Partilha de perspectivas... tanto quanto atualizadas.



sexta-feira, 28 de abril de 2017

Os netos que paguem a dívida…


A ‘luminosa, arguta e ousada’ solução encontrada por alguns partidos políticos do arco do governo em funções – o alargamento do prazo para pagamento da dívida às instituições europeias de quinze para mais quarenta e cinco anos – tem tanto de simbólico, quanto de perigoso: simbólico porque ao tentarem estender os prazos se pretende fazer diminuir os juros anuais, perigoso porque não se tem a noção dos gastos e dos encargos que irão suportar as gerações vindouras… até depois de 2060! 

Vejamos algumas incidências a curto, médio e longo prazo desta pretensão tão ‘progressista’: 

– Com que autoridade – embora seja um ato de poder – pode além prorrogar uma dívida para governos que podem não ter a mesma orientação política e económica? Quer isto dizer que teremos de suportar os mesmos – isto é, os de agora – durante tanto tempo, dado que foram eles que nos meteram neste colete-de-forças? Onde estará, então, a alternância democrática?

– Uma opção desta natureza não pode ser tomada de forma unilateral, sem o acordo bem concertado dos outros partidos e forças sociais? O perfil democrático – apelidado por forças apoiantes desta forma de governação – do ‘posso, quero e mando’ – só é contestado quando se está fora do arco do poder? Não andarão por aí uns laivos de ditadura encapotada?

– Há crianças cujos pais ainda nem nasceram e já estão endividadas com encargos para os quais não contribuíram minimamente. Teremos direito de lhes deixarmos tal herança ainda não herdada? 

= Deixemos, por momentos, estas conjeturas e fixemo-nos nos dados do dia-a-dia: Ainda esta manhã vi dezenas de pessoas à porta duma repartição de finanças… hoje é o último dia útil para pagar alguns impostos, talvez o IMI ou sobre veículos com matrícula deste mês… Porque deixou esta gente para o último dia o acerto de contas com as finanças? Será defeito ou feitio, isto de deixar para a última hora as obrigações, sobretudo, de pagamentos? Não será preciso uma nova educação social e coletiva, quando toca a honrar os compromissos? Por que temos de andar na aflição e à pressa, quando sabemos o que temos de fazer e a pagar?

Atendendo às vicissitudes da nossa conjetura económico-financeira custa a crer que já tenhamos adquirido a consciencialização de que ninguém dá nada a ninguém sem cobrar os seus direitos. Assim tem sido com as ajudas da UE e as largas benesses em dinheiro a rodos lançado para este país. Em certas épocas chegou a ser de nove milhões de euros por dia… entre 1986 e 2011. Que fizemos disso? Gastamo-lo em coisas essenciais ou andamos a ostentar de rico sem consistência de finanças…públicas e privadas? Depois das estradas e dos estádios de futebol o que é que ficou na nossa mentalidade de ajudados, menos bons trabalhadores e (quase) incapazes de gerirmos o que nos foi subsidiado?

Antes davam-nos dinheiro e gastávamos, prestando contas mais tarde. Agora, no ‘projeto 20/20’ temos de apresentar contas (com tudo registado e regularizado) e só depois recebemos a comparticipação já decidida, mas em definitivo desbloqueada…Com efeito, foram ‘estes marroquinos do norte’ que fizeram com que a Europa rica nos tivesse de colocar sob alçada de rigoroso controlo, nalguns casos desconfiando das nossas capacidades e arbitrados por regras mais exigentes do que para com outros… 

= Não deixa de ser um tanto patético que uns pretensos ‘sábios’ dum apelidado ‘grupo de trabalho para a negociação da dívida’ venham trazer um novo alento aos caloteiros nacionais, pois se nos aceitarem tal projeto, lá fora, estaremos a salvo de termos de cumprir os mais mínimos compromissos, cá dentro, na medida em que os mais novos terão de assegurar as dívidas para as quais não foram tidos nem achados, empurrando para quem vier atrás e seja capaz de ter vergonha por si e pelos seus antepassados. Não foi de entre os atuais governantes (secundários) que veio a proposta em não pagar a dívida? Não são parceiros de conluios outros que propagam o resgate sem honra nem face? Não foram do tal ‘grupo de trabalho’ economistas dialéticos e diletantes?

Como cidadão tenho vergonha de deixar aos meus descendentes indiretos responsabilidades a que eles não estão obrigados moralmente. Não nos tentem enganar mais, pois a verdade vencerá!

 

António Sílvio Couto



quarta-feira, 26 de abril de 2017

‘Católico de esquerda’ – porquê e para quê?


Numa das suas diatribes de circunstância o presidente da república considerou que ‘faz falta mais esquerda católica’ em Portugal, tendo em conta as variações sociais – o país metropolitano, no seu entendimento – e os confrontos e ‘determinados posicionamentos doutrinários, ideológicos e partidários’.

A provocação – tentaremos explicitar este termo nesta partilha/reflexão – surgiu no contexto da apresentação dum livro sobre o Papa Francisco e dinamizado por dois jornalistas que têm conhecimentos na área da religião e do catolicismo em particular.

O ex-jovem militante de causas sociais nas décadas de 60 e 70, que foi Marcelo Rebelo de Sousa, ocupa agora a mais alta instância do poder/autoridade no nosso país. Viu inclusive, recentemente, elevado ao patamar mais almejado da política internacional – a ONU – um companheiro de armas desse tempo, António Guterres. Nunca escondeu a sua condição de crente/praticante. Tem intervindo em matérias do foro eclesial. Fez comentários sobre leituras dominicais. Benze-se em público, como nunca vimos outros ocupantes da visibilidade institucional… governativa, autárquica…como deputado ou figura exposta… Por vezes diz o que poderia ser melhor acertado, tanto na forma como no conteúdo.  

