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quarta-feira, 21 de agosto de 2024

Oniomania – na sociedade de consumo ou de desperdício?

 


A compulsão por compras, chamada de consumismo compulsivo ou, cientificamente, como oniomania, é um transtorno psicológico que tende a ser sinal de carências e de dificuldade nos relacionamentos interpessoais. Este fenómeno carateriza-se por pessoas que compram muitas coisas, nalguns casos desnecessárias, podendo isso revelar problemas emocionais graves e devendo essas pessoas procurar alguma forma de tratamento.

Segundo os especialistas, esse problema afeta mais as mulheres do que os homens e tende a aparecer por volta dos dezoito anos de idade.

1. Quais os principais sintomas de oniomania? Eis alguns dos aspetos a ter em conta (a nível pessoal e/ou social) como sintomas de oniomania: comprar itens repetidos, esconder as compras da família e amigos, mentir em relação às compras, recorrer a empréstimos bancários ou na família para compras, descontrole financeiro, fazer compras com o objetivo de lidar com as angústias, tristezas e preocupações, sentimento de culpa após compras, mas que não impede de comprar novamente.

Atendendo a esta caraterização poderemos considerar que muitas pessoas que são consumistas compulsivas compram na tentativa de terem sensação de prazer e de bem-estar e, dessa forma, consideram as compras como uma espécie de remédio para as tristezas e frustrações. Por isso, a oniomania pode passar muitas vezes desapercebida, só sendo notada quando a pessoa deixa manifestar graves problemas financeiros…



2. Não será que vivemos, mais ou menos, numa oniomania coletiva não assumida, embora suficientemente praticada? Não andaremos a rotular de consumismo isso que nos faz entrar, inadvertidamente, numa sociedade do desperdício camuflado e quase inconsciente? Até que ponto não vivemos mais na aparência em não-assumirmos os nossos defeitos do que em aceitarmos e corrigirmos a crescente onda de materialismo prático e consentido? Não sofremos todos desta subtil doença?



3. Por diversas vezes no tempo do seu pontificado, o Papa Francisco nos tem advertido para a promoção e a vivência da ‘cultura do descarte’, em muitas situações apresentada como a ‘cultura da indiferença’ para com os outros. Em tempos houve quem caraterizasse esta atitude de quase desprezo pelos outros como a ‘sociedade chiclete’, isto é, do mastiga-e-deita-fora, pois já não tem mais préstimo nem valor, dado o uso senão mesmo abuso. Agora como que vivemos na onda daquilo que antes era exceção, mas se tornou normalidade e do modo de ser e de estar. De facto, empanturramo-nos com coisas materiais, muitas delas sem valor nem qualidade, para vivermos ao ritmo daquilo que todos fazem e assim vivem…



4. Nesta sociedade neocapitalista com laivos de marxismo de Estado, vamos sentindo como normal o excesso de coisas, desde a mais tenra idade: as crianças são educadas no esbanjamento de tudo e de mais que lhe possam dar, mesmo sem pedirem. Com que facilidade se deixa desperdiçar comida, sem fazer olhar para quem – mais perto ou mais longe – não tem o essencial. Quem não terá já visto crianças a jogarem como se fosse uma bola com pão. Quem não fez ou permitiu que fizessem pequenas birras só porque não se gosta de uma comida e se prefere outra, mesmo que seja menos adequada. Com que facilidade se troca de telemóvel só para estar na moda do mais recente e pretensamente melhor…



5. Haverá, então, espaço para a mentalidade da poupança e do aferrolhar para o dia de amanhã? Não andaremos mais na vertigem de tudo querer-sem-olhar-a-meios, mesmo que isso possa hipotecar o futuro? Como se concilia a capacidade de compra com a necessidade de poupar das pessoas e das famílias? Certas políticas de ‘estado social’ não serão mais propícias à oniomania do que à sugestão de poupar, pois não se sabe o futuro? A geração de Portugal na União Europeia (desde 1986) não decapitou os que aprenderam a poupar nos tempos da segunda guerra mundial? Será que já esquecemos as lições do ‘bloco de leste’ caído em 1989? A sociedade ocidental e a Europa em particular correm sérios riscos. Ainda não o vimos?



António Sílvio Couto

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