Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Num país de cigarras e de formigas!

Recentemente, um (ainda) ministro do atual governo proferiu que Portugal não pode ‘ser um país de muitas cigarras e poucas formigas’. Talvez influenciado pelo espaço em que estava – na região de Viseu – o governante, segundo palavras posteriores, quis enaltecer ‘os trabalhadores por conta de outrém e os pequenos e médios empresários, comerciantes e agricultores, que, pelo trabalho de formiga que todos os dias fazem, criam riqueza, mantém empregos e ciram postos de trabalho’...

Não deu para perceber a reação de certos ‘intelectuais’ àquelas palavras. Dá a impressão que se sentiram ofendidos e denunciados, sobretudo, os recentes manifestantes urbanos. Será que conhecem a fábula?

Vejamos, então, alguns indícios desta psicologia de cigarra neste retângulo à beira-mar plantado a que se dá, há mais de oitocentos anos, o nome de Portugal.

- Logo que aparecem uns raios de sol, corre tudo para a praia... pouco importando o trabalho a fazer, inventando as mais díspares situações para o descanso! Contesta-se a precariedade do trabalho, mas é de ver as praias cheias e os locais de veraneio com lotação esgotada, sem olhar a custos!

- Enquanto se faz o combate a incêndios – onde se reduz a cinza muita da nossa riqueza natural e do sustento florestal – vemos a correria aos supermercados – adquirindo produtos que nos impingem e para os quais não trabalhamos – e a participação em manifestações reivindicativas... pois os tais incêndios não lhes dizem respeito!

- Faz-se fila para procurar emprego, mas enjeita-se a possibilidade de participar na prevenção dos fogos nos nossos montados e campos... cuidando de tratar da sua ‘vidinha’ sem olhar a meios, atropelando, quantas vezes, os fins!

- Cuida-se de usufruir do subsídio em vez de procurar trabalho, pois a remuneração deste, nalguns casos, é bem inferior àquele, que não custa a ganhar, mas que pode viciar os beneficiários... cigarrando, isto é, pelo fumo do cigarro e na preguiça!

- Que dizer ainda daquelas situações em que se discute mais o futebol – empresa e indústria, ideologia e mística, sentimento e quase irracionalidade – do que a sua real prática? Temos, por agora, semanalmente, na segunda-feira à noite, três canais televisivos a discutir à mesma hora, apaixonadamente, as conjeturas, os erros, as táticas de bancada... cigarrando do alto do púlpito sapiente! Por breves momentos aquelas diatribes futebolísticas entretêm os (seus) adeptos e fazem esquecer as agruras do trabalho, que deveria acontecer não fosse a hora tardia em que acabam de arengar aqueles senadores da treta.

- O Parlamento português tornou-se numa espécie de campo de cigarras em grande estilo, subvertendo a função de ‘casa da democracia’ e, pior, acabada sinfonia discursiva logo são dissecados os cantos das cigarras por outras mais sábias, que, nos estúdios televisivos, tentam descortinar nas entrelinhas façanhas de duvidoso gosto...

- De alguma forma soa a canto de cigarra o que certas forças politico/partidárias disseram ao afirmarem votar contra um orçamento de Estado que ninguém conhece e até ameaçando com moções de censura sobre factos não reconhecíveis, enquanto reclamam vitória por recuos – sensatos ou oportunistas! –  de quem tem de governar... De fato, as cigarras têm poder de influenciar e as formigas de calar... até ver!
Sem pretensão de fechar a discussão, antes pretendendo provocá-la, deixamos breves perguntas:

. Até onde irá a nossa capacidade de aturar tanto barulho e pouco trabalho?

. Como poderemos criar um clima de silêncio, que leve à reflexão e ao questionamento pessoal?

. Será possível inverter este ambiente de supercialidade, criando condições para a descoberta do sentido da vida, olhando mais os outros do que, meramente, a nós mesmos?

. Como poderemos calar certas cigarras, valorizando o trabalho de muitas ignoradas formigas?

. Teremos capacidade de nos regenerarmos, dando novo significado ao trabalho e não à promoção de certa preguiça?