* Teremos, no entanto, de nos interrogar sobre o significado e o alcance desta expressão – ‘católico de esquerda’ – para que não entremos numa lógica de aglutinação de termos em ordem a serem satisfeitas pretensões que cada um pode dissimular e/ou confundir. Não será que dizer ‘católico’ já deveria conter facetas que se aninham na conceção de ‘esquerda’? Esta terá de ser sempre – e só – lida, entendida e proclamada como visão materialista das pessoas, das sociedades, das culturas e mesmo do estado? 

* Efetivamente só quem desconhecer ou quiser obnubilar os fundamentos do cristianismo poderá não ver que os ‘primeiros cristãos’ foram e viveram como pessoas que lhes interessava acima de tudo o bem comum e não a mera satisfação dos seus interesses pessoais ou de grupo. Consultem-se os ‘sumários’ do livro dos Actos dos Apóstolos – 2,42-47; 4,32-35; 5,12-15 – e poderemos ver a semente de novidade que era a força da conversão a Cristo, na condução do Espírito Santo, em Igreja. 

* Será, apesar de tudo, uma espécie de condicionamento – para não lhe chamar mesmo manipulação ou leitura preconceituosa – que tenhamos – como fez nas suas palavras Marcelo – de conotar o ser católico com o ‘ser de direita’, tendo em conta uma dada leitura sociológica, com algum sabor ruralista, e mesmo com outros posicionamentos ideológicos e partidários, tentando apensar figuras do passado à vivência do presente ou ainda dando de barato que ser católico tem de estar numa posição de direita por ataque e em prejuízo social e cultural…  

* De facto, há uns tantos mentores da configuração da sociedade – ditos ou apelidados de ‘opinion makers’ ou jornalistas/comentadores – que não conseguem entender as questões do catolicismo e – numa espécie de sofisma envenenado – tentam concluir: não compreendo, logo é de direita…porque não ser de esquerda não rima com justiça social, com os conceitos de liberdade-igualdade-fraternidade, com pensamento de solidariedade, com fazer pelos outros…muito para além dos seus objetivos de promoção e de democracia.   

* Conhecemos e sabemos que houve figuras da Igreja católica que foram apelidadas de ‘esquerda’, só porque defendiam os pobrezinhos e estavam lá, à porta das empresas em rutura e falência, dizendo-se dum catolicismo social – seriam de esquerda ou estariam ser evangélicos acima de tudo? – mas que, no trato pessoal e fora dos holofotes da comunicação social, aceitavam opíparos almoços pagos por outros católicos que eram rotulados – pela mesma resma de servidores da informação – de direita!  

* A provocação de Marcelo pode servir para entreter por algum tempo, mas o que desejamos é que os católicos vivam na força do Evangelho, sem se deixarem manipular por rótulos ideológicos…esgotados!

 

António Sílvio Couto





terça-feira, 25 de abril de 2017

Porque Fátima incomoda…tanto?


Parece que quem pretenda ser falado – padre ou leigo, cristão ou agnóstico…seja qual for a religião ou a tendência ideológica – poderá dizer umas coisas – sobretudo contra – sobre Fátima e logo anda nas bocas do mundo…mesmo que por efémeros segundos de menos boa fama.  

Quem recorda ainda a petição lançada, em outubro do ano passado, contra a visita do Papa a Fátima agora em maio? Acabei de consultar a adesão – ou foi antes visita, como eu, por curiosidade – conseguiu o número de 1.070 (mil e setenta) peticionários…

Por estes dias um ex-membro dum governo estendeu-se nas suas considerações contra o que aconteceu em Fátima há cem anos e muito daquilo que, desde então, foi vivido por milhões de pessoas, crentes ou não… O tal articulista-deputado não deixou de mostrar, minimamente, o ferrete do avental, tal era a argumentação triangular, mas deixando perceber que o texto pareceu mais sermão por encomenda…do que contributo de reflexão intelectual séria, sensata e serena. 

= Quem se fizer visitador de Fátima – santuário e recinto, basílicas e capelinha, zona próxima e espaços envolventes…até comerciais e de restauração – é tocado pela expressão de tantos e tão díspares peregrinos. Mas quem entrar naquele espaço restrito ou alargado em atitude de peregrino é confrontado com milhentas vivências de pessoas, de famílias, de situações e de problemas… A questão é essa: Fátima tem uma policromia de espiritualidades, em que cada um precisa de ser visto, acolhido e sentido como cada qual…

Mal vai a nossa sintonia com Fátima se houver quem pretenda impor aos outros a sua mais pessoal (íntima ou intimista) experiência. Por isso, não se pode dar lições nem tão pouco fazer nivelar por si o que faz parte do património humano e cultural de tantas fés… mais ou menos conscientes, mais ou menos cristãs, mais ou menos católicas. 

= Mesmo que à sombra da ‘revolução de abril de 74’, Fátima continua a ter sentido e a dar identidade ao nosso parco país. Quem não terá já tido a vivência, no estrangeiro, de lhe ser perguntado de onde é e não saberem onde fica Portugal, mas logo percebem donde somos e quem somos, se dissermos que somos do país onde está Fátima.

