Por vezes as pessoas como que se atraiçoam na
desconexão entre o que dizem e aquilo que fazem ou, pior, entre o que pensam e
o modo como o executam. Isso é tanto mais palpável e, irremediavelmente,
visível, quando se apregoam de ‘democratas’, mas, na prática, só aceitam aquilo
que eles mesmos dizem ou o modo como os ‘seus’ pensam, fazem ou se comportam.
Não será preciso ser exaustivo para vermos nas lides
do dia-a-dia tanta gente que se autodefine como ‘democrata’ – deveria sê-lo nas
pequenas como nas grandes coisas – mas que depois se torna implacável para com
quem pense, divirja ou não concorde com a sua visão das coisas, a perspetiva de
entendimento ou mesmo a forma de execução de algo, que, sendo diverso, com dificuldade
terá unanimidade de ser visto, olhado ou observado.
= Tudo isto tem vindo a piorar nos diversos campos
de intervenção das pessoas, manifestando-se em múltiplos indícios de que algo não
foi bem resolvido, quando for preciso saber confrontar-se com opiniões, visões
ou perspetivas diferentes, opostas ou divergentes. O nível de crispação com que
certas pessoas falam com os outros denuncia que algo está mal, pois não se pode
admitir que um confronto de ideias ou de opiniões se transforme numa verborreia
tal que ninguém se entende, se ouve e tão pouco se escuta. Por vezes certos
programas televisivos transformaram-se em autênticas algazarras e peixeiradas,
em que a mais desconexa feira se parecerá, por comparação, um velório em maré
de surpresa da morte do defunto… Isto tudo vem fazendo ‘escola’, sobretudo a
partir do exemplo confrangedor do parlamento, onde as pessoas se querem fazer
ouvir, mas não se sabem escutar; se querem impor aos outros, mas não se
permitem sequer discordar com o mínimo de educação; pretendem sobrepor aos
outros o que dizem, mas confundem, em muitas das situações, o falar com berrar
ou ainda o discursar com ofender…mas quase nunca se conjuga o verbo dialogar em
nenhum dos tempos verbais nem nas formas possíveis.
= A descoberta mais ‘admirável’ tem sido a de que
muitas das forças votadas nas eleições – tendo em conta sobretudo as que
ascendem ao parlamento – usam estratégias absolutamente inexplicáveis nas lides
com os outros e o resto da população: diante do arranjo conseguido para a
governança de 2015 até agora, quem está a mandar, isto é, no poder, acha-se no
direito de catalogar quem não faça parte do seu arco de influência, gerando
reversões de medidas mais ou menos populares – fogem da escaldadiça designação
de ‘populistas’, mas é isso que são, de verdade – e gerindo soluções em que
tenham o máximo a ganhar e o mínimo a perder… Mas se a coisa não corre de
feição escondem o brinquedo ou fazem birra porque o bonequinho lhes pode ser
retirado…a curto ou a médio prazo.
Por exemplo: para fabricar a ‘geringonça’ o
parlamento foi o palco – mesmo andando pelos subterrâneos – para celebrar a
festança, mas se o parlamento se torna agora ringue de combate – sim a luta é de
todas as artes e demais agressividades – já não tem a mesma credibilidade… pelo
menos enquanto não for tão favorável como tem sido.
Estes democratas de pensamento único não gostam quase
nada nem em coisa nenhuma de serem contrariados e tão pouco que usem para com
eles alguns dos sortilégios que eles usaram contra os opositores… São
democratas de memória curta e de comportamento cívico ainda mais encurtado!
= Enquadrados pelas competições eleitorais que se
avizinham – umas já fixadas e outras em possível antecipação – vamos ter de
aprender a lidar com tantos pequenos ditadores que pululam em muitos desses
democratas de pensamento único. De entre as caraterísticas menos apreciáveis
nesses democratas de pensamento único destaca-se a incapacidade de se colocarem
no lugar dos outros, sem perceberem que nada tem uma só visão e se esta
exclusividade for acentuada torna-se uma espécie de radicalismo, que tão bem os
qualifica. Seja qual for o que o futuro nos reserva, pelos sinais do passado e
do presente, podemos, desde já, considerar que o nosso país está prenhe de
ditadores, onde a valor da ideologia se sobrepõe ao respeito pelas pessoas.
Assim, não, obrigado!
António Sílvio Couto
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