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terça-feira, 19 de maio de 2020

Confinamento: intervenientes…antes, durante e depois


Uma das vertentes mais singulares da complexa situação de confinamento que temos estado a viver, é a dos vários intervenientes…em todo este processo: pessoas singulares e coletivas, desde as autoridades (políticas e governativas, de saúde e de segurança, de vigilância e de observação/notícias, no sentido religioso ou na envolvência social, económica ou mesmo cultural) até aos cidadãos (os atingidos pela doença – infetados, internados, recuperados e falecidos – e o resto que viveu este confinamento), passando pelas diversas etapas psicológicas de perplexidade, de medo, de ansiedade, de angústia, de reflexão…até à tentativa de descompressão e de reaprendizagem em viver com ‘algo’ – dizem que é vírus com diversas mutações – que não conhecemos e nos faz humilhar nas nossas tão altivas convicções.

Embora este seja o enunciado de um texto que já foi publicado, vamos agora esmiuçar os diversos itens:

* Autoridades (políticas, governativas, de saúde, de segurança ou de vigilância) que tiveram de provar a qualidade, a competência e a maior ou a menor assertividade das decisões. Com efeito, o processo de comunicação de quem, atualmente, ocupa o poder teve um método um tanto errático, mas minimamente camuflado ou sob a cobertura dos inquisidores ditos externos, a comunicação social, pois, em muitas situações quase se notava que estava vendida a quem lhe fornecia os dados cozinhados, apresentados e mesmo mastigado e era só reproduzir o que vinha da agência governamental…sem espinhas nem ossos. O menu da ‘hora de almoço’ deste itinerário tinha um fidedigno do guião: se um dia era tomada uma decisão, ainda mal articulada, na manhã seguinte surgia um decreto-lei, que rapidamente era esclarecido ou contraditado por um diploma mais acertado e assertivo para a questão em presença…

Momentos houve em que a confusão era tal que o melhor foi retrair os intervenientes para que o espetáculo não fosse mais degradante. Quem teve de dar a cara diariamente no briffing da saúde, por volta do meio-dia, foi aprendendo que notícias graves e lutuosas não se apresentam com sorrisinhos baratos e que até podem ser entendidos como ofensivos da dor da perda… A arte de comunicação foi corrigindo defeitos de simpatia sem nexo nem articulação. Em tantos momentos tive a sensação de estar a ser enganado não só no conteúdo das comunicações como naquilo que de subterrâneo emergia. Uma estranha perceção de que muito daquilo que nos era comunicado era uma verdadeira ‘fake news’ (falsa notícia) e o tempo se encarregará de o confirmar!

A nota de leviandade – que é muito mais do que leveza – com que certas figuras se apresentavam diante dos outros cidadãos deixa muito a desejar na capacidade de conduzir os destinos da nação, pois esta mais parece um feudo de uns iluminados que a pátria de todos… Muitos dos atores deste cenário são artistas de classe secundária, bafejados pelas circunstâncias da incapacidade dos opositores.

* Do lado dos cidadãos, ficou a impressão de que nem sempre houve verdade nos números, sobre a avaliação do problema: quantos foram os atingidos pela doença – infetados, internados, recuperados e falecidos – sem esquecer o resto que viveu este confinamento? Pequenos grandes dados nos devem fazer refletir: a forma como foram vividos o ’25 de abril’ e o primeiro de maio’ são dignos de uma democracia que trata todos de forma igual ou há – como na linguagem orwelliana – porcos que são mais iguais do que os outros…embora, aparentemente, se sirvam do mesmo espaço de alimentação. Veja-se ainda a confusão de usar ou não máscara no trato com os outros, quanto mais a perplexidade em entender quem pode ou não ser transmissor do vírus, se os mais ricos ou se ele atingia, sobretudo, os pobres. Os meios técnicos e humanos envolvidos no combate à pandemia dá a impressão que ficaram aquém do que seria necessário, embora tenha parecido suficiente…na medida em que os avaliadores são os mesmos que os promotores!

Houve coisas sérias tratadas a brincar e outras mais ligeiras que foram empoladas como se fossem muito importantes. Repare-se no (dito) fenómeno do futebol, que balanceou entre retomar o campeonato principal e ser dado como acabado, enquanto outros de escalões inferiores foram encerrados à la carte!

Os últimos dias foram dignos de análise para compreendermos o nível cultural/educacional da população portuguesa: a invasão das praias, transgredindo regras e provocando as entidades fiscalizadoras. Mais uma vez se notou que uma boa parte não sabe viver em harmonia cívica… Pasme-se, agora: o governo, mais uma vez por diploma, fez a vontade aos transgressores e já deixa todos irem à praia. O sistema sanitário higienista aguentará as benesses populistas dos senhores da capital?

 

António Sílvio Couto

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