A política dos três ‘fês’ – fado, futebol e Fátima – não foi invenção do Estado novo para entreter e camuflar as oposições ao regime. Tal como tão sabiamente disse o senhor cardeal Cerejeira: não foi a Igreja que impôs Fátima, foi Fátima que se impôs à Igreja…

Neste tributo de centralidade, poderemos entender o incómodo de certas forças que se viram vencidas pela promessa da Senhora vista pelos pastorinhos. Talvez seja um tanto confrangedor que se pretenda combater a quem não se reconhece existência nem possível credibilidade. Talvez possa ser um tanto quixotesco que ainda se dê ouvidos a pessoas que nada seriam se não andassem em busca dos seus fantasmas alumiados pelo fenómeno de Fátima…em Portugal e no mundo. 

= Ainda temos, cem anos depois, um longo caminho a percorrer para irmos passando da religião natural – das velas, das promessas, das situações meramente humanas e até algo mundanas – à capacidade de interpelação pelo Evangelho que Fátima e a sua mensagem nos trazem continuamente. Também aqui precisaremos de estar mais perto daqueles/as que fazem da sua ida a Fátima a sua expressão religiosa sem comunidade de fé. Também aqui precisaremos de passar do culto do sacrifício – desde o mais simples até ao percorrer de quilómetros a pé – mais ou menos por si mesmo e pela sua salvação individualista para a capacidade de aproveitar tudo o que me proporcionar oferecer em sacrifício pela salvação dos outros e do mundo pecador.   

Queira Deus que a celebração do ‘centenário das aparições’ não se fique só pelas coisas exteriores, mas antes consigamos todos viver um processo de conversão, aproveitando as críticas que nos possam fazer, desde que sinceras e bem-intencionadas.

Como dizia um padre (já falecido) num título dum livro contrapondo ao de outro (mais acintoso): Fátima, nunca mais ou nunca menos? Sim: Fátima sempre mais cristã e católica!

 

António Sílvio Couto

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Em contraciclo…pelo vinho?


Somos um país muito específico e, nalguns casos, andamos em contraciclo com o resto da Europa, senão mesmo do resto do mundo…em vários campos de atividade na atualidade…mais recente.

Quando a maioria dos países europeus já tinham saído das ditaduras e sacudido as tutelas colonialistas, nós só o fizemos quase trinta anos após o final da segunda guerra mundial. Quando se deu uma espécie de razia nas correntes marxistas – comunistas e socialistas, bem como outras mais radicais – nós, por cá, vemos uma razoável aceitação de tais ideologias, até com a sua ascensão ao poder. Quando lá por fora parecem surgir novos projetos políticos – reconstruindo-se dos cacos aqueles que ocuparam a governação – nós, por cá, ainda só surgem acenos de (ditos) independentes – sobretudo nas autarquias – que saltaram do arco da aceitação nos quadros de promoção. Quando tantos países se esforçaram por cimentar as suas contas públicas com medidas de rigor, por cá – como que por magia – essas ditas contas foram acertadas com tamanha rapidez que nem parece (totalmente) verdade, atendendo às reversões de medidas, antes consideradas essenciais, mas agora aliviadas com simpatias e sem austeridade…antes pelo contrário.

Entretanto, foi noticiado por estes dias que cada português consome, em média, cinquenta e quatro litros de vinho por ano. Se tivermos em conta a produção – quem ousa queixar-se agora da frase publicitária de antanho: ‘o vinho dá de comer a mais de um milhão de portugueses’? – com cerca de duzentos mil hectares de plantação e seis milhões de hectolitros de vinho produzidos, poderemos entender melhor a exportação de 2,8 milhões de hectolitros de vinho e uma receita de 734 milhões de euros… Deixemos as comparações estatísticas com outros países para sabermos o lugar que ocupamos. Podemos olhar para este sector económico como algo em franco progresso, tanto ao nível da ocupação de espaço no território como nos ganhos e proveitos conseguidos. Novamente vão surgindo programas televisivos de provas e de degustação vínica, uns vão aprendendo a saborear o ‘néctar dos deuses’ e outros tentam saber mais para apreciar melhor… Não há loja ou supermercado que não faça – regularmente – uma ‘feira de bebidas’ para tentar vender e conquistar clientela… 

= Perante estes cenários, poderemos colocar algumas questões, que podem ser respondidas ou não, tentando encontrar respostas que não sejam desculpas e tão pouco distrações.  

* Com tanta capacidade de produção de vinho, não seria melhor vivermos na valorização dos nossos produtos, rejeitando outras bebidas não-mediterrânicas e mais potenciadoras de maior alcoolismo, particularmente entre os mais novos?

* Com alguma promoção dos ‘independentes’, sobretudo, nas eleições autárquicas não estaremos a semear flocos de populismo, mesmo que disfarçados de defensores das (pretensas) populações, mas usando as ideologias que lhes sejam mais favoráveis ‘à la carte’?

* Agora que emerge uma nova vaga de sucesso, com números de desemprego a caírem em catadupa, será que os investidores sentem que vale a pena apostar numa classe trabalhadora que gasta sem ainda laborar ou iremos pagar, a muito curto prazo, as ilusões de sucesso sem trabalho?

* Os vendedores de sonhos e de regalias estarão a fazer as contas às maquinações disfarçadas de boa prestação das contas públicas, ludibriando a assunção das responsabilidades pessoais e familiares?

* As afirmações (quase) pírricas dalguns dos economistas não-comprados/vendidos ao sistema reinante continuarão a ser vistos como meros ‘velhos do restelo’ ou terão de ser ouvidos como profetas que avisam da desgraça já vivida há menos de dez anos? 

