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sábado, 10 de agosto de 2024

Qual é a pressa?

 

Neste tempo dito de férias como que impressiona a pressa – velocidade, rudeza e mesmo falta de educação – de alguns dos nossos contemporâneos. Alguns são residentes por cá todo o ano, outros deslocam-se em férias ao torrão-natal e tantos ainda aproveitam para por aqui passarem o seu tempo de pretenso descanso. Por vezes a pressa nas intenções esbarra na lentidão dos serviços, tantos são os que estão de férias e não houve diligente atenção em dar continuidade ao essencial e necessário.

1. Pode parecer um caso de fulanização, mas é real: uma máquina de lavar roupa avariou; dizem que, no ato de compra, é dada assistência ao produto; no entanto, não foi dito que, se fosse no verão, os prazos de resolver a ocorrência não têm cumprimento…Assim, decorridas hora de tentativa telefónica foi apontada que a solução teria de esperar a possibilidade de um técnico, até porque se está em tempo de férias e houve um problema informático (boa desculpa recorrente para ludibriar quem espera) a agravar a não-possibilidade de assistência. Aqui a pressa anda pelo contraste justificativo…na lentidão e nas desculpas.

2. O que leva tantas pessoas a andarem em registo de pressa? Será esse um movimento interior ou meramente exterior? Não haverá, em certas circunstâncias das pessoas, uma tendência em quererem dar um ar de atarefadas e com isso parecer que tocam muitas tarefas, embora superficialmente? Nalguns setores da vida e da sociedade – dizemo-lo mesmo do campo da Igreja e na expressão da fé – não seria mais convincente menos pressa e mais ponderação? Até onde pode ir a menos boa capacidade de acolhimento numa pessoa que se apresenta como muito atarefada e sob o signo da pressa?

3. Recorrendo a sabedoria popular, encontramos o seguinte adágio: ‘depressa e bem, há pouco quem’. Quererá isto dizer que a pressa é inimiga da qualidade e que esta exige ponderação, bom senso e discernimento. Não será ainda um aviso ao pretenso improviso à portuguesa, onde o desenrascanço faz mais do que a capacidade de saber fazer bem? Todos sabemos – mais ou menos por experiência – que temos uma capacidade (quase) inata para, à última da hora, fazer com que as coisas e mesmo as palavras pareçam fluir, sem que outros sem aperceberam da habilidade…

4. Cada vez mais nada funciona sem programação simples e objetiva, delineando as etapas a percorrer, as ferramentas a utilizar, os objetivos a atingir, prevendo o mais possível as contrariedades pessoais e de grupo. O epíteto que nos é dado, na Europa, de que os ‘portugueses são bons trabalhadores’ vem-nos de nos inserirmos em sociedades organizadas e com pouco recurso ao improviso, de empresas onde todos sabem a sua tarefa e não andam à deriva e fazendo fora das competências de cada um. Este esquema é exatamente lutar contra a pressa no pensar e no agir. A calendarização do que se pretende executar faz parte do combate à pressa, muitas vezes, sem nexo nem da avaliação das consequências.

5. Centro a atenção no setor da Igreja, particularmente na vida das paróquias. Quantas vezes podemos ver (real ou exageradamente) os responsáveis atarefados, correndo de um lado para o outro, julgando dar resposta às questões que lhe são colocadas, nalguns casos fora do lugar devido e em tempo e horas desadequadas. Desde logo deveria haver um princípio: coisas sérias tratam-se de forma séria e sensata, sem discussões nem palavras atropeladas. Deve haver a buscar de soluções, dialogando entre todas as partes. Quem perceber que tem diante de si um interlocutor que não se deixa condicionar pela pressa, aprenderá a ver as questões pelo bem comum do que pela satisfação de alguma das partes intervenientes. Dizer a verdade e só a verdade tornará um apressado nalguém que refreia os seus ímpetos…

6. [Se estiver confuso, pare e ore!] Pois Deus não é Deus de desordem, mas de paz (1 Cor 14,33a).



António Sílvio Couto

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