Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Caixa’s de pandora!


Este ano de 2016 – prestes a terminar – trouxe à sociedade portuguesa algumas apreensões sobre a designada CGD (caixa geral de depósitos), tanto na matéria da sua existência – depósitos deixados ou resposta aos pedidos solicitados, como ainda no resultado das economias – bem como na forma de gestão – mais errática do que de confiança – sobre o presente e, sobretudo, o futuro.

Atendendo ao setor bancário foi este caso o culminar de situações que envolveram outros bancos, com os custos inerentes na economia e nas finanças (impostos) dos portugueses. Quase poderíamos considerar que cada governo – seja qual for a cor partidária – neste século XXI (isto é, em dezasseis anos) teve o seu ‘banco de estimação’ com a necessidade de resolver os casos, dado que estamos vinculados à União Europeia e – até ver – não se brinca com coisas sérias. 

Atendendo, porém, a que se pode apelidar a CGD de banco nacional, tudo e o resto que ali aconteça se pode tornar uma caixa de pandora. Esclarecendo esta expressão ‘caixa de pandora’. Caixa de pandora é um artefacto da mitologia grega em que Pandora, a primeira mulher criada por Zeus, que era muito curiosa, foi-lhe dada uma caixa em que estavam todos os males do mundo… na sua curiosidade Pandora caiu na tentação para ver o que havia na caixa… e dela saíram todos os males, que se espalharam pela terra! 

= Efetivamente o nosso sistema bancário é uma autêntica ‘caixa de pandora’, pois, quando se começa a falar duma instituição, bem depressa chegam em catadupa réplicas do terramoto com cada vez maior intensidade. Por isso, o que, neste último ano, se tem verificado com a CGD está ainda no princípio dos efeitos sobre a economia nacional, as precárias poupanças dos clientes e até sobre a credibilidade do sistema económico-financeiro.

Porque será que tem havido tanta nebulosidade no trato com os gestores, por agora demissionários? Porque houve o arrastar de clareza e/ou esclarecimento sobre pretensões e promessas aos indigitados? Porque se gastou tanto tempo e energias em esconder/descobrir o que, de verdade, se passou? Porque se contesta tão ardilosamente o setor privado, mas depois se vai recrutar neste quem possa gerir no público? 

= Até ver todos são sérios desde que não se prove o contrário. Por isso, este fenómeno CGD é paradigmático do modo como muitas das questões são tratadas em Portugal. O problema arrasta-se há demasiado tempo para que não deixe sequelas de desacreditação no país. Não se compreende como pessoas que deviam ser honestas e leais se deixam enredar por questiúnculas de nível menos transparente…

Neste processo como noutras matérias falar em excesso da questão só agrava (ou tem vindo a agravar) o problema e faz com se possam misturar interesses pessoais com tarefas institucionais. Precisamos de criar novamente um escol de pessoas que sejam capazes de viver em missão de serviço aos outros e não tanto – como parece que se pode descortinar – que se valham dos lugares para (aparentemente) enriquecerem e se vangloriarem no presente e para o futuro.  

= Todo este problema dever-nos-ia proporcionar – a todos – uma reflexão sobre o nosso modo de lidarmos com as coisas materiais e o dinheiro em particular, pois muito daquilo que fomos percebendo se prende com a não-aceitação clara e legal de apresentar a declaração de rendimentos, por parte dos gestores demissionários e um certo afã para não dar parte de derrotado, para que se cumpra a lei, de quem tem (teve) a tutela do assunto ao nível superior em governação. Dá a impressão que alguém não estava preparado para gerir este assunto tão efervescente!

Agora que entramos em fase de natal-consumista poderemos tirar uns segundos de tempo para nos confrontarmos com as seduções do momento: até onde irá a ousadia em lutar contra as tendências que nos têm sido semeadas para que gastemos mais e mais, preenchendo a nossa vida com coisas em vez de nos alimentarmos dos verdadeiros valores humanos e espirituais?

Afinal, como tão sabiamente nos tem dito o Papa Francisco: não consta que a ‘mortalha tenha bolsos’ para levarmos na morte os bens que, entretanto, aferrolhamos!      