= Não acredito que tenhamos recuperado tão rapidamente da austeridade. Alguém está a mentir. Acreditar nas mentiras é da responsabilidade de cada um, mas levar para o atoleiro tudo e todos tem de ter um nome e os responsáveis têm – na hora da verdade – de ter cara, mesmo para serem castigados e julgados… Não basta deixar-se ir na onda da facilidade, pois os ‘donos disto tudo’ fazem-se pagar muito para além das meras conjeturas e das palavras de circunstância…

Não nos deixemos narcotizar com os eflúvios etílicos nem os vapores da reinação… Acorda, povo português!

 

António Sílvio Couto


terça-feira, 18 de abril de 2017

Ainda meio milhão de analfabetos…


Dados novamente divulgados, dizem-nos que, no nosso país, há quinhentas mil pessoas que não sabem ler nem escrever… Esta situação é-nos apresentada recorrentemente, tentando criar a consciencialização dum aspeto que nos deve fazer perceber que ainda falta muito para que cada um seja capaz de pensar pela sua cabeça, dado que lê, entende e interpreta o que leu…

A falta de escolarização tem levado a manter-se esta lacuna numa parte significativa da nossa população, abrangendo sobretudo pessoas idosas e que vivem nas regiões do interior do país…mas incluindo ainda mais de trinta mil entre os dezoito e os sessenta e cinco anos, mesmo em zonas urbanas de franja.

Quando se fala deste tema da escolarização logo vem à liça a penumbra obscurantista anterior à revolução de abril de 74, reportando-se a esse tempo cerca de 25% das pessoas que não sabiam ler nem escrever, enquanto hoje serão cinco por cento dos não-alfabetizados…

É bom ainda recordar a opção da telescola que se difundiu, em Portugal, a partir de 1965…e até 2004, sendo um recurso de acesso ao ensino básico mediatizado. Quanta gente aprendeu e se formou com base neste sistema televisivo, ganhando – como agora se diz – novas ferramentas para a sua valorização pessoal e social.

Apesar do retrocesso (ao que parece) crescente da taxa de analfabetismo, que razões continuam a existir para que sejamos ainda dos países da Europa com mais gente que não sabe ler nem escrever? Que há – ou pode haver – de estrutural para que não consigamos anular este défice social e cultural? Depois dalgumas campanhas em ordem à valorização da população mais desfavorecida em termos culturais, que razões se mantêm para que haja tanta resistência à melhor das heranças, que é isso de saber ler e escrever, pensar pela sua cabeça, ter opinião devidamente fundamentada?

Vejamos, um tanto brevemente, estes aspetos agora enunciados:

* Saber ler e escrever – De facto, é um grande valor ser capaz de pegar num livro ou num jornal, num panfleto ou numa mensagem e entender o que ali está escrito…seja qual for a língua. Com efeito, esta forma tão simples de comunicação – ler e escrever – tem todo o valor do mundo, quando se está com os outros. Não entender o que se diz nem o que nos querem dizer condiciona a nossa vida, em qualquer parte do mundo. Nunca seremos agradecidos quanto baste por termos tido quem nos ensinou a ler e a escrever, mesmo na diversidade das línguas aprendidas… Esta é a melhor fortuna que os pais podem deixar aos seus vindouros: as armas de defesa e de condução na vida…presente e futura. 

* Pensar pela sua cabeça – Efetivamente ter capacidade para pensar e organizar as suas ideias é algo muito essencial num tempo e num mundo onde a manipulação ganha prioridade sobre os mais incautos e indefesos…mesmo que saibam ler e escrever. A escolarização pode potenciar esta faculdade humana, mas ter capacidade de pensar, de forma organizada, segundo critérios e tendo em conta os valores, é algo que precisa de ser educado em toda a nossa vida. Precisamos de dar mais atenção, em todas as fases da nossa vida, ao exercício do pensamento, adequando as nossas possibilidades e exigindo a nós mesmos a adaptação a novas situações… A inteligência também se cuida como o resto do nosso corpo, alma e espírito!  

* Ter opinião devidamente formulada e fundamentada – Nesta época do ‘coppy-paste’ e dalguma futilidade do ‘faz-de-conta’, torna-se essencial que tenhamos opinião própria, fundamentada sobre critérios e valores – no nosso caso, reputamo-los de cristãos – que nos fazem viver como se pensa e não pensar meramente como se vive… Já nos primórdios do cristianismo se referia para ser capazes de explicar as razões da nossa esperança, isto é, de termos argumentos, ideias e objetivos que sejam exequíveis e não simplesmente regidos pelo ‘sim, porque sim’ ou o ‘não, porque não’… Quanta gente precisa de saber porque vota em determinado partido e não pela inócua razão de que confia no candidato…muito simpático e popular.

Depois de tentarmos fazer este percurso sobre algumas das possíveis razões (ainda) do nosso analfabetismo, precisamos, com urgência, de irmos formando círculos de reflexão onde se vá reconfigurando a matriz comunitária – que é muito mais do que essa do coletivo – do ser cristão, dando e recebendo, aprendendo e ensinando, partilhando e convivendo…na simplicidade e na alegria.

 

António Sílvio Couto


segunda-feira, 10 de abril de 2017

Denunciados…confirmam certas suspeitas?