 Tal como na fábula, tentemos trabalhar sem nos deixarmos provocar por algumas nefastas cigarras... pois, só no dicionário é que o ‘sucesso’ aparece antes do ‘trabalho’!

 António Sílvio Couto

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Em pé de igualdade... ontem, hoje e no futuro


Em breve, a 1 de Outubro, ocorrerá o ‘dia mundial do idoso’ e, em muitas autarquias, todo o mês será mesmo dedicado a este largo e complexo sector da nossa população, que, em 2050, poderá atingir um terço dos habitantes em Portugal.

Por estes dias presenciei, num bairro da cidade de Braga, uma situação que teve tanto de simples quanto de simbólico: à hora de almoço foram chegando vários/as comensais, que, na saudação, se iam inteirando da saúde e da disposição de cada um/a... notava-se que aquilo era um ritual diário, onde a refeição servia de convívio e de presença (mútua e múltipla) em lenitivo para as agruras de uns e para os outros... Esta relação de vizinhança e de proximidade é, hoje, em muitas situações, supletiva dos laços familiares, que, nalguns casos, são ténues ou até inexistentes. Quantas vezes os vizinhos são a melhor família, tanto para o bem como para a (possível) intromissão na vida uns dos outros! Ainda vamos tendo baluartes de boa vizinhança!

1. Força na debilidade — Por entre luzes e sombras, a história de muitos (dos nossos mais) velhos está cheia de casos mais ou menos assumidos de vivências, onde o crescente abandono de uns tantos faz sofrer quem possa estar sensível à sua vulnerabilidade... De facto, quantos velhos são abandonados, por ocasião, das (pretensas) festas sociais – sejam de índole coletiva, como no Natal ou na passagem d’ano ou de natureza familiar e mesmo regional – ‘esquecidos’ nos hospitais e/ou prolongando a ‘baixa clínica’ muito para além do tempo suficiente e necessário... Diante da frieza de certos cuidados como que sentimos arrepios sobre o modo como nos poderão tratar daqui a pouco tempo... pois, em breve, podemos necessitar de tais serviços. E nem as razões de índole mais ou menos religiosa nos facultará melhor atenção ou cuidado!

2. Enquadramento familiar, precisa-se – Cada vez mais os nossos mais velhos têm de sair de casa para passarem o resto dos seus dias colocados em lares, que em tempos mais ou menos distantes tinham o rótulo de ‘asilos’. De facto mudou a definição, mas, nalguns casos, continua a mentalidade, não dos funcionários que prestam os serviços, mas dos parentes de quem lá coloca os seus mais velhos... porque mais fragilizados e, desgraçadamente, quase conformados com o seu destino.

Quando a família falha, tudo o resto capitula em cadeia e sob um regime de insensibilidade atroz. Quando o elo mais fraco se quebra, tudo o resto como    que o explora sem dó nem piedade. Quando os laços de sangue são suplantados pelos interesses (mais ou menos) materialistas, todo o velho – rico ou pobre, remediado ou pensionista – se torna (ou pode tornar) descartável e (quase) indesejável...ao perto ou ao longe.

3. ‘Filho és, pai serás... como semeares, assim recolherás’ – Este adágio traça o nosso projeto a curto e médio prazo. Se os pais que hoje são colocados nos ‘lares’ ainda cuidaram, presencial e atentamente, dos seus filhos, o que será dos pais cujos filhos foram despejados numa espécie de lugar anódino do jardim de infância e da creche... lançados nessa espécie de purga de quem não olha para a frente e que nem se distrai sobre quem vem atrás?  Por vezes as instituições ligadas – teórica e prazenteiramente, ao menos em princípio – à Igreja católica pactuam com idênticos comportamentos de outros que, não se reclamando dos valores cristãos, fazem negócio com as necessidades alheias... As (ditas) ‘respostas sociais’ tratam os seus utentes de ‘clientes’, gerando e gerindo os mais díspares interesses, cobrando os serviços e as prestações de ajuda... atuais e futuras, seja qual for a duração do serviço!
Agora que vemos a sombra a projetar-se no seguimento da nossa própria imagem como que vamos já sentindo que é preciso que coloquemos os mais velhos em pé de igualdade com aquilo que agora vivemos, pois no futuro receberemos – em esperança de bom agradecimento! – o que semearmos, tanto nos mais novos como no compromisso em favor dos mais vulneráveis. Queira Deus abençoar-nos em conformidade com aquilo que tivermos feito pelos outros... mesmo sem esperar recompensa!