 

António Sílvio Couto 




quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Petição (um tanto) provocatória!


Surgiu nestes dias (3.ª feira, dia 22) a notícia duma petição intitulada - «contra a credibilização do milagre de Fátima» - contestando a confirmada visita do Papa Francisco, nos dias 12 e 13 de maio de 2017 ao santuário da Cova de Iria.

Ao consultarmos, via internet, a recetividade da iniciativa percebemos que havia de seiscentos e vinte subscritores, às 24 horas do dia 23 de novembro (4.ª feira)… 

= Os proponentes dizem-se ‘legitimados’  na sua pretensão, embora recorram a chavões mais ou menos já ditos e propagados por alguns dos intervenientes – chegando a autocitarem em ‘obras’ suas já publicadas – e com isso tentam dar abrangência a algo que poderá inflamar outras correntes e tendências mais ou menos adormecidas na nossa configuração sociopolítica…

Estes que vieram a público emergem de vários quadrantes do antirreligioso e, particularmente, do anticatólico…embora por lá deambule um (dito) ‘padre’ com trejeitos de rebelde, ancorado num passado volátil e assumidamente anti-Fátima… 

= Antes de tudo temos de saber analisar o ‘fenómeno Fátima’, que confunde alguns cidadãos que não têm afinidade com a possibilidade da fé – talvez nem acreditem em si mesmos – como recurso de vida e fator de conduta existencial. No entanto, não se pode confundir a árvore com a floresta – a árvore é Fátima e a floresta é a Igreja – pois pelos frutos se pode reconhecer a credibilidade da árvore e esta – Fátima – tem dado imensos resultados espirituais, culturais, humanos e até económicos… Estes não podem ser – como pretendem os peticionários – os mais significativos, mas também não podem ser desprezados… Não querer reconhecê-lo será, no mínimo, miopia intelectual e dislexia emocional.  

= Esta petição parece, além de enfermar de múltiplos preconceitos para com aquilo que Fátima representa para Portugal e o mundo em geral, não se limita a atrair – ou será destruir? – a atenção duma certa fação menos cívica e um tanto barulhenta na forma e nos conteúdos, como ainda pretende intitular-se com direitos de contestação eivados de tiques de ignorância e de clichés do tempo da primeira república jacobina e acintosamente a-religiosa…

Já é habitual que, por ocasião do Natal, surjam alguns fait-divers anticristãos...como se a falta de respeito pelas convicções alheias possa ser um título de aglutinação ou de desculpa para não se confrontarem com a dimensão espiritual de toda a pessoa humana… 

= Esta petição poderá ser um dos (primeiros) casos que irão ser intentados ao longo do ano jubilar do centenário das aparições de Nossa Senhora em Fátima. Tudo isto revela uma espécie de labirinto de interesses, que tentam alimentar-se da contestação à mensagem de Fátima, enquanto esta revela e impulsiona todo um processo de regeneração do tecido religioso do mundo ocidental e de Portugal em concreto.

Numa época marcada pelo egoísmo e o sensacionalismo, Fátima consegue catapultar multidões ávidas de sentido para com as agruras do quotidiano e onde cada um seja capaz de viver em abertura à dimensão do divino e àquilo que nos outros nos faz construir a fraternidade a partir de dentro…

Nem todos serão capazes de entender o que Fátima significa na história de Portugal. Temos pena! Mas da não-compreensão à contestação e à ofensa vai algo que devia obrigar certos ‘democratas’ a serem, ao menos, respeitadores para serem igualmente respeitados, pois nada lhes dá o direito de apelidar de ‘embuste’ algo que serve de referência à conversão e ao caminho de fé… de milhões de homens e de mulheres. 

= Não foi a Igreja que impos Fátima, foi Fátima que se impos à Igreja – disse o cardeal Cerejeira. Ora, neste tempo de preparação do centenário das aparições, teremos de estar vigilantes para com vários arietes que tentarão lançar a confusão – saída da sua própria convulsão – aproveitando-se de questões mais ou menos periféricas e de episódios laterais ao essencial. Vigiemos e denunciemos.        

   

António Sílvio Couto



segunda-feira, 21 de novembro de 2016

‘Mau tempo’ ou tempo adequado?