Há umas semanas um tal ministro das coisas económicas (finanças ou economia, tesouro ou das contas de comprar e vender), dum país da Europa central – qual pêndulo das obrigações do norte para com as regalias do sul – deixou escapar que alguns países gastaram as ajudas para equilibrar as suas obrigações com dinheiro em ‘copos’ e outros (pretensos) vícios… aqui nos escusamos a referir essa outra categoria da tal retórica acusadora... Houve reações mais ou menos inflamadas, à mistura com o recurso a ironias ilustradas com pinturas de ‘ébrios’ holandeses… Uns tantos quiseram que o tal ministro caísse – por auto-demissão ou por votação em ordem à destituição – pedindo desculpa aos ofendidos, por sinal quase só os portugueses…e nem a afinidade partidária deixou que, por cá, invetivassem o senhor de forma menos agressiva… Lá pelos países baixos o tal ministro do dinheiro tinha acabado de perder – com estrondosa expressão – as eleições e nem sabemos se uma coisa – o que foi dito – poderia ser reflexo dalguns vapores etílicos – que ele via nos outros – usados para esquecer o desempenho em casa…

Entretanto, foi notícia nos últimos dias a expulsão, no sul de Espanha, dum numeroso grupo – dizem que mais de mil – de adolescentes/jovens dum hotel onde terão ocorrido distúrbios, prejuízos e ofensas… derivados do abuso do álcool e de outros devaneios mais ou menos graves. A serem assim os factos, estes estudantes – ao que parece ainda no final do ensino secundário – como que confirmaram, com atos e atitudes, aquilo que o tal ministro holandês disse semanas atrás… Não deixa de ser significativo que alguns pais (ao que se disse também serão professores) tenham vindo defender os seus rebentos, tentando atenuar as culpas e retorquindo sobre os culpados acusadores…

– Dizer que tudo isto é inquietante poderá parecer mais um recurso de pessoas ‘velhas’ (cotas no dizer dos novos), que não apreciam as liberdades dos mais novos e as tropelias própria da idade. Talvez possa ser dado este rótulo de antiquado, mas será que a diversão tem de prejudicar os outros e de deixar marcas para o futuro dos que, pretensamente, se divertem? 

– Como poderemos acreditar que seja preciso fazer uma festa de ‘finalistas’, quando nem o ano terminou e tão pouco o percurso de estudos atingiu uma parte significativa? Não se estará a permitir a exploração dos mais novos pelos mais velhos, que assim os manipulam, os enganam e os tentam ludibriar com festinhas sem nexo ou contexto?

– Até onde irá a (in)consciência de tantos pais/mães para deixarem ir filhos/filhas para tais eventos, pagando-lhes tudo (até cauções de prejuízos), sem terem percebido claramente onde os meteram? Não será que estes episódios denunciam a falta de autoridade dos progenitores, atirando para a escola a faculdade de educar, em vez de serem eles a assumirem-na como tarefa intransponível e necessária? 

– Qual a responsabilidade da escola em tais façanhas, que deixam má reputação dos seus alunos, que deviam ser, sobretudo, estudantes? Ou será que a fase da neo-adolescentização preenche os quadros docentes, equivalendo-se àqueles/as que deviam ensinar? 

= Porque acreditamos que os mais novos – adolescentes e jovens – são o futuro da nossa sociedade, cremos que será urgente apostar neles, ouvindo-os e fazendo-lhes perguntas. Muito mal irá uma sociedade se não souber escutar os mais novos, pois eles/elas têm ideais, que podem mudar o que, em seu entendimento, não está bem agora. Só quem tenha sido adolescente e jovem a sério – com idênticos desejos e pretensões de mudança – poderá entender o que eles/elas querem, sem lhes coartar as asas, mas antes esperando que voem e aceitando que errem, sem lhes cobrar as asneiras, mas antes fazendo-os/as aprender com seus erros e as menos boas opções...

Não deixa de ser sintomático que o Papa Francisco tenha convocado um sínodo, para outubro de 2018, com o tema: ‘a juventude, a fé e o discernimento vocacional’. Respigamos algumas palavras que o Papa proferiu, no passado domingo, dia mundial a juventude: «O mundo de hoje precisa de jovens ativos, dinâmicos, que sintam que a sua vida é uma vocação, uma experiência em caminho. O mundo só poderá mudar com jovens assim… Falta educação, falta integração, tantos precisam de sair, migrar para outras terras. É duro de dizer, mas os jovens de hoje são frequentemente material descartável. Nós não podemos tolerar isto»!

 