Nota: Reparemos na intensa vivência de Alex Ferguson – treinador de futebol do Manchester United há cerca de 25 anos – que revela uma razoável capacidade de superação das derrotas e das vitórias. Vencer é e pode ser um conceito que se acrisola com a nossa estória de vida numa sempre maior maturidade e compromisso!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)

 

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

E depois de 15 de Setembro?


Pelo significado social, político e histórico, o dia 15 de Setembro de 2012 vai marcar os próximos tempos, sejam quais forem os resultados... na condução da nossa vida coletiva. De fato, as manifestações em várias cidades do país quiseram dizer que algo vai mal no subterrâneo da nossa democracia. E nem as diabruras de uns tantos infiltrados para criarem incidentes nos podem distrair do que está – e possivelmente continuará a estar por largos meses – em causa.

Numa análise ainda um tanto incipiente parece-nos que devemos encontrar prós e contras – numa espécie de paralelo – naquilo que aconteceu... e, tal como em tudo na vida, podemos e devemos encontrar leituras diversas, questionando-nos e sendo questionados.

 = Sinais em favor

As dificuldades economico/financeiras das pessoas, das famílias e das empresas são graves. O silêncio sepulcral em esta(va)mos a viver tinha de ser sacudido. Quem cala nem sempre consente!

A diversidade de intervenientes, desde crianças até famílias inteiras, percorrendo um largo espetro de desempregados e de jovens à procura de emprego... num leque diversificado e atento ao (seu) futuro a curto e médio prazo.

Muito para além dos números dos sem rostos – tais foram já outros falhanços das convocações via redes sociais – houve que tenha tido a ousadia de sair de casa, acreditando que todos temos uma palavra a dizer sobre o nosso futuro coletivo.

Num país pouco politizado para defender os interesses comuns, vimos pessoas que estão atentas ao futuro das gerações vindouras, trazendo-as também à liça da participação mais consciente.

= Leituras de apreensão

Mais do que o número de pessoas que veio para a rua foi um tom algo exaltado – mesmo por entre ‘elogios’ medíocres para o bom comportamento (dito) cívico dos manifestantes – e revivalista do tempo do prec... no distante verão de 75. Até algumas palavras de ordem soavam àquela época!

Vimos muita gente mais interessada nas suas regalias e obejtivos do que pessoas preocupadas com o futuro do país, pois podemos deitar a perder com a multiplicação de iniciativas idênticas a credibilidade conseguida junto dos nossos emprestadores... internacionais.

De algum modo foi triste – e talvez preocupante para novos protestos – vermos agressividade semeada por gente que se esconde por trás de caras encobertas e à sombra gera barulho, provocação às autoridades e propensa à destruição... A Grécia pode repetir-se em Portugal! Seria desagradável e incontrolável...

Numa espécie de associação na desgraça não havia necessidade de vermos certos aproveitamentos – sindicais, partidários, grupais e de lóbi – por entre os que se quiseram manifestar, pois nem sempre a desgraça alheia pode servir de cobertura aos protagonismos mais interesseiros.

= Que futuro?

Cremos que já basta de culparmos os outros – embora haja quem seja culpado e não o assuma! – para nos desculparmos pelos nossos insucessos pessoais e coletivos, familiares ou profissonais, pois da assumpção da culpa poderemos encontrar o caminho a seguir.

Ainda não vimos – cristamente falando – quem tente fundamentar nos valores dos Evangelho, clara e distintamente, a solução dos nossos problemas mais sérios. Vamos ouvindo frases e chavões de teor mais reivindicativo do que profético, pois denunciar não basta, se não nos comprometermos na solução... proposta.