Na apresentação das previsões do tempo atmosférico – sobretudo nesta época do ano – ouvimos, por vezes, a expressão de ‘mau tempo’, referindo-se às condições de chuva, de frio, de vento, de alterações no mar… com descida (mais ou menos acentuada) de temperatura.

Ora, será que, estando nós, no hemisfério norte, entre o outono e o inverno, estas condições de tempo são ‘más’ ou serão, antes as adequadas àquilo que é preciso em cada estação do ano? Não seria, por outro lado, ‘mau tempo’ se tivéssemos, agora, calor e não houvesse chuva? Porque havemos de andar em rotulagens infelizes, só porque a uma certa cultura – do lazer, do bel-prazer e da comodidade – lhe convém que haja só sol e não chuva?  

= Questões de linguagem ou de mentalidade?

Atendendo ao progressivo afastamento das pessoas do ritmo da natureza, vamos sendo influenciados por clichés onde a comunhão com os elementos da natureza nem sempre está articulada e em simbiose.

Essa pretensa ‘cultura urbana’ vai-se esquecendo de quem lhe dá os alimentos e lhe fornece a conjugação com a vida entre os vários componentes sociobiológicos. Não são os ‘serviços’ e as atividades de diversão que põem o pão na mesa nem fazem com que as pessoas tenham harmonia psicológica. Podem fomentar a distração mas não o fornecimento da subsistência…

Soará a praguejar que se possa estar contra o tempo atmosférico que nos é dado. Por muito que se pretenda viver na correria dos nossos interesses mesquinhos e egoístas, as observações sobre o tempo continuarão a ser um tema para quando não se tem (quase) nada de que falar. No entanto, não queiram fazer crer que o ‘mau tempo’ é o culpado pelo mau humor de tantos descontentes da vida… 

= Lições de vida…ao ritmo do tempo

Nas contingências da nossa história vamos aprendendo a viver com dias de sol e de chuva, dias de canícula e de tempestade, dias de serenidade e dias de nuvens… tanto exteriores como exteriores. O difícil será sempre discernir o que há de bom, quando temos a sensação de que algo parece ser mais negativo.

Ver só o que os outros veem não será grande capacidade de amadurecimento. As coisas da vida fazem-nos aprender com os momentos que purificam…muito para além daquilo que é, meramente, visível. Por isso, é que ficar-se sob a penumbra da chuva e não ver para além do meramente sensitivo, será, no mínimo, pouca previsibilidade do já vivido.

Ora a nossa história humana não pode deixar-nos fixados no passado. Esse só tem utilidade para que saibamos interpretar o presente e iluminar o futuro.

Quantas vezes encontramos pessoas que, chorando sobre o passado, não vivem o presente e muito menos se abrem aos mistérios do futuro. A esses chamaríamos ‘saudosistas’ e, em muitos casos, profetas da desgraça.

Quantas vezes encontramos pessoas fixadas naquilo que lhes foi agradável e fechando-se à descoberta de quem Deus coloca no seu caminho… No tempo de criança é que era tudo bom, nos anos de adolescência tudo foi agradável… Não veem nem apreciam as novas pessoas que lhes é dado conhecer e refugiam-se no seu reduto de casulo à prova de desafios…

Quantas vezes parece que pararam no tempo e excluem o que têm a aprender, tornando-se reféns dos seus medos e aprendizagens… Serão certamente pessoas inseguras e ansiosas para consigo mesmas e em relação aos outros. 

= Interpretar os sinais dos tempos

Mais do que os tempos atmosféricos – com seus ciclos e cuidados – é preciso que as pessoas de cada tempo e em cada lugar saibam interpretar os sinais do ‘kairós’ (graça) mais do que ‘cronos’ (tempo), pois este só tem sentido quando inserido na correta justeza daquele. Não percamos tempo com coisas inúteis nem com futilidades mais ou menos bizarras, pois bem depressa teremos de amadurecer muito para além da chuva e do vento, do frio e das tempestades. Cada tempo tem as suas preocupações. Vivamo-las na serenidade!

 

António Sílvio Couto 


quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Populismo – de direita ou de esquerda?


