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quinta-feira, 5 de dezembro de 2019

Parfois… again… todavía (às vezes… novamente … ainda)


Estas três palavras de idiomas diferentes – ‘parfois’ (por vezes, às vezes) do francês, ‘again’ (outra vez, novamente) do inglês e ‘todavía’ (ainda) do castelhano – podem servir-nos para lançarmos alguns olhares sobre coisas e loisas do nosso tempo.

 

* Às vezes (‘parfois’) vemos situações pouco fáceis de entender, tal é a complexidade dos factos e mesmo a desenvoltura dos meandros… Vejamos casos concretos, mas que podiam ser tantos outros… A iniciativa com cerca de trinta anos (1991) que é ‘banco alimentar contra a fome’. Nela por vezes podemos ver a solidariedade dos portugueses para com 2.300 instituições de assistência, que envolve quase quatrocentas mil pessoas ajudadas. Mas não será uma espécie de ‘profissionalização’ de tantos pobres que dele se socorrem habitualmente? Muitas dessas instituições não se manterão como correias de comunicação de ações de resignação, quando deveriam ser mais ousadas do que retardadoras da saída do estado de pobreza? O sucesso das campanhas não será narcótico para um nível de acomodação mesmo dos poderes políticos e sociais? A ação de voluntariado não poderá correr o risco de se tornar mais uma passerelle de vaidades e não de contributo com desprendimento pelos outros?

 

* Novamente/outra vez (‘again’) poderemos ler tantas das ajudas natalícias mais como contributos de alienação do que como vivências de partilha…para com os (ditos/conotados) desfavorecidos. Dá a impressão que os ‘pobres’ só comem pelo natal ou só precisam de ajuda quando a maioria vive nos excessos…

De igual forma temos de estar atentos à crescente correria com que se caminha no convite ao despesismo pessoal, familiar e coletivo… Apesar de termos ainda na memória a ‘crise do subprime’ de 2008 – foi há pouco mais de dez anos – vemos estarem a ser criadas as condições para voltarmos outra vez à casa de partida desse jogo que tanto custou a ganhar, mas que alguns querem fazer-nos reviver. A diletância de uns tantos vai custar a todos. O pior é serem quase-sempre os mesmos a serem os causadores e a entregarem outra vez aos mesmos a tarefa de recuperação! Não aprendemos nada com a história…

 

* Ainda (‘todavía’) precisamos de mais avisos para não continuarmos a persistir nos riscos? De facto, os atos folclóricos a propósito das alterações climáticas trouxeram à luz do dia certas figuras de outras batalhas, quase sempre, comandadas por uma certa esquerda – caviar ou presunçosa – para quem pensar de forma diferentes deles é ser aquilo que dizem combater. Ainda estão na fase infantil das suas certezas, apelidando os outros com rótulos que lhes assentariam com profícua eficiência e igual rigor.

Não deixa de ser irónico que se combata contra as alterações climáticas, mas se assoem com lenços de papel em vez de lenços laváveis e reutilizáveis ou que cuidem dos filhos – se os têm – substituindo-lhes as fraldas descartáveis… Ainda nos falta um razoável percurso para sermos, no mínimo, coerentes e respeitadores dos outros e não só afáveis para com os da nossa cor clubística ou ideológica!

 

= Numa época de convite à simplicidade de vida, que é a tonalidade do Natal, deixamos excertos da recente carta apostólica do Papa Francisco, ‘O sinal admirável’: «Nos nossos Presépios, costumamos colocar muitas figuras simbólicas. Em primeiro lugar, as de mendigos e pessoas que não conhecem outra abundância a não ser a do coração... Os pobres são os privilegiados deste mistério e, muitas vezes, aqueles que melhor conseguem reconhecer a presença de Deus no meio de nós...Muitas vezes, as crianças (mas os adultos também!) gostam de acrescentar, no Presépio, outras figuras que parecem não ter qualquer relação com as narrações do Evangelho... Do pastor ao ferreiro, do padeiro aos músicos, das mulheres com a bilha de água ao ombro às crianças que brincam… Por todo o lado e na forma que for, o Presépio narra o amor de Deus, o Deus que se fez menino para nos dizer quão próximo está de cada ser humano, independentemente da condição em que este se encontre» (n.os 6 e 10).       

 

António Sílvio Couto

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