Apareceu na comunicação social com algum destaque e
forte promoção: vendem-se abraços, alugam-se companheiros de passeio, amigos e
até mães.
Esta tendência – explorada particularmente à
americana – trouxe mais à luz do dia o tema da solidão, considerada já uma
pandemia em certos lugares… com a inclusão de jovens entre os dezoito e os
vinte e dois anos, considerados a tal ‘geração z’ dos nativos digitais.
Ora, para atenuar os efeitos da solidão vão surgindo
serviços de companhia com preços e com sugestões variáveis ao gosto do freguês,
segundo as capacidades dos trabalhos prestados e os montantes cobrados.
= Ensaiemos uma espécie de definição de termos,
delimitando ainda o preçário mais ou menos conhecido pela execução dos préstimos
usados.
– ‘Geração Z’
– os ditos nativos digitais, nascidos entre 1990 e 2010, muito familiarizados
com a internet, com os telemóveis, vivendo no ‘sempre conectado’, têm uma forte
compreensão da tecnologia e da abertura social às tecnologias; vivem um
sentimento de insatisfação e de insegurança quanto à realidade e ao futuro da
economia e da política; o seu habitat é o do desemprego e da precariedade; mais
do que as gerações anteriores (*) esta geração é tida como mais tolerante e
aberta, em questões de índole moral, quanto à legalização de relacionamentos
entre pessoas do mesmo sexo, que é considerado mais na vertente da igualdade de
género…
– Perante essa tal pandemia da solidão quais são os
serviços apresentados para a combater e quais os custos? Usamos os nomes
traduzidos – ‘passeador de pessoas’ de seis a dezanove euros, fazem companhia
de forma segura e confiável; ‘alugar um amigo’ para um evento social, um
casamento ou uma festa, ir ao cinema ou jantar fora – variando de cidade pode
atingir até 120 euros por um dia; ‘preciso de uma mãe’ pode atingir trinta e
seis a quarenta euros à hora, permitindo a quem possa estar mais carente ter
acesso a uma espécie de mãe temporária, que tanto pode cozinhar como ajudar a
arrumar a casa, a dar bons conselhos ou a conversar; ‘abraça-te a mim’ – um
site onde são disponibilizados ‘abraçadores certificados’, com sessões com
cerca de setenta euros à hora…
= Esta lista de ‘serviços’ poderá parecer uma questão
de exploração de sentimentos a quem se possa encontrar em maré de debilidade
mais ou menos permanente. Mas, numa sociedade cada vez mais anónima, estas
propostas como que denunciam que não basta alguma comodidade para ter a
pretensa qualidade de vida e nem sequer a (dita) boa onda económico-financeira
consegue disfarçar quanto daquilo que mais profundamente não é preenchido com
coisas materiais, por mais positivas que possam parecer.
Perante estas condições e caraterísticas temos de
encontrar não só explicação para esta fase de quase exploração da solidão, mas
temos de estar atentos às causas e não só cuidar das consequências. De facto,
as pessoas refugiam-se nas conexões à distância e esquecem-se daqueles que lhe
são próximos. Cada vez com mais facilidade sabemos o que acontece a quilómetros
porque estamos conectados com a internet e ignoramos o que está a acontecer na
mesma rua senão no mesmo prédio.
Como é sabido e reconhecido este fenómeno não atinge
só os mais velhos, mas cada vez mais os de tenra idade, que podem habituar-se a
viverem no seu casulo dourado, sem repararem que ao seu lado há pessoas que
esperam algum sinal de aproximação. Urge, por isso, reeducar-nos para os
valores da proximidade, da vizinhança, da convivialidade, do diálogo… e de tudo
quanto nos faça sair de mesmos para atendermos aos outros. Que a tecnologia –
tão benéfica e salutar – não nos escravize como aconteceu com outros fatores de
desenvolvimento… As pessoas valem mais do que tudo o resto!
(*) Nota – tem havido outras designações para
nascidos em épocas mais recentes: ‘geração y’ ou também chamada ‘geração do
milénio’ são os que nasceram entre 1980 e 1990; ‘geração x’ envolve os que
nasceram após o rescaldo da segunda guerra mundial, isto é, os que nasceram
entre 1960 e 1970; os ‘baby boomers’ são
os que nasceram imediatamente a seguir ao conflito bélico, entre 1946 e
1964…
António Sílvio Couto
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