Perante a onda de classificação de ‘populismo’ quisemos consultar algo que nos desse uma informação histórica e ideológica deste novo assentimento à condução da política nos tempos mais recentes… e que, possivelmente, trarão uma necessidade de correção de termos e de condutas.

Assim na wikipédia encontramos uma espécie de definição descritiva do populismo.

O termo populismo, um dos mais controversos da literatura política, possui várias conotações. Geralmente é utilizado, na América Latina, para designar um conjunto de práticas políticas que consiste no estabelecimento de uma relação direta entre as massas e uma liderança política (um líder carismático, como um caudilho, por exemplo) sem a mediação de instituições políticas representativas, como os partidos, ou até mesmo contra elas, e geralmente empregando uma retórica que apela para figuras difusas (‘o povo’, ‘os oprimidos’, etc.). 

= Ora diante desta descrição teremos de questionar se o populismo é só de direita ou se não haverá também um populismo de esquerda, mesmo que subentendido e quase sub-reptício no comportamento de certas figuras que assim apelidam os demais… embora se comportem como (quase) primários populistas.

Quem não se lembrará da conotação depreciativa de ‘fascista’, usada nos tempos após a revolução do 25 de abril, e com isso se pretendia rotular alguém com posições diferentes dos contestatários?

Quem não estará recordado das posições e comportamentos de certas forças partidárias, sindicais e associativas que usavam da manha para aprovar manifestos em nome do povo… esse que não entendida a rapidez com que se passava do ‘quem vota contra’, ‘quem se abstém’… ‘está aprovado’… mesmo sem ler ou ter sabido o que aprovou? Isso não era, não é populismo? Ainda hoje se continua a usar esta artimanha em nome do ‘povo’ e da ‘classe trabalhadora’… Isso não é populismo?

Ora, diante destas memórias de antanho, precisamos de refletir, denunciar e contrariar a mera tentativa de fazer crer que é populista quem não entra na onda reinante ou, pelo menos, assim considerada a seus olhos e de quem difunde tais guerrilhas politico-intelectuais.

Quando vemos forças duma certa esquerda em conduta difusa, aglutinada e fragmentada… à medida do combate contra as propostas dos outros partidos, isso não terá tiques de populismo?

Quando verificamos que a posição apresentada é dita ser em favor do ‘povo’, mas este não é tido nem achado porque as elites (culturais) antissistema pretendem fazer-se donas da (sua) cultura, isso não enfermará de populismo? 

= Não há dúvida que a situação mundial está confusa e talvez mesmo se crie apreensão sobre o futuro, mas devemos ser honestos intelectual e civicamente para sabermos não entrar nesta manipulação com que alguns iluminados querem fazer crer que só os outros – em que não nos revemos politicamente nem que não são da nossa cor ideológica e partidária – é que são populistas.

Nos últimos dias tenho ficado baralhado com posições de certos professores universitários – a quem se exige rigor e capacidade de visão multifacetada… acima do vulgo – que vão embarcando na teoria do populismo ser só de direita, fazendo quase uma figura ridícula sobre o seu não-distanciamento emocional senão na teoria ao menos na prática.

Já não será de admirar o posicionamento dalguma comunicação social, pois esta normalmente é a voz do dono – que lhe paga e a sustenta – e este vive mais na oportunidade de ganho económico do que na coerência de valores. É preciso que haja mais respeito pela inteligência dos ouvintes, leitores ou telespectadores, pois o tal ‘povo’ não pode ser esse reduto que se manipula e a quem se impõe uma visão de modo acrítico. 

= Populismo pode ser de direita ou de esquerda, tudo depende de quem quer falar em nome ‘povo’ do qual não tem procuração e tão pouco legitimidade… Há tantos ditadores encobertos neste nosso tempo, neste Portugal e na nossa cultura. Será necessário estar sempre atento e vigilante ao que querem fazer de nós sem lhes darmos consentimento… A cada homem/mulher um voto e muito se poderá decidir com justiça e liberdade… em democracia adulta e séria.

 

António Sílvio Couto



segunda-feira, 14 de novembro de 2016

Inimigo do inimigo…será amigo?


