a ‘cultura do descartável’, isto é, quando os outros já não nos são úteis deitámos-lhos fora ou colocámo-los numa espécie de reduto em que já não nos incomodam nem perturbam…

Se isto acontece com as pessoas o mesmo fazem os países uns para com os outros, criando novos excluídos e emergentes pobres… ora por ação, ora por inação e até por omissão. Com efeito, os países do hemisfério norte não são dos mais generosos – na lista supracitada mais de metade dos ‘dez mais’ são do hemisfério sul, incluindo mesmo a confrangedora 90.ª posição portuguesa… por contraste com países de língua portuguesa bem melhor posicionados! 

= Se atendermos aos itens – doação em caridade, voluntariado, ajuda a estranhos – poderemos um tanto melhor aferir dalgumas das razões que nos podem levar a encontrar as causas desta não-generosidade e as não nos deixarmos confundir pelas consequências mais ou menos percetíveis.

A retração da generosidade revela, antes de mais, uma certa desconfiança de cada um sobre si mesmo o que se repercute no comportamento para com os outros. Por vezes deixamos que se crie em nós mesmos uma tendência a fechar-nos à doação – seja em caridade, seja em solidariedade ou mesmo em fraternidade – com a desculpa de não sabemos o que será amanhã, sem pensarmos antes na partilha e nessa outra forma de dar hoje aos outros, pois amanhã poderemos ser nós a precisar e gostaríamos de receber…

Tudo isto é grave quando se estende à psicologia dos povos e influência o comportamento coletivo… mais ou menos assumido ou até tolerado.

Por outro lado, tem vindo a crescer a sensação de que o voluntariado está em decrescendo, gerando-se quase a perceção de que o voluntariado se tem vindo a tornar numa ‘profissão’ ou numa ocupação de tempo para quem não tem nada para fazer, em vez de ser purificado e vivido nesse serviço aos outros mais por eles do que por nós mesmos. Também aqui parece que o centro não são os outros e as suas necessidades… 

= Neste imenso mundo de interdependências – mesmo na vulnerabilidade – torna-se urgente que nós, portugueses, nos questionemos sobre tão baixa participação em matéria de generosidade, até porque nós, como povo e nação, sempre recebemos muito da generosidade doutros povos e nações, sobretudo nas horas de menos boa condução dos nossos destinos políticos e económicos. Que seria de nós, hoje, sem a generosidade da União Europeia nestes trinta anos de adesão formal à CEE? Queria seria de nós, como povo emigrado, se outros povos e nações não tivessem aberto as fronteiras às vagas de saídos daqui em busca de melhores condições de vida? Talvez nos vá faltando memória e gratidão!...      

 

António Sílvio Couto 

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