Temos de aprender a viver na simplicidade – evangelicamente diz-se ‘pobreza’ – de vida escolhida e não no azedume contra a austeridade. Esta é-nos imposta, enquanto aquela pode fazermos viver com o essencial sem esbanjamento nem consumismo de faz-de-conta.

Verdade a quantos nos obrigas!

 
António Sílvio Couto (asilviocouto@gmail.com

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

De mãos abertas ou de punho fechado?

Certamente todos sabemos (ou devíamos saber) que a linguagem das mãos fala de nós mesmos (até) muito mais do que nós desejaríamos. Assim estar de mãos abertas significa estar numa atitude de dar/receber, enquanto a mão fechada – tendo mesmo em conta a simbologia de ser a esquerda ou a direita – envolve tudo e pouco mais do que querer dar. Com efeito, com o punho fechado, isto é, a mão cerrada em atitude de agressividade, intimida e provoca, ameaça e agride, afasta e (pode) aniquilar.

Pelo muito que nos merece de respeito quem tenta estar ao serviço dos outros – sejam os políticos de profissão, sejam os diversos profissionais altruístas, sejam mesmo as diversas vocações de ajuda ao próximo – cremos e acreditamos que não podemos incluir na mesma desconfiança quem procurar estar e fazer do seu modo de viver a dimensão de presença aos outros.

= Neste contexto de ‘crise’ é recorrente vermos certos paladinos da desgraça a invectivarem quem tenta conduzir a sua vida pelo serviço: há figuras e figurões que se tentam esconder para dizer mal, mas nem com o dedo nínimo fazem seja o que for pela modificação das coisas em si nem à sua volta.  Quem já viu algum partido ou associação da (dita) esquerda criar condições de minoramento dos mais pobres, não na teoria, mas na prática? Eles denunciam em alta-voz, mas pouco ou nada fazem... nem no mais recatado silêncio. A verborreia devia pagar imposto... agravado! Eles usufruem da contestação audível e barulhenta, mas pouco ou mesmo nada fazem pelo mínimo melhoramento das condições mais comprometidas e de mãos sujas no trabalho!

= Bastaria que, num só dia, não fossem fornecidos os serviços das instituições (com crianças, escolas ou mais velhos) da Igreja católica, em todo o país, e seria criada uma multidão de não atendidos – talvez explorados por certas forças (ditas) de esquerda, que nada fazem por eles, antes os exploram... antes, durante e depois das votações – e quase tudo ficaria paralisado! De fato, há muita gente ingrata e psicologicamente desconforme entre quem a ajuda e quem a explora; quem, de verdade, faz algo por ela e quem a manipula; quem faz o bem e quem pela maldade se insinua... e a insulta, intelectualmente.

= Pelos tempos que vivemos e, tendo em conta as condições que viveremos em breve, é preciso clamar bem alto que o povo não pode ser o bombo da festa de uns tantos arrogantes ‘intelectuais’ que nunca vemos a fazerem compras com o vulgo e nem temos visto ainda os defensores do pretenso ‘serviço nacional de saúde’ a estarem nas salas de espera dos hospitais e dos centros de saúde!

= Pressente-se que o país está prestes a ser incendiado socialmente, assim se pode inferir das declarações de vários políticos e mentores sociais. O clima de crispação social está patente nas palavras de vários intervenientes na vida pública, tendo a comunicação social um farto papel no ambiente que vivemos em Portugal. Em breve veremos montras a serem estilhaçadas, roubos organizados em locais de compras, distúrbios em grandes ou pequenas cidades. O rastilho está quase a ser incendiado. Esperamos que os mentores e autores do que aí vem sejam responsabilizados... mesmo criminalmente.

Talvez até haja entre os protestantes (não tem nada a ver com a vertente religiosa) quem nem tenha votado, mas agora se acha no direito de ajuntar-se à contestação!... Para quando a mudança da lei, fazendo do voto algo obrigatório para, assim, ser legítimo e legitimado quem é eleito? 