Na imensa cadeia de relações e de conhecimentos, de transações e de referências… com pessoas de vários estratos e códigos, de diversos momentos e em etapas díspares… vemos que a nossa vida se tece e entretece numa razoável complexidade, que, por vezes, conseguimos abranger e noutras situações como que nos ultrapassam.

A citação da frase – ‘o inimigo do meu inimigo é meu amigo’ – reporta-se ao contexto da segunda guerra mundial e teve as seguintes implicações históricas: Joseph Stalin à frente da Rússia aliou-se aos Estados Unidos da América do presidente Franklin Roosvelt e a Winston Churchill, primeiro-ministro britânico… todos contra Adolf Hitler que geria a Alemanha.

Decorridos tantos anos parece que emergem, de quando em vez, alguns laivos dessa aliança, agora configurada a outros interesses, desde os mais mesquinhos até aos mais sublimes… se é que tal caraterística de sublimidade se pode a aplicar a algo que tenta explorar os outros e até usá-los conforme possa convir. 

= Por estes dias surgem, de facto, sinais que podem ser preocupantes para a nossa identidade coletiva. Esta ‘nossa’ é mais do que uma leitura ideológica que pretenda ver ameaças em tudo e em todos que não pensem à nossa maneira. Quem, assim, se vê e interpreta os outros poderá comportar, mesmo que de forma subtil, uma carapaça de ditador encolhido, pois os outros nunca são (nem podem ser) ‘inimigos’ se não se identificam, totalmente, connosco e com as nossas manias… algumas delas bem ressabiadas e preconceituosas.

Veja-se a forma acintosa com que certos setores olham e julgam o resultado das eleições nos EUA e daí querem, rapidamente, tirar lições para o resto do mundo, desde que não sejam da sua cor nem perfilem os seus ideais. Com efeito, essas pessoas têm memória curta, dado que a sua cortina caiu somente há menos em trinta anos (1989) e julgam que o perigo se diluiu só porque que se ‘democratizaram’! 

= Urge, por isso, sabermos quem são (ou podem ser) os inimigos reconciliados, pois do diagnóstico bem conseguido poderá estar dependente o futuro das relações entre povos e culturas, entre propostas e programas, entre quem sonha e quem querer comprometer-se em realizar algo mais que a imposição de soluções, mesmo que de conveniência.

No nosso país precisamos de fazer sair da lura ou saltar do sofá essa imensa maioria silenciosa que se tem calado e acomodado com os desvarios da governança. Não podemos deitar a perder os sacrifícios dos anos transatos pela simples razão de que tudo tem de ser revertido, pagando favores a dirigentes sindicais e tentando conquistar votos com migalhas dum bolo esfarelado e azedo.

Quando os inimigos se zangarem poderemos compreender quem enganou quem, qual é a fatura que todos teremos de pagar e como iremos assumir as consequências de tanta ‘amizade’ interesseira. Não temos a menor dúvida que muita coisa vai fazer-nos voltar ao ‘dejá vu’… mais cedo do que tarde. 

= Desde o princípio do cristianismo se diz: ‘se alguém não quer trabalhar também não coma… ganhem o pão que comem com um trabalho tranquilo’ (2 Ts 3,10.12). Ora, o que temos visto e observado é que há muita gente a viver sem trabalhar, fazendo vida de rico e, ao que parece, com bolsa de pobre. Algo vai mal neste reino do ‘faz-de-conta’, pois não se pode repartir nem auferir melhores salários se não há investimento nem produção. Desgraçadamente ainda não vimos este perigo?

Tolhe-nos um complexo de inferioridade coletivo, pois queremos dar a entender que temos nível de vida – social, económica e cultural – mas os princípios pelos quais nos regemos – ou nos dizem governar – são falaciosos e articulados na mentira. 

= Há muita gente e instituições – algumas delas de solidariedade social da Igreja católica – que estão compradas pela boca, umas vezes porque precisam de quem governa para permitir cumprir as suas obrigações e outras vezes calando o que se pode e devia dizer, pois isso poderá colocar em risco a sobrevivência de tantos postos de trabalho. Haja verdade e coerência!