António Sílvio Couto



sexta-feira, 7 de abril de 2017

Num país carente…de comida em qualidade



Parece que não há canal televisivo – em sistema aberto ou por cabo – onde não apareça, de forma habitual ou circunstancial – um programa onde se cozinhe, se aprenda a fazê-lo melhor ou mesmo onde sejam avaliados os confecionadores e aquilo que é cozinhado… E, assim, de repente, a arte da cozinha virou moda e o comer – mais o bem do que o muito – um atributo cuidado e valorizado pelos entendidos na matéria e mesmo pelo grande público.
= Qual poderá ser a razão desta efervescência sobre a matéria da cozinha e da comida? Que temos agora de tão importante para estarmos a interessar-nos por uma das mais básicas necessidades humana, o comer? Andaremos ainda a resolver o essencial, quando julgávamos estar noutra fase evolutiva da sociedade? Com tanta exaltação da arte de cozinhar, estaremos a atender a quem não tem ainda o mínimo para comer, no seu dia-a-dia? Porque é que os cuidados de alimentação não se repercutem na qualidade de saúde, de forma mais generalizada? Até onde irá esta ‘religião da comida’, com tantos gurus e mentores avalisados? Não será que muita gente vive mais para comer do que come – melhor ou menos bem – para viver? 
= Não deixa de ser, suficientemente, sintomático que muitas das festas religiosas de teor tradicional, sobretudo, de âmbito cristão, sejam mais aferidas pela gastronomia do que pelas razões que levam a usar tais ingredientes, condimentos e pitéus… Talvez nem toda a gente atenda, por exemplo, que o cabrito – ou noutras regiões o borrego, o anho ou outra denominação – tem raízes na tradição da páscoa judaica, que, por seu turno, se alicerça na experiência libertadora da páscoa egípcia… Precisamos, com toda a urgência, de passar daquilo que reputamos de tradicional para o que dá sentido às coisas e aos (pretensos) momentos de festa… ou ficaremos a usufruir das consequências sem aceitar – racional e razoavelmente – viver as causas. Dá a impressão que a comida vai-nos preenchendo, mesmo sem sabermos os motivos mais profundos…     
= Neste mundo globalizado estão como que criadas as condições para sabermos elevar a componente humana e cultural da vertente da gastronomia, fazendo-a subir ao patamar de ação que faz das pessoas alguém mais fraterno/solidário e não meramente comensal de ocasião. Com efeito, a proliferação de restaurantes tem vindo a destruturar a família, tornando-a um mero espaço onde já nem se cozinha, com as consequências de a casa de habitação se ir esfriando, pois o lugar da confeção dos alimentos deixou de irradiar o calor físico e, por vezes, humano compartilhado entre todos. De facto, se se apagar a lareira como irá subsistir o lar? Este faz-se, alimenta-se e cimenta-se à volta daquela… aí onde as estórias de todos são assimiladas por cada um e onde cada qual se torna construtor de algo que faz e dinamiza a sua família. Por isso, alimentar-se à mesma mesa não pode ser uma exceção, mas a exceção é que nunca poderá deixar de ser a regra…
= Sem se pretender encontrar culpas nem ir à caçar de culpados, parece que temos – digo, particularmente, de forma cristã – de valorizar cada vez mais a mesa de família, revendo métodos e tratando de cuidar as razões que têm vindo a criar crises à família, começando pelo mais simples e fazendo o esforço por fazer das refeições os momentos mais sagrados de cada dia, sem aceitarmos desculpas ou outros artefactos sociais, associativos ou mesmo eclesiais. Neste tempo tão agressivo para com a família, vigiemos para que não se introduzam venenos nem vícios que poderão trazer consequências devastadoras no presente e no futuro próximo. Encontradas algumas das razões em estar contra a família, tentemos ser corajosos e ponhamos em prática as medidas que salvaguardem a nossa família… Não aconteça de estarmos todos à mesma mesa, mas fazendo cada qual conversa através do tlm ao longe ou mais perto…
Por certo cada família tem uma especialidade gastronómica que todos apreciam. Recorramos a ela para vivermos mais unidos e familiarmente em maior comunhão! Façamos festa à mesa do nosso lar e a nossa família sem manterá mais viva e com vida…    


 


António Sílvio Couto




quinta-feira, 6 de abril de 2017

Hibernação eucaliptal


Quem visite o nosso país e quem leia ou veja notícias deste torrão à beira mar plantado poderá ser levado a concluir: vive-se num país onde não há greves, não se verifica contestação a nada nem a ninguém – no sentido político – e até certas instituições tão intervencionistas, como o tribunal constitucional ou mesmo a comunicação social vivem num quase anonimato e sem se dar por eles…

Fique claro que não sou defensor da alteração da ordem pública ou do conflito sem mais, antes pelo contrário, advogo que se procure viver e fazer por viver em harmonia e concórdia entre todos, particularmente para com os que pensam de forma diferente, defendendo o direito à opinião, com liberdade e responsabilidade.

Mas o que me faz confusão é esta hibernação de sindicatos – em especial em setores tão atribulados como os transportes, a educação, a saúde ou mesmo a segurança (social ou de ordem pública) – e um certo fenómeno de eucaliptização duma grande parte dos contestatários e seus sequazes, bem como uma espécie de amorfismo em que estamos a viver coletiva e individualmente.

Sabemos como o eucalipto seca tudo em volta de si, sugando as fontes de alimentação até ao mais profundo da condição ambiente à sua volta. Não será isto que está a verificar-se com certas forças ideológico-partidárias? Conseguidos os intentos de atingir o poder, não há como saber calar e manietar quem não alinha nas pretensões ansiadas… Vemos que, hoje, quem achava pensar de forma diferente da maioria dominante ficou sem espaço de intervenção e nem mesmo uma dita comunicação extra-regime se faz eco de qualquer discordância, por mais subtil que possa insinuar-se… 

= Ao nível do mais alto dignitário da nação vemos que tudo está conciliado e nota-se um clima conciliador… com cheiro a populismo. Mas será que é isso que o resto dos cidadãos precisam? Onde está a voz tribunícia, que se ergue em defesa de quem não se revê neste sistema de condução dos destinos coletivos? Não foi para isto que foi eleito o presidente da república para ser uma espécie de caixa-de-ressonância dos interesses partidários instalados na governação por acordo nas catacumbas do parlamento… Não foi para vermos como porta-voz de conluios entre forças patrióticas de internacionalismos, que o mais alto dignitário se limita a não fazer ondas nem a assumir-se efetivamente como defensor dos mais fragilizados, antes a ser visto como comensal duma parte do eleitorado, que nem foi o dele…na origem.  