Procuraremos estar de mãos abertas e nunca de punho fechado, pois naquelas podemos dar e receber e com este ficaremos mais revoltados, azedos e rezingões!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)

 

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

O padre homem de fé no mundo de hoje

Decorreu, em Fátima, de 4 a 7 de Setembro, o sétimo simpósio do clero de Portugal, subordinado ao tema: ‘O padre homem de fé – do mistério ao ministério’. Cerca de quinhentos padres de todas as dioceses portuguesas refletiram sobre assuntos relacionados com a sua identidade e missão, tanto na Igreja como na sua relação com o mundo... de hoje.

Pela experiência de participação nos outros anteriores simpósios, este tipo de encontros têm tanto de simples quanto de complexo: simples porque é uma oportunidade de (re)encontro com tantos padres de outras dioceses, numa diacronia de proximidade e de experiência de oração e de aprendizagem em comum; momentos como o último simpósio revestem, no entanto, a configuração de alguma tristeza, pois muitos do que podiam e deviam estar presentes – houve dioceses que primaram pela ausência em número, até dos seus bispos, o mesmo se diga de intelectuais universitários que só participam para darem lições! – perdendo, afinal, uma bela oportunidade de manifestarem humildade e comunhão com os outros... para a linguagem ministerial de hoje.

= Preâmbulo do ‘ano da fé’

Pela temática abordada viu-se que houve uma intenção de fazer deste simpósio uma espécie de preparação próxima do ano da fé, que se vai iniciar em outubro próximo... e decorrerá até novembro de 2013. Dividido em quatro áreas – nas fontes da fé, o ministério do padre, desafios da fé, o padre - peregrino da fé – correspondendo aos dias de reflexão, houve uma simbiose de ‘coisas teóricas’ (teológicas e sectoriais) e de partilhas de experiências de vida, de momentos de cultura e de oportunidades de questionamento ao mistério e ao ministério do padre.

Já vimos tempos de retiro menos serenos, com situações mais confusas e até com vivências mais atrapalhadas por  organização e mesmo com custos mais exagerados... do que o que aconteceu neste simpósio!

Não poderemos classificar a participação no simpósio como se fosse um encontro da ‘fina flor’ do clero português, mas poderemos considerar que, pela assiduidade de uns tantos, há um leque de padres no nosso país que tenta acertar com o ritmo da Igreja universal e em consonância com a tradução das propostas do nosso episcopado em geral e de cada bispo em particular.

Cremos que nem as desculpas de certos trabalhos (ditos) pastorais – antes parecem ser pastoris! – nem a concorrência com ‘festas e romarias’ ou a sobreposição com férias podem eximir de estarem presentes... seja lá quem for. Por certo todos temos algo a aprender e mesmo que já saibamos (quase) tudo – o que nalguns casos não passa de  uma brecha de ignorância mal assumida – faz-nos sempre bem estar com outros, lado a lado com quem nem conhecemos e que podemos descobrir como ‘figuras’ de impacto humano, social e eclesial...

= Do acolhimento ao assombro, passando pela fidelidade... nos vários lugares

Dos vários intervenientes respigamos algumas frases... sem reduzir estes excertos aos mais importantes, mas apenas à anotação de circunstância.

- Desapareceu da praça pública a discussão da questão religiosa – Zita Seabra;

- Ser pobre dos talentos dos outros – Paulo Pereira da Silva;

- O modo de admirar define o tipo de pessoa que somos – Eloy Bueno de la Fuente;

- Crise de valores por vergonha da sua afirmação... Dificuldade das elites em afirmarem as suas convicções – Helena Matos;

- É no tempo que se constrói a fidelidade... A fidelidade está sempre dependente da educação do desejo – Emanuel Silva;

- A Igreja ou comunica ou se nega a si mesma como sacramento de comunhão e sujeito de evangelização... O cybespaço é a nova terra de missão – João Aguiar;

- Em Portugal morre-se mal... Quanto vale ter crença em Deus se não temos fé nos homens? – Jorge Vilaça;

- Acreditar em Jesus Cristo é obra de Deus em nós... Peregrinos da fé somos chamados a ser peregrinos da verdade – José Policarpo.

Estes breves flashs daquilo que foi dito, como que nos apontam sempre para o mais além da vocação e da missão do padre na Igreja e para o mundo.