 

António Sílvio Couto 

quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Trumpalhadas


A eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos da América ainda está a ser digerida por muita gente. Quando tantos desejam que fosse Hillary Clinton a aceder ao lugar, os resultados trouxeram o contrário... e por larga margem.

De pouco adianta diabolizar o vencedor, recorrendo às imensas tropelias que disse e que fez durante a campanha eleitoral. Já houve quem referisse: uma coisa é o que se diz na campanha e outra é o que se faz no governo... tentando com isso acreditar que haverá uma outra personagem no lugar do poder!

Certamente poderemos considerar que os americanos não são só estúpidos quando nos convém – sobretudo quando fogem ao modelo de sociedade que nós julgamos o mais adequado – até porque podem estar a ver algo que nós ainda não conseguimos descortinar, pois nos deixamos absorver pelas nossas ideias quase preconceituosas...sobre tantas e tão diversas questões, que nos podemos endeusar na forma e no conteúdo.

Fique claro que nada me identifica com o modo de ser do vencedor e, em muitas das ideias, podemos perceber que elas são resultado das circunstâncias do país-continente em causa. Deste modo esta ‘provocação’ que escrevemos não pretende dizer nada pela escolha, antes esperando que se possa assimilar o que tudo isto significa... para eles e para o resto do mundo. 

As trapalhadas – o título: trumpalhadas, quer aglutinar trapalha (embuste, fraude e confusão) com Trump – em que nos vamos entretendo deixa por agora algumas considerações a que devíamos dar atenção:

- Quem quis vender um presidente antes do tempo terá de corrigir as apostas. Muita da comunicação social – nos EUA e na Europa – quis-nos fazer acreditar nas virtudes da (agora) derrotada, ela que contribuiu em tempos recuados para a crescente amoralização da América. Não se pode colocar filtros na comunicação, quando convém impor quem mais favorece as nossas ideias e comportamentos... Como irão engolir o que foi dito e escrito? Até onde pode ir a informação e a manipulação? Aos riscos corridos terão os seus mentores de interpretar quem tudo quer, tudo perde...

- A vulgarização – levada ao ridículo e ao achincalhamento – de quem não pensa como nós vai sendo uma das linhas de conduta na nossa sociedade...ocidental. Ora, dos problemas e das soluções temos de saber escutar e não podemos espremer o assunto até que aquilo que nos dizem caiba na estreiteza da nossa capacidade de ideal...como se fosse um funil que só credita quem pensa de forma idêntica. Isso será liberdade?  Muitos defensores de ideias da candidata vencida terão de questionar-se – mesmo nas franjas dalgum esquerdismo à portuguesa – mais sobre o que virá do que sobre aquilo que já passou.

- Pelo que se viu os candidatos à eleição eram os piores que podiam ter surgido nos dois lados da competição. Por isso, houve quem questionasse como foi possível chegarem à votação candidatos tão maus. No entanto, dum lado e de outro foram surgindo vozes, que por tão exaltadas nas suas argumentações, quase faziam crer que eram os melhores... até agora. Deste modo se pôs a nu a incapacidade de gerar pessoas com valores, critérios e moralidade. Se é assim nos EUA o que poderá acontecer no resto das (ditas) democracias!

- Dizia-se no fervor das leituras dos resultados que os candidatos manifestavam um grande desfasamento da realidade social e política. Mas não é esse o problema de tantos/as que se apresentam a votos? Quantos não conhecem o mundo real do resto da população. Ora, quando surge um ‘iluminado’ – Trump é uma espécie de self made man à escala americana...rica – que fala (mais ou menos) a linguagem dos mortais, consegue atrair e merecer alguma confiança... por algum tempo. 

= Esperamos que o que aconteceu nos EUA possa servir de lição para muitos (ditos e/ou apelidados) intelectuais, por forma a que não queriam ‘influenciar’ a partir dos seus interesses ideológicos e das suas éticas... Com tantas trumpalhadas precisamos de ser mais humildes e verdadeiros para connosco mesmos e uns para com os outros. Nem tudo vale, quando o valor é falso!    