= Cresce, entretanto, uma onda de individualismo por entre as posições da maioria dos cidadãos nacionais. Já lá vai o tempo dum certo idealismo da partilha, que caraterizou os primeiros anos após a revolução abrilina. Excluindo os exageros de tantos que se aproveitaram da inépcia duma parte significativa da população, houve tempos em que éramos um povo mais solidário e nem os atropelos cometidos por uns tantos habilidosos deixou de gerar uma força de atenção aos outros e, sobretudo, aos mais desfavorecidos. Dessa época já restam poucos desses idealistas…com tino e bom senso.

Hoje vivemos – num galopante sentimento de incómodo – mais fechados aos outros, nesse egoísmo individualista que coloca o eu em primeiro lugar e só no final da lista os outros…mesmo familiares. As remessas de fundos vindos da Europa – com mais fulgor na década de 90 do século passado – foram-nos tornando mais e mais refinadamente interesseiros, fechando as mãos e cerrando os punhos, que antes eram de contestação, para se irem tornando sinais de posse e de possessão endeusada de bem-estar ou de exaltação dos direitos…adquiridos, sabe-se lá com que legitimidade.

Nalguns casos nem as instituições e os responsáveis religiosos ficaram à margem desta onda de materialismo prático, já que os resquícios do pragmatismo dialético foram sendo aveludados com promessas e recebimento de subsídios ao não-trabalho. Quanta habilidade foi emergindo em tantas situações, que descobertas mais tarde, se tornaram focos de escândalo e matéria de más notícias…

Efetivamente, a hibernação eucaliptal tem vindo a ser conduzida – ou será manipulada? – sem nos darmos conta com clareza, podendo cada um de nós correr o risco de pensar à maneira do modo como vive e não a viver à maneira daquilo que pensa… com valores e critérios mais humanos porque mais cristãos!

   

António Sílvio Couto



quarta-feira, 5 de abril de 2017

Dores da família…na Senhora da Soledade


Uma das imagens mais simbólicas do tempo da semana santa é a representação de Nossa Senhora das Dores: ela está presente em tantos dos momentos de religiosidade (procissões de Passos ou teatros populares) e resume a vivência, por excelência, da Mãe para com seu Filho no mistério da sua paixão-morte-ressurreição.

Se atendermos ainda ao tema da família poderemos ver com mais acutilância as dores da Senhora da Soledade, da Piedade, das Angústias… a ‘Mater Dolorosa’, se bem que Ela seja a expressão de tantas das dores da própria família.

Seguiremos, por contraste, a narrativa de São Paulo aos coríntios (1 Cor 13,4-7) para tentarmos aglutinar em sete (numa visão tradicional) as dores da Senhora naquilo que à família diz (ou pode dizer) respeito: ira, inveja, orgulho, mentira, violência, ofensa, vingança… por contraste com paciência, aceitação/tudo espera, confiança/humildade, verdade/tudo crê, amável/sem violência, perdão/amor, paz/tudo desculpa, tudo suporta.

Na exortação apostólica pós-sinodal ‘A alegria do amor’ (n.os 89-119), o Papa Francisco faz uma leitura muito pertinente sobre cada uma destas caraterísticas do amor humano e espiritual, colocando algumas diretrizes para vivermos na consonância da potencialidade com que os cristãos podem e devem viver a sua relação uns com os outros e todos em sintonia com Jesus na Igreja católica…

Respigaremos algumas dessas vertentes na consolação que queremos dar e receber de Nossa Senhora, passando das suas dores à vivência do amor em família, como família e para a família.

As dores da família repercutem-se na Senhora da Soledade, que continua a acompanhar, hoje, todos quantos se sentem submetidos às mais rudes provações, muitas delas no seio da própria família e outras geradas e acentuadas pelos critérios mundanos com que, de tantos modos, nos vamos socorrendo e enganando…mesmo sem disso nos darmos conta.

* À ira contrapomos a paciência – «Uma pessoa mostra-se paciente, quando não se deixa levar pelos impulsos interiores e evita agredir» (n.º 91) – Entregamos à mãe das dores as situações de agressividade, para que a família não seja, hoje nem nunca, um campo de batalha sem vencedores…

* À inveja propomos a aceitação, tudo esperando – «A inveja é uma tristeza pelo bem alheio, demonstrando que não nos interessa a felicidade dos outros, porque estamos concentrados exclusivamente no nosso bem-estar» (n.º 95) – Apresentamos à mãe das dores quantas amarguras e desesperos que consomem as famílias, criando, por vezes, menos boa aceitação uns para com os outros…e entre si.

* Ao orgulho contrapomos a confiança pela humildade – O ‘amor não é arrogante’… [isto é] não se «engrandece» diante dos outros; mas indica algo de mais subtil» (n.º 97) – Na medida em que todos se aceitam e onde todos se procuram servir com estima, sinceridade e admiração…

* Perante a mentira propomos a verdade/tudo crê – «Como se diz muitas vezes, para amar os outros, é preciso primeiro amar-se a si mesmo» (n.º 101) – Com a Senhora da Soledade queremos aprender a amar mais os outros do que desejando ser amado, sendo transparentes uns com os outros, vivendo e dando liberdade sem aprisionar ninguém…nem pelo pretenso amor.