De pouco adiantará dizerem que esse ‘tal simpósio’ pouco acrescentará à sua douta sabedoria, senão fizerem, experiencialmente, o exercício da humildade de uns na massa do todo... de Deus e na Igreja! As coisas da paróquia podem esperar, pois se a fonte – o mistério – se esgota como será alimentado o rio/riacho do ministério!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)

segunda-feira, 3 de setembro de 2012

Do arroz confetti... aos avios dos pobres


Moita, 1 de Setembro de 2012, 12 horas e trinta minutos. Está a terminar um casamento e outro se perfila para ter início. Ambos estão atrasados, sobretudo o primeiro. Como de costume, à saída da porta da igreja, perfilam-se convidados com punhadas de arroz e rosas para atirarem aos ex-noivos, agora tornados conjuges...  e esposos.

Tudo seria (aparentemente) normal se não estivessemos em crise e se, na retaguarda da mesma igreja, não estivesse a acontecer a distribuição de alimentos – dito de ‘avio’ – a pessoas carenciadamente envergonhadas... Estas fazem-no por necessidade (quase) escondida, enquanto que, mantendo uma certa tradição desfazada das circunstâncias e até da oportunidade, se esbanja o que, um dia, lhes (até) poderá fazer falta... O futuro se há-de encarregar de dizer a mínima verdade sobre as necessidades e os esbanjamentos!

= Que mundo é este em que temos de viver e de encontrar a capacidade mínima de adaptação às discrepâncias contínuas: uns fazem de conta  e deitam fora esbanjando, outros tentam sobreviver com ajudas repetidamente regateadas! Uns divertem-se com o que agora lhes sobra, outros esmoleiam o que de justiça lhes é (era) devido! Uns exalam perfumes e divertem-se, outros tentam esconder a sua indigência e (até) uma menos cuidada higiene! Uns dizem ter religião, outros servem-se da religião... mesmo sem lhe agradecerem! Uns vivem numa espécie de ‘carpe diem’ (= goza a vida!) e outros carpem (isto é, choram e lamentam-se, regateando o mínimo de atenção) tanto de dia como de noite! Uns pavoneiam-se e servem-se duma certa religião de fachada, outros enfaixam-se na vergonha de saberem que precisam de ajuda... após um tempo de menor sucesso, mesmo que seja (apenas) pela falta de trabalho...

= Confesso: pela primeira vez, neste dia, perdi a capacidade de compreender os fatos, embargando-se-me a voz numa tentativa de querer dizer o que me ia na alma, perdendo mesmo a articulação das palavras. Não sei se foi de revolta ou de estupefação que tal aconteceu!... Por largos minutos a garganta esteve sêca e sem saliva para articular qualquer som... tal era a raiva, a confusão e a indecência!

De algum modo fui assaltado por pensamentos funestos: se isto acontece neste reduto, onde cada qual ainda se conhece e (talvez) se respeite, o que será nas franjas do anonimato de urbes (mais) competitivas? Se isto se vive sem olhar a meios de ostentação em relações de alguma proximidade, o que será nos espaços sem lei nem regra em metrópoles (mais ou menos) desenraízadas? Se estes episódios nos magoam e incomodam, como poderemos não estar sensíveis para notícias sobre anónimos e distantes.. .embora sejam e vivam sendo gente como eu?

= Mesmo que de forma simples quero dizer:

- Não deixemos de fazer festa, mas temos olhar em volta para não criarmos escândalo nem azedume!

- Não nos deixemos acomodar a atavios de tradição se não soubermos o significado dos mesmos!

- Tentemos promover a valorização da atençãos aos outros, mesmo que não façamos tão boa figura nos rituais de ostenção social!

- Cuidemos das coisas que valem e tentemos aprender a desprezar (tantas) máscaras do que não presta!

 

De fato, há tanta gente a precisar de atenção concreta que as (nossas) distrações egoístas precisam de ser educadas com rasgos de bom-senso e de iniciativas de ousadia... evangélica.

Ó Cristo do Evangelho a quanto nos obrigas e nos fazes viver num mínimo de coerência e de verdade!

 

António Sílvio Couto

(asilviocouto@gmail.com)