 

António Sílvio Couto


segunda-feira, 7 de novembro de 2016

TPC’s: sim, não…talvez


A sigla TPC quer dizer: ‘trabalhos para casa’, que ocupam, desde muito cedo, as crianças em idade escolar. Nos tempos mais recentes têm-se colocado algumas questões sobre este vetor do tempo de aprendizagem das crianças: são necessários? São dispensáveis? Que utilidade podem ter? Com tais tarefas – extraescolares – onde fica o tempo para brincar? Não andaremos a sobrecarregar as crianças, ocupando-lhes o tempo em excesso?

Ora, foi notícia por estes dias que, em Espanha, durante o mês de novembro, os pais das crianças que frequentam as escolas públicas, vão estar em greve aos trabalhos de casa, aos fins-de-semana. A iniciativa é duma confederação de associações de pais e mães e pretende com isso recusar que os trabalhos de casa invadam o tempo das famílias e que possam violar o direito ao recreio, à brincadeira e a que crianças e pais possam participar em atividades artísticas e culturais…

Por seu turno, uma associação portuguesa congénere daquela espanhola manifestou-se solidária, acentuando que é preciso repensar o sistema de ensino, pois está em causa a qualidade de tempo, tanto das escolas como das famílias em casa…

Se dissermos que na situação em Espanha as crianças passam, em média, seis horas semanais com os trabalhos de casa, enquanto em Portugal parece que estas tarefas ocupam quatro horas por semana… teremos matéria suficiente e necessária para, ao menos, enfrentar a questão sem preconceitos, com soluções mal estudadas ou implementadas à pressa… como parece que ainda vamos resolvendo o problema do tempo extraescolar ao cuidado da família! 

= Há situações em que os trabalhos de casa são uma espécie de tortura para crianças e educadores (pais e encarregados de educação, avós e afins), pois fazem com que todos tenham tempo e capacidade para ajudar as crianças, o que nem sempre se verifica.

Claro que há, por outro lado, diversos modos de ultrapassar este engulho: umas vezes é entregando as crianças em ‘explicações’ – pagas fora da escola, com pessoas disponíveis e, espera-se, capacitadas para o fazerem – em complemento do tempo passado na escola; outras vezes poderá ser confiando as crianças/adolescentes a ‘centro de atividades de tempos livres’ (CATL’s), normalmente associados a jardins-de- infância de instituições preparadas para o efeito; outras vezes confia-se na boa vontade dos avós, que vão ajudando enquanto podem e sabem…  

= Será absolutamente necessário que as crianças tenham de levar trabalhos para fazer em casa, quando passam tanto tempo em área de aprendizagem escolar? Não será que a desculpa de ocupar as crianças confunde aprendizagem com estudo? Não será que o (pretenso) modelo de trabalhos de casa ainda vive numa visão de família, que está desconjugada da atualidade?

Talvez seja preciso que as crianças continuem a estudar em casa – seja nela mesma, seja nalguma estrutura que a substitua – tentando assim cimentar o que se aprende, ouvindo, falando, escrevendo… ou, sabe-se lá, brincando. Mas teremos de encontrar uma forma mais consentânea com a vida atual das famílias – onde os pais passam tanto tempo fora de casa e sem os filhos, possivelmente, entregando-os aos cuidados de avós e de outras ajudas… até pagas – dando a uns e a outros espaço e tempo de qualidade em comum e em intensidade… ao menos ao fim-de-semana. 

= A escola não pode ser só uma espécie de espaço lúdico, tem de ser, essencialmente, o local onde se dá gosto por aprender, embora sabendo as limitações da nossa sociedade e cultura. Por isso, será importante que, quem tem a responsabilidade da educação – tanto ao nível geral e nacional, como nas instâncias locais e mais próximas – saiba resolver os novos problemas com ideias adequadas à complexidade da educação. Ora, os trabalhos de casa são, hoje, questões novas e que devem ter soluções inovadoras. Com efeito, não podemos concordar que os (ditos) trabalhos de casa ocupam em excesso as crianças/adolescentes e nos fiquemos por continuar a apresentá-los como a mais atualizada forma de estudar. Aliás, seria muito útil para todos – educandos e educadores – que bem cedo cada um saiba a sua melhor forma de estudar, pois daí advirá o sucesso no futuro…    




António Sílvio Couto 

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Aprender a ser poupado


Segundo dados revelados nos últimos dias, os portugueses estão cada vez menos a poupar. A fazer fé naquilo que foi publicado, no segundo semestre deste ano, a taxa de poupança cifrou-se em 3,5%, atendendo ao que cada um ganha e àquilo que consegue aferrolhar.