* À violência (interior e exterior) responder com amabilidade – «Para restabelecer a harmonia familiar basta um pequeno gesto, uma coisa de nada. É suficiente uma carícia, sem palavras. Mas nunca permitais que o dia em família termine sem fazer as pazes’» (n.º 104) – Entregando à Senhora das Angústias as agruras da família poderemos viver a cortesia como escola de sensibilidade e de altruísmo com pequenos gestos de ternura e carinho entre todos…sem distinção nem preconceitos.

* Combater a ofensa com o perdão/amor – «O perdão fundado numa atitude positiva que procura compreender a fraqueza alheia e encontrar desculpas para a outra pessoa» (n.º 105) – Será com a Senhora da Piedade que poderemos viver a dinâmica de sermos perdoados e de termos capacidade de perdoar a nós mesmos e uns para com os outros… porque todos perdoados por Deus.

* À vingança contrapomos a paz, tudo desculpando e tudo suportando – «O amor não se deixa dominar pelo ressentimento, o desprezo das pessoas, o desejo de se lamentar ou vingar de alguma coisa» (n.º 119) – Quem melhor do que a Senhora de-ao-pé-da-cruz para nos ensinar a paz e o abandono nas mãos do Pai, por Jesus, no Espírito Santo!

 

António Sílvio Couto




segunda-feira, 3 de abril de 2017

Promover e dar voz às famílias


‘Vivemos num mundo que parece querer fechar-se. Se queremos mudar temos de promover e dar voz às famílias’, de modo a que se defenda um mundo mais humano – disse D. José Ornelas, no domingo, dia 2 de abril, no santuário de Cristo Rei, Almada.

O Bispo de Setúbal intervinha na quarta e última catequese quaresmal, subordinada ao tema: Igreja, família de famílias. Esta catequese esteve integrada ainda no ‘dia diocesano da família’, que decorreu naquele santuário e reuniu centenas de famílias de toda a diocese… muitas delas com crianças ainda pequenas.

Esta quarta catequese teve três aspetos: do eu ao nós; Igreja-família; irmãos e irmãs ao serviço da grande família de Deus. 

= ‘A família é o espaço onde o encontro se faz carinho’, referiu D. José Ornelas, pois a ‘dinâmica do ‘eu ao nós’ não se fecha na própria família/casa’, na medida em que ‘é na abertura às outras famílias que se desenvolvem os povos’. Neste sentido, o Bispo de Setúbal apelou para que ‘os movimentos de cariz familiar devem estar atentos e dinamizados’, por forma a intervirem, no processo de humanização, onde a família deve contar… 

= Na segunda parte da catequese, D. José Ornelas centrou a sua atenção numa passagem bíblica onde se refere a escolha dos doze apóstolos e de faz o confronto com a família de sangue em Jesus passando para a família da fé. ‘Jesus rejeita a família fechada, controlada’, defendendo que ‘a verdadeira vocação da família humana tem como horizonte a paternidade/maternidade do Pai do Céu’. Com efeito, ‘Jesus leva o espírito de família para dentro da comunidade’. O Bispo de Setúbal realçou duas figuras que caraterizam a Igreja – mãe e irmão/irmã, com a ‘função materna que transmite a vida, educa e cuida dos mais débeis’, tipificada em Maria e a dimensão fraterna – irmão/irmã – que são ‘consequência da maternidade da Igreja’. 

= Na última parte desta catequese, D. José Ornelas falou da vocação dos padres e consagrados/as como irmãos e irmãs chamados a estar ao serviço da grande família de Deus. Partindo da consideração de que estas pessoas ‘não são incapazes de afeto’ nem seguiram esta vida (vocação) por traumas de teor afetivo, o Bispo de Setúbal referiu que ‘quem não tenha coração de pai não pode ser padre nem quem não tiver coração de mãe não pode ser consagrada’. Atendendo a isso, D. José Ornelas salientou ainda que estas vocações ‘não podem prescindir do amor ou, então, seriam inúteis’. Estes vocacionados têm de viver ‘em diálogo com Deus e com os outros’ ao longo de toda a sua vida, pois devem ‘aprender a serem irmãos e irmãs com os outros’.  

* Ao longo desta quaresma a Igreja de Setúbal pode escutar o seu Bispo em ensino sobre a temática da família. Foram momentos interessantes e que reputamos de importantes não só pela urgência do tema, mas também pela faculdade de podermos aprender em comum as linhas essenciais do ministério do nosso Bispo. As vertentes analisadas foram simples e em linguagem entendível, tanto para clérigos como para leigos. Em geral houve interesse por parte dos ouvintes, embora pareça que uma grande parte ainda se limita a fixar de ouvido, o que nem sempre deixa grandes marcas para além da audição momentânea. Apesar do recurso às gravações/filmagens seria de todo importante investir na tomada de notas para reflexão pessoal e familiar…  

* Um outro aspeto a ter em conta de futuro deveria ser a participação sistemática em todos os subtemas – o conjunto é que faz a totalidade – bem como deveriam ser relativizadas todas as outras ações particulares – por muito importantes ou tradicionais que possam ser – tanto de paróquias como de movimentos e outras devoções. Dá a impressão que temos ainda um longo caminho a fazer e a partilhar. Parece que o principal e essencial interesse dos leigos como que repercute o entendimento e a participação dos seus responsáveis, nessa subtil linguagem de alguém se dizia, por contraste, se o Papa fala e os bispos não ouvem; se os bispos falam e os padres não escutam; como poderão os leigos escutar se veem que os seus guias não dão o exemplo… Não basta mandar, é preciso ter autoridade… na família, na paróquia, na diocese! 

 

António Sílvio Couto