Foi estribilho publicitário recente: tudo o que se
leva desta vida está no…
Embora se possa considerar uma frase algo oca, ela
como que resume a vida – existência, trabalho, consumições, energias e
sofrimentos – de tantas pessoas, que, desse modo, se vão catapultando para o
resto do tempo…neste mundo.
Olhando objetivamente o ‘viver para comer’ é elevado
ao extremo na dita ‘tarde do fogareiro’, que ocorre neste dia 13 de setembro
(6.ª feira), na Moita. São milhares de pessoas, muitas delas vindas de fora do
concelho, que passam quase doze horas a comer e a beber, até que mais não
consigam suportar. Por vezes há cenas a roçar o degradante, tal o descontrolo,
um certo exagero e até a desproporção entre o razoável e o irracional. Não há a
mínima distinção entre homens ou mulheres, seja qual for a idade… tudo parece
excessivo, até mesmo o barulho (musical, de convívio ou de confusão), senão
mesmo a provocação!
Com mais de uma década de ‘tradição’, este evento da
‘tarde do fogareiro’ foi crescendo em aspetos quase incontroláveis pelas
autoridades, gerando-se, assim, um foco de possível conflitualidade, senão em
ato, ao menos, em potência. Com efeito, o consumo algo exacerbado de bebidas
poderá potenciar conflitos irrazoáveis, notando-se um excesso de pequenos egos,
que se vão justapondo uns aos outros, podendo chispar em maré mais acesa ou,
sei lá, menos mortiça.
Será que o convívio, a confraternização, a animação
têm de revestir esta faceta de exagero? Com tantos sinais de prosperidade, não
haverá condicionamentos financeiros – familiares e pessoais – para o resto do
mês? Não se terá acendido uma mecha que, crescendo a chama, será muito difícil
de controlar? O aumento em número de participantes não terá feito diminuir a
qualidade desse tempo de convivialidade? Terá sido acompanhada este
acontecimento com ações de civismo perante a difusão deste fenómeno, que
precisa de ser estudado com mais seriedade?
Estas e outras perguntas podem surgir quando já está
a decorrer mais uma edição da ‘tarde do fogareiro’. No entanto, outros aspetos
precisam de ser cuidados para que não estejamos a embarcar em mais uma
alienação bem urdida por quem governa e, assim, distrair – ‘com pão e jogos’ –
os potenciais descontentes de outros assuntos (mais sérios) da vida. Quem se
lembra dos milhões que morrem, hoje, de fome, e nós, aqui, a esbanjar? Quem se
lembrará de levantar os olhos para o Alto, tentando discernir o que há (ou pode
haver) de civilizado em tudo isto?
De facto, consta que, na fase de decadência do
império romano do ocidente, o povo se entretinha em orgias e bacanais. Ora,
estas eram celebrações em honra do deus Baco – o deus do vinho – por ocasiões
das vindimas. Não estamos nós também na época das vindimas? Tais festas romanas
cresceram de forma muito rápida e foram aproveitadas para ajustes de contas…até
políticas? Para quando esta vertente socio-ética nos eventos promovidos e
realizados?
Há coincidências que podem incomodar. Temos de ser
mais racionais e de tentarmos descortinar se este ‘viver para comer’ não será
mais uma artimanha de neopaganismo com que temos vindo a conviver de foram
crescente?
Numa palavra: não deixemos que os acontecimentos nos
ultrapassem pela negligência e a falta de senso…
António Sílvio Couto
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