Ora, há vinte anos atrás nós – no geral da população – conseguíamos poupar na ordem de 12,5% do rendimento auferido. Quais são, então, as razões deste fenómeno de andarmos a gastar mais…mesmo sem ter? Porque entramos nesta espécie de euforia de ‘chapa-ganha, chapa-gasta’? Que terá havido de tão significativo para vermos as pessoas a pensarem cada vez menos no futuro…como acontecia em tempos não muito recuados? Será que a apologia do consumo – sobretudo no último ano – terá contribuído para esta vivência social de não-poupança? Estaremos a lançar as bases para uma crise mais profunda – a médio e a longo prazo – do que a crise económica do após-2008? Será possível encontrarmos receitas mais ou menos aceitáveis para modificarmos este estado da sociedade? De entre as possíveis soluções qual será aquela que se pode ajustar melhor à situação pessoal e familiar de cada um de nós? 

Recentemente encontrei uma razoável lista de sugestões – com mais de duas dezenas – num órgão de comunicação. Vamos respigar algumas, acrescentando outras questões e alevantando outros assuntos atinentes ao caso e similares na conjugação das matérias em apreço.

Eis a lista para uma cultura de poupança:

- Elaborar um orçamento mensal, onde possam ser incluídas as despesas correntes e as fixas anuais;

- Prever um certo montante para despesas imprevistas e gastos extraordinários;

- Tentar ter um fundo de maneio que consiga fazer frente a pelo menos de três a seis meses de dificuldades;

- Ir construindo um pequeno saldo para a época dos presentes, como no Natal e nos aniversários;

- Estar atento às promoções e aos descontos, tanto dos bens alimentares como do combustível…atendendo a que de manhã ou ao final do dia a gasolina fica mais densa, conseguindo, assim, comprar mais por menos;

- Na lista das compras tentar fugir das escolhas por impulso… tendo em conta os lugares estratégicos das grandes superfícies, que nos podem apanhar desprevenidos;

- Preferir o tomar banho de duche, o que pode poupar até oitenta mil litros de água por ano;

- Na lavagem dos dentes fechar a torneira durante a escovagem, o que pode poupar até dez litros anualmente;

- Vigiar sobre os valores de seguros da casa, do carro, de vida e de saúde, pois há mudanças e atualizações contínuas;

- Estar em atenção às diferentes taxas de telemóvel, de internet, de televisão e de telefone fixo… pois muita coisa muda rapidamente. 

Por certo que há milhentos estratagemas para vivermos num sistema de poupança. Arriscado será se nos limitarmos a tentar implementar um regime de poupança. Comparando: é diferente uma pessoa viver sob um sistema de alimentação para cuidar da saúde do que submeter-se a uma espécie de regime de emagrecimento que pode ter alguns efeitos mais ou menos imediatos, mas que não educa para ter uma saúde compatível com o necessário.

Deste modo é fundamental que se reaprenda a viver na poupança, pois as tão difundidas benesses do ‘estado social’ têm vindo a servir para enganar quem viva gastando tudo (e mais) aquilo que ganha. É urgente denunciar os artífices da mentira, que nos vieram dizer que o consumo fará com que as pessoas vivam melhor, pois se não tiverem algo de reserva com facilidade poderão cair no logro de que o que ganham as sustenta… Isto é pura mentira, sobretudo se as pessoas viverem só dos seus ordenados, dado que poderão receber mais, mas serão aliciadas para gastarem ainda muito mais…

É diante deste capitalismo encapotado que temos de dizer que há gente neste país que diz ter intentos sociais – alguns até a coberto das ações socio-caritativas da Igreja católica – mas que não deixarão mais do que um rasto de miséria, pois enganaram as pessoas, fazendo-lhes crer que no gastar é que está o ganho, pois deveria ser, com humildade e verdade, ao poupar no presente poderemos cuidar do futuro. O resto é patranha! 

 

António Sílvio Couto