Segundo
uma lista elaborada por um organismo americano e publicada por uma revista de
grande tiragem também naquela origem, Portugal ocupa o lugar 90.º dos países mais
generosos do mundo. O primeiro lugar é ocupado pela Birmânia… e dos cento
quarenta países analisados a China está em último lugar.
Que
significa ser considerado ‘generoso’? Os critérios para este conceito de
generoso tem a ver com a prática de doações para obras de caridade, o
participar em voluntariado e em ajudar pessoas estranhas…
Como
explicação de a Birmânia estar à testa desta lista tem a ver com uma espécie de
cultura e de práticas religiosas onde uma larga percentagem de pessoas (quase
cem por cento) doa algo em favor dos outros… sobretudo dos monges budistas.
A lista
dos dez países do mundo mais generosos é a seguinte: Birmânia, EUA, Austrália,
Nova Zelândia, Sri Lanka, Canadá, Indonésia, Reino Unido, Irlanda e Emirados
Árabes Unidos… Moçambique (67.º), Brasil (68.º)…
= Num
tempo em que, nitidamente, as pessoas pensam mais em si mesmas e na ‘sua’
felicidade do que naquilo que podem realizar em favor dos outros, torna-se útil
e essencial fazermos uma espécie de exame de consciência sobre o nosso trato
com os outros e sobre a forma como vivemos a doação em favor deles.
Não é novidade
para ninguém o modo que, de tantas e tão variadas formas, podemos fazer dos
outros algo (muito menos do que alguém) que nos serve e enquanto nos serve. A
isto vem chamando o Papa Francisco a ‘cultura do descartável’, isto é, quando
os outros já não nos são úteis deitámos-lhos fora ou colocámo-los numa espécie
de reduto em que já não nos incomodam nem perturbam…
Se isto
acontece com as pessoas o mesmo fazem os países uns para com os outros, criando
novos excluídos e emergentes pobres… ora por ação, ora por inação e até por
omissão. Com efeito, os países do hemisfério norte não são dos mais generosos –
na lista supracitada mais de metade dos ‘dez mais’ são do hemisfério sul,
incluindo mesmo a confrangedora 90.ª posição portuguesa… por contraste com
países de língua portuguesa bem melhor posicionados!
= Se
atendermos aos itens – doação em caridade, voluntariado, ajuda a estranhos –
poderemos um tanto melhor aferir dalgumas das razões que nos podem levar a
encontrar as causas desta não-generosidade e as não nos deixarmos confundir
pelas consequências mais ou menos percetíveis.
A
retração da generosidade revela, antes de mais, uma certa desconfiança de cada
um sobre si mesmo o que se repercute no comportamento para com os outros. Por
vezes deixamos que se crie em nós mesmos uma tendência a fechar-nos à doação –
seja em caridade, seja em solidariedade ou mesmo em fraternidade – com a
desculpa de não sabemos o que será amanhã, sem pensarmos antes na partilha e
nessa outra forma de dar hoje aos outros, pois amanhã poderemos ser nós a
precisar e gostaríamos de receber…
Tudo
isto é grave quando se estende à psicologia dos povos e influência o
comportamento coletivo… mais ou menos assumido ou até tolerado.
Por
outro lado, tem vindo a crescer a sensação de que o voluntariado está em decrescendo,
gerando-se quase a perceção de que o voluntariado se tem vindo a tornar numa
‘profissão’ ou numa ocupação de tempo para quem não tem nada para fazer, em vez
de ser purificado e vivido nesse serviço aos outros mais por eles do que por
nós mesmos. Também aqui parece que o centro não são os outros e as suas
necessidades…
= Neste
imenso mundo de interdependências – mesmo na vulnerabilidade – torna-se urgente
que nós, portugueses, nos questionemos sobre tão baixa participação em matéria
de generosidade, até porque nós, como povo e nação, sempre recebemos muito da
generosidade doutros povos e nações, sobretudo nas horas de menos boa condução
dos nossos destinos políticos e económicos. Que seria de nós, hoje, sem a
generosidade da União Europeia nestes trinta anos de adesão formal à CEE?
Queria seria de nós, como povo emigrado, se outros povos e nações não tivessem
aberto as fronteiras às vagas de saídos daqui em busca de melhores condições de
vida? Talvez nos vá faltando memória e gratidão!...
António Sílvio